TAP: PSD acusa Costa de “copiar” privatização de Passos. Toda a oposição descontente
Por motivos distintos, todos os partidos da oposição criticam o processo de reprivatização da transportadora aérea. PSD e PCP, por exemplo, avisam que o processo não acaba aqui.
Com a decisão de privatizar a TAP formalizada em Conselho de Ministros, os partidos mostraram descontentamento relativamente ao processo que agora se inicia, tecendo críticas várias que ora juntam partidos de esquerda a forças de direitas, ora diferenciam as posições de partidos à direita.
No caso do PSD, os sociais-democratas criticam os “ziguezagues sucessivos” do primeiro-ministro e respectivos governos em relação à TAP e acusam António Costa de ter copiado a privatização feita pelo executivo PSD/CDS.
“Admitem a privatização exactamente nos mesmos moldes que tanto, tanto criticaram, num processo de venda directa outrora tão critica pelo PS, na altura por falta de transparência”, acusou Miguel Pinto Luz, com o vice-presidente social-democrata a concluir: “[São] autênticos cata-ventos eleitorais.”
Em conferência de imprensa na sede nacional do PSD, Pinto Luz afirmou que se “trocou uma privatização que nos abriu os Estados Unidos” enquanto mercado – a levada a cabo pelo Governo de Passos Coelho –, para “entregar a companhia a grupos consolidados”. “António Costa copiou a privatização que foi obrigado a desfazer. [É] um crime político, económico e financeiro.” Ao PÚBLICO, Pinto Luz clarificou depois que Costa "foi obrigado a desfazer" a privatização para "agradar" aos partidos da "geringonça".
Criticou ainda que não se saiba “como será o futuro hub de Lisboa, o posicionamento de Portugal nas rotas europeias”, apontando o risco de o país se tornar “periférico”.
O também vice-presidente da Câmara de Cascais garantiu ainda que este é um “processo que não começa nem acaba hoje”. “Processo longo, cheio de contorcionismos políticos, mas acima de tudo cheio de populismo. Processo que tem um rosto, mas pior, tem um preço: o rosto é o do senhor primeiro-ministro António Costa e o preço são mais de 3,2 mil milhões de euros”, atirou, rematando que este é o “reflexo fiel da falta de competência do primeiro-ministro e do Governo socialista a gerir este dossier”.
“Em suma, o Governo herdou uma TAP saudável” e resolveu transformá-la “numa coutada privada do PS”, acusou, avaliando as reviravoltas em todo o processo de “puro populismo”. “Populismo ignóbil sem pejo em utilizar uma importante companhia aérea (…) para alcançar os seus objectivos partidários.”
Recordando que, ao defender a necessidade de renacionalizar a TAP, Costa aludiu às “caravelas dos Descobrimentos”, Pinto Luz defendeu que agora que as “caravelas já não são necessárias” e a “prioridade [do Governo] é desfazer-se da TAP” por se ter transformado “num activo tóxico comunicacional”.
IL quer privatização total, Chega apenas parcial
O deputado liberal Bernardo Blanco espera que haja transparência no processo, que a TAP deve ser privatizada a 100% por pelo menos 3200 milhões de euros, o valor injectado na companhia aérea nos últimos anos, e que esse montante seja devolvido aos portugueses através de um "cheque TAP", no modelo do apoio de 125 euros atribuídos no ano passado pelo Governo.
Em declarações aos jornalistas na Assembleia da República, Bernardo Blanco assumiu estar preocupado com a forma como o Governo conduzirá o processo de venda da empresa depois de ter ouvido o ministro das Finanças dizer que vai, primeiro, negociar com os potenciais interessados e só depois desenhar o caderno de encargos para a privatização.
"Não é a forma correcta e transparente de fazer negociações desta natureza", apontou o deputado. "Temos que garantir que o processo é feito dentro da legalidade e transparência. (...) Não queremos um caderno de encargos feito à medida de algum negociador privado em específico ou um monopólio. A privatização deve ser feita num processo concorrencial", defendeu Bernardo Blanco.
O liberal defendeu ainda que "o valor da venda, seja ele qual for, deve ser devolvido aos portugueses". Blanco fala numa espécie de "cheque TAP", como o apoio de 125 euros por pessoa e 50 por descendente que o Estado pagou em Abril do ano passado aos cidadãos. "É para toda a gente e é mais transparente do que se for devolvido em impostos – até porque nem toda a gente paga impostos."
O deputado também mostrou alguma desconfiança sobre o timing "estranho" da operação. "Estranhamos que o Governo tenha sido tão rápido a nacionalizar e agora demore tanto tempo a vender. O processo deve ser concluído mesmo a coincidir com as europeias." Bernardo Blanco recordou que quando as sondagens começaram a mostrar que "a grande maioria já queria uma TAP privada, o primeiro-ministro começou a mudar o discurso na campanha eleitoral de 2022". "[A privatização] não é uma questão de princípios e ideias do primeiro-ministro; é puramente política e falta de princípios. O primeiro-ministro vai atrás..."
Depois da IL reagiu o presidente do Chega, que admite que uma parte da TAP seja vendida a privados, mas defende ser preciso assegurar que a empresa devolva o dinheiro que recebeu do Estado, que se mantém o hub em Lisboa e os postos de trabalho.
"O Governo diz que está em curso um processo de privatização solidamente ancorado e nós não percebemos ainda se Lisboa vai ser um dos hubs principais ou se isso passará para Madrid, se os postos de trabalho estão em causa, se a privatização implicará alguma reestruturação da logística da empresa e dos trabalhadores", apontou André Ventura, que critica o executivo socialista pela "falha brutal de planeamento em todo o processo que levou à renacionalização da TAP e agora à sua privatização".
Ventura questiona também quem vai suportar os custos dos pedidos de indemnização como o de Christine Ourmières-Widener, defendendo que quem pague sejam os novos donos. E lembra que "o ministro garantiu que os portugueses receberiam todo o dinheiro que lá foi colocado, mas também sobre isso nada foi dito". "O Governo devia dizer em que condições a TAP vai ser vendida."
O Chega tem "dúvidas sobre privatização". "Nunca fomos favoráveis a uma total privatização porque não estariam garantidas as rotas para África, Estados Unidos e Brasil (...) Preferíamos sempre que o Estado tivesse uma palavra a dizer, mas respeitamos a posição do Governo de que não tem condições para continuar" a sustentar a empresa.
PCP e Bloco contra privatização
Pelo PCP, em declarações feitas no Parlamento e transmitidas pela RTP3, o deputado Bruno Dias criticou o que diz ser uma “decisão tomada em convergência” com o que é defendido pelos partidos de direita e um “crime contra o país".
O PCP reafirma que a privatização da TAP é um crime contra o país, a economia do país e a soberania nacional”, continuou, sublinhando que a empresa “é o maior exportador nacional, cria emprego de qualidade com remunerações acima da média e é uma alavanca essencial para o turismo nacional”, além de ser “um dos últimos instrumentos de soberania nacional”.
O parlamentar comunista realça ainda que “hoje a TAP está capitalizada, a dar lucros e a gerar uma riqueza imensa para o país”, o que serve de resposta àqueles que sempre defenderam que a companhia aérea só teria viabilidade se fosse privada. Essas pessoas estão “hoje sem argumentos para justificar este crime, mas continuam empenhados em entregar a TAP ao grande capital.”
Bruno Dias frisou que para o PCP “este não é um assunto encerrado” e que o partido tudo fará “para impedir novo crime”, desde já com o grupo parlamentar comunista a “promover [uma] audição urgente do ministro das Infra-Estruturas” na comissão parlamentar sobre o tema.
Antes ainda de ser conhecida a posição do Governo quanto ao processo de alienação do capital público, a coordenadora do Bloco de Esquerda lembrava, citada pela Lusa, que "a história das privatizações neste país é a história de um assalto, um assalto que não fez bem ao país e que não melhorou o serviço em nenhum sector".
Mariana Mortágua apelou a que "não deixemos que se faça com a TAP o mesmo que já se fez com tantas empresas tão importantes. Acho que já basta que a nossa electricidade seja detida pelo Estado espanhol".
PAN e Livre pedem transparência
Inês Sousa Real considerou que é “importante que o Governo clarifique bem quais as condições” em que a privatização vai ocorrer e “que haja total transparência” no processo. Desde logo porque “a privatização não pode significar um dano em relação ao dinheiro que foi investido” na empresa e é preciso garantir que a TAP não se transforme novamente num “sorvedouro” de dinheiros públicos e num “prejuízo para o interesse nacional”.
Nesse sentido, “o PAN propôs que o processo seja acompanhado e fiscalizado pela Entidade das Contas”, disse a porta-voz do PAN, que demonstra “preocupação” por verificar que “não estão garantidas as medidas do ponto de vista da segurança laboral” e que “não existem, até agora, contrapartidas ambientais para esta privatização”.
Também o Livre pede transparência e clareza no processo, critica a intenção do Governo de alienar pelo menos 51% do capital da TAP e alerta para o facto do Estado perder o controlo estratégico da companhia.
"Hoje ficámos a saber o essencial sobre a privatização da TAP. Pode faltar saber quem vai ser o comprador, em que aliança internacional a TAP vai estar, qual exactamente a quota que vai ser vendida, mas o essencial nós sabemos: a TAP vai ser privatizada e o Estado vai perder o controlo estratégico sobre a companhia", considerou o deputado único do Livre, Rui Tavares, em declarações aos jornalistas no parlamento.
Para o Livre, este é "exactamente o modelo errado de privatização", defendendo que, a haver privatização, "ela teria que ser no máximo até 49%, ou seja, deixar o Estado português com capacidade de controlo".
Isolado na defesa dos intuitos do executivo, o líder da bancada parlamentar socialista, Eurico Brilhante Dias, garantiu, citado pela Lusa, que “apesar das circunstâncias, a TAP continua a ser um activo estratégico fundamental para o desenvolvimento do país".
O deputado do PS lamentou ainda o “azedume” dos partidos da oposição, “independentemente do assunto”, fazerem sempre “a mesma crítica”.