Organizações alertam para impactos de eólicas oceânicas nas aves marinhas
A descarbonização, apesar de fundamental e urgente, “não deve ser conseguida à custa da perda de biodiversidade”, dizem SPEA e Fundação Oceano Azul, referindo-se à energia renovável offshore.
A Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA) e a Fundação Oceano Azul alertaram nesta terça-feira para os possíveis impactos das eólicas oceânicas nas aves e pediram mais estudos antes de os projectos avançarem em Portugal.
Em comunicado, as duas entidades pedem especial atenção para as áreas de Viana do Castelo e Ericeira, onde a zona de eólicas deve ser limitada ou mesmo repensada.
"As energias renováveis eólicas poderão ter impactos negativos nas populações, habitats e rotas migratórias de centenas de milhares de aves marinhas", dizem, acrescentando que a descarbonização, apesar de fundamental e urgente, "não deve ser conseguida à custa da perda de biodiversidade".
Um estudo da SPEA com o Centro de Ecologia (cE3c) e apoiado pela Fundação sobre o impacto da energia renovável oceânica (offshore) mostrou a importância de se debater, analisar e estudar os potenciais impactos e as zonas preferenciais para a instalação das eólicas, quando está para breve a instalação desse tipo de produção de energia.
O Governo identificou cinco áreas na costa continental portuguesa para o desenvolvimento da indústria de energias renováveis no mar em larga escala: ao largo de Viana do Castelo, Leixões, Figueira da Foz, Ericeira e Sines. A SPEA e a Fundação alertam para a especial sensibilidade das zonas de Viana do Castelo e Ericeira.
E acrescentam que, no caso da Ericeira, a zona proposta sobrepõe-se à estudada na Expedição Científica Oceano Azul Cascais Mafra Sintra, realizada em Outubro de 2022, cujo objectivo foi o levantamento de valores naturais, com vista a uma futura proposta da criação da Área Marinha Protegida de Iniciativa Comunitária (AMPIC) de Cascais, Mafra e Sintra.
Esta área tem "valores naturais únicos" e é anexa a duas Zonas de Protecção Especial, e em habitat utilizado como zona de alimentação da população nidificante de cagarras nas ilhas Berlengas, alertam as duas organizações.
"As aves marinhas e costeiras são dos grupos de animais mais ameaçados do mundo devido a impactos humanos, como as capturas acidentais por artes de pesca e a poluição. São o grupo mais afetcado pela expansão dos parques eólicos marinhos devido às colisões com as pás das turbinas ou ao efeito barreira criado pelos parques eólicos e sobretudo à perda de habitat que necessariamente acontecerá pela exploração de vastas áreas marinhas", dizem as duas organizações no comunicado.
Emanuel Gonçalves, coordenador científico e administrador da Fundação Oceano Azul, alerta no comunicado que agora é a oportunidade para fazer o que está correcto: "As eólicas offshore têm a natureza de ocupação industrial do espaço oceânico, e tal deve ser feito com regras e conhecimento, para que a agenda da biodiversidade não se subordine à agenda da descarbonização".
Domingos Leitão, director executivo da SPEA, pede também transparência no processo e que envolva a sociedade, porque o espaço marítimo português e os seus recursos naturais são património de todos os portugueses.
"É de extrema importância acautelar desde já impactos futuros para as aves marinhas, começando por evitar as zonas identificadas como sendo ecologicamente mais sensíveis", avisa.
A SPEA e a Fundação recordam a "ambição política" de que o leilão das áreas definidas avance antes do final do ano, e dizem que é fundamental que haja mobilização de conhecimento técnico-científico antes do avanço do projecto.