Governo diz que vistos CPLP vão continuar e rejeita incompatibilidade com Schengen
O Governo nunca teria adoptado regras que estivessem em “contravenção com o regime Schengen”, assegura o secretário de Estado dos Assuntos Europeus.
O secretário de Estado dos Assuntos Europeus garantiu nesta segunda-feira que a mobilidade na CPLP vai continuar, rejeitando qualquer "ilegalidade ou incompatibilidade" com o espaço Schengen, em resposta ao procedimento de infracção instaurado pela Comissão Europeia contra Portugal.
"Fomos surpreendidos, na semana passada, com a abertura do procedimento de infracção por parte da Comissão Europeia (CE). Temos alguma dificuldade em compreender isso. Já tivemos várias oportunidades, no passado, de explicar à CE que não existe qualquer incompatibilidade entre o regime do Acordo de Mobilidade CPLP [Comunidade dos Países de Língua Portuguesa] e o regime da área Schengen", disse Tiago Antunes.
"Estamos seguros e confiantes em que não existe qualquer incompatibilidade. Nunca teríamos adoptado estas regras se achássemos que estavam em contravenção com o regime Schengen", sublinhou.
É "na base dessa confiança que continuaremos a aplicar o regime de mobilidade CPLP com total tranquilidade e queremos dizer isso às pessoas (...), que irá continuar a aplicar-se num quadro de total legalidade", assegurou ainda o secretário de Estado em declarações à Lusa.
As dúvidas levantadas agora pela Comissão Europeia, referiu, têm por base denúncias de um cidadão individual sobre as quais Portugal já tinha prestado alguns esclarecimentos. Essas dúvidas dizem respeito à "portaria que, regulamentando a Lei de Estrangeiros [em Portugal], define o modelo do título de residência CPLP".
Um título que se enquadra no regime CPLP, "e este, como viemos a defender desde sempre, em nada contradiz o regime de Schengen, pelo que não vimos qualquer ilegalidade ou violação dos direitos da União Europeia; pelo contrário, são dois regimes que convivem entre si e não existe qualquer incompatibilidade ou contrariedade entre eles", insistiu.
A Comissão Europeia considerou que Portugal não cumpre as obrigações europeias que "estabelecem um modelo uniforme de título de residência para os nacionais de países terceiros" e que falha no acordo de Schengen sobre livre circulação.
"O Acordo de Mobilidade da CPLP prevê uma autorização de residência que não está em conformidade com o modelo uniforme estabelecido no Regulamento (CE) n.º 1030/2002. Além disso, tanto as autorizações de residência como os vistos de longa duração emitidos para fins de procura de emprego a nacionais dos Estados da CPLP não permitem aos seus titulares viajar no espaço Schengen", refere uma informação da Comissão a que a Lusa teve acesso.
Portugal já foi notificado do procedimento de infracção e tem agora dois meses para responder à carta e corrigir as lacunas identificadas pela Comissão.
Desde Março, Portugal tem em funcionamento um novo portal disponibilizado pelo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) que possibilita aos imigrantes da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) com processos pendentes até 31 de Dezembro de 2022 obter autorização de residência de forma automática. A autorização de residência em Portugal para os cidadãos da CPLP é atribuída no âmbito do acordo de mobilidade entre os Estados-membros da organização.
Desde então, mais de 154.000 imigrantes lusófonos pediram através do "portal CPLP" uma autorização de residência, tendo já sido emitido o documento a mais de 140.000, segundo o SEF.
Este serviço de segurança indica que os nacionais do Brasil representam 74,5% dos pedidos de autorização de residência CPLP, seguidos dos cidadãos de Angola, com 9,6%, São Tomé e Príncipe, com 6,4%, e Cabo Verde com 4,4%.
Marcelo rejeita incompatibilidade
No domingo, o Presidente da República rejeitou a existência de incompatibilidade entre o regime de vistos europeu e o português. "Portugal tem estado a explicar desde há muitos anos porque é que não há incompatibilidade entre o regime [de vistos] que é adoptado em relação à CPLP e o regime europeu, comunitário. Já explicámos porque é que não há contraposição, não há um choque. Até agora isso foi aceite e acreditamos que vamos fazer valer o nosso ponto de vista", disse Marcelo Rebelo de Sousa.
O chefe de Estado português, que falou aos jornalistas na câmara de Saint-Étienne, França, à margem de um encontro com a comunidade portuguesa, considerou "uma ironia do destino" que "durante tantos anos isso não tenha sido um problema e de repente vir a descobrir-se que há uma ilegalidade que não existia no passado". "Vamos esperar para ver", concluiu.
Chega quer revogação
O presidente do Chega anunciou também nesta segunda-feira que o partido vai dar entrada no Parlamento a um pedido de revogação do acordo de mobilidade na CPLP, considerando que este foi "desde sempre um disparate e um logro".
Em conferência de imprensa na sede do partido, em Lisboa, André Ventura disse que "o grupo parlamentar do Chega decidiu deixar clara a posição que já tinha sido deixada sobre o acordo de mobilidade na CPLP", enfatizou, considerando que "este acordo foi desde sempre um disparate e um logro".
"Este acordo tem de ser refeito e reconstruído. Portugal precisa de uma imigração controlada, regulada e que dê condições humanas àqueles que chegam e não de um território sem portas e sem janelas onde todos entram de qualquer maneira", defendeu.
Defendendo que "este acordo viola gravemente as normas de identidade europeia e do acordo Schengen" e mesmo apesar de ser "nulo ou inexistente", Ventura explicou que, "mesmo por prudência, o Chega entregará na Assembleia da República um pedido para que seja revogado no mais breve prazo possível".
O partido quer ainda chamar à Assembleia da República o ministro da Administração Interna "com carácter de urgência, para que possa discutir esta questão".