Paulo Pedroso: “Um 15.º mês sem impostos aliviaria empresas à custa das pensões de reforma”
Paulo Pedroso alerta para riscos de medida proposta pela CIP mas louva o facto de as empresas admitirem que podem pagar mais aos seus funcionários
Ex-ministro do Trabalho e da Solidariedade e professor convidado do ISCTE critica bondade da proposta da Confederação Empresarial de Portugal - CIP de se criar um 15.ª mês a pagar aos trabalhadores mas isentando-o do pagamento de impostos, ou seja do IRS dos trabalhadores e da Taxa Social Única (TSU) paga, na maior parte, pelas empresas.
A CIP propõe o pagamento de um 15.º salário pelas empresas, isento de IRS e TSU. Esta é uma boa solução para aumentar os rendimentos dos trabalhadores?
Não. Mas há um aspecto muito positivo na proposta, que é o de a CIP reconhecer, ao fazê-la, que há necessidade social e margem nas empresas para aumentar os salários. Em contrapartida, a proposta parte de uma compreensão errada do funcionamento do IRS e das contribuições para a segurança social.
Não faz nenhum sentido que se exclua uma parte do salário dos impostos. Se e quando houver margem para os baixar, eles devem baixar, mas não isentar por igual uma parte do salário. Note-se, aliás, que caso um dos 15 salários fosse isentado de imposto de modo igual para todos, quanto mais alto ele fosse maior o efeito da isenção, numa lógica inversa da progressividade do imposto sobre o rendimento.
A não consideração desse 15.º salário para efeitos de TSU implica que os trabalhadores não o teriam considerado nas suas pensões de reforma. Ou seja, as entidades patronais veriam os seus custos aliviados, mas à custa de os trabalhadores verem as suas pensões reduzidas. Curiosamente, a própria CIP acha que um problema futuro das pensões é o de que serão mais baixas relativamente aos salários do que hoje. Com a sua proposta seriam ainda mais baixas.
Em Portugal já existe um 13.º e um 14.º mês, o que não existe noutros países. Não era preferível olhar para este valor do tal 15.º salário e integrá-lo no salário base?
Sim. Há razões históricas para que tenhamos os actuais 14 meses, que na prática, ajudam as famílias em momentos de maior necessidade de consumo, como são as férias e o Natal. Mas um décimo quinto mês seria totalmente artificial.
Ou em alternativa olhar para este valor e baixar os impostos nesta dimensão?
O governo já se comprometeu com uma descida de IRS no próximo Orçamento de Estado. Dentro do que a situação orçamental o permitir, baixar os impostos sobre o trabalho é sempre bem-vindo. Mas convém ter presente que um trabalhador ter mais dinheiro no bolso, por pagar menos impostos, para depois o gastar a adquirir serviços no mercado a que teria acesso como serviços públicos não lhe traz tantos benefícios como parece. É melhor ter acesso a saúde, educação, transportes e tantos outros serviços pagando impostos do que deixar de os pagar para aplicar o que se recebe a mais a pagar serviços que seriam gratuitos. Quando baixar os impostos significa degradar os serviços públicos ou torná-los inacessíveis, a melhoria dos rendimentos para o trabalhador é uma mera ilusão.