Modelo similar a um embrião humano criado a partir de células estaminais
Resultados agora publicados foram conseguidos sem usar espermatozóides nem óvulos na concepção do embrião. Cientistas dizem ser o primeiro modelo “completo” a simular um embrião aos 14 dias.
Sem espermatozóides nem óvulos, uma equipa de cientistas do Instituto Weizmann, em Israel, criou aquele que afirmam ser o primeiro modelo completo de um embrião que imita todas as principais estruturas de um embrião humano aos 14 dias. Em vez dos ingredientes habituais, espermatozóides e óvulos, os investigadores usaram células estaminais e compostos químicos específicos para criar as células presentes na fase inicial de um embrião.
A ambição científica de criar modelos de embrião não é nova. As primeiras semanas após a fecundação revelam uma rápida alteração de uma “bola” de células indistintas entre si para algo que se torna reconhecível numa ecografia. Este é um período fulcral para entender o desenvolvimento do embrião e investigar causas desconhecidas de abortos espontâneos, por exemplo. Esta é também uma janela para as primeiras fases de evolução das células humanas (um terreno ainda desconhecido).
Sem utilizar espermatozóides ou óvulos, os cientistas criaram estes modelos similares a um embrião humano com células estaminais pluripotentes, que têm a capacidade de se transformarem noutros tipos de células do corpo. Misturando estas células com alguns produtos químicos, a equipa do Instituto Weizmann conseguiu desenvolver os quatro tipos de células presentes nesta fase inicial do embrião humano.
Como explica o site da BBC, foram misturadas 120 destas células e depois os cientistas esperaram – e as células desenvolveram-se. “Dou muito crédito às células – temos de levar a mistura certa e ter o ambiente certo e depois simplesmente cresce. É um fenómeno fantástico”, diz à BBC Jacob Hanna, investigador do Instituto Weizmann e líder do estudo publicado na revista Nature.
O limite dos 14 dias
Os modelos de embrião gerados no laboratório desenvolveram-se até ao período comparável com 14 dias de um embrião humano, um limite imposto por muitos países à investigação científica em embriões humanos. Na investigação com implicações clínicas, o limite costuma ser ainda mais baixo, de sete dias.
“A partir do dia 14, as células começam a diferenciar-se de forma mais evidente e o embrião sofre alterações morfológicas grandes”, explica Patrícia Rodrigues, especialista em embriologia da Universidade Lusófona. “Entra aqui a questão ética sobre a partir de quando ainda é válido investigar um embrião.” A discussão em torno da investigação em embriões humanos também não é recente. Apesar de haver a perspectiva de aprender mais sobre a biologia humana e sobre doenças ou problemas como os abortos espontâneos a partir do estudo científico dos embriões humanos, os riscos e as implicações éticas são maiores – por exemplo, é após estes 14 dias que as células se estruturam na organização normal do nosso corpo, da cabeça aos pés.
A regra dos 14 dias deriva das recomendações expostas no Relatório Warnock, um inquérito britânico sobre fertilização humana e embriologia publicado em 1984. Apesar de ser apelidado, inclusive no artigo científico publicado, de embrião, esta fase é ainda pré-embrionária, olhando especificamente para as primeiras duas semanas em que há uma implantação desta bola de células no útero – geralmente é considerado um embrião entre a terceira e a oitava semana.
É por isso que os investigadores também têm apostado em modelos de embrião, que, tendo células estaminais humanas, não são formados como um embrião – que requer um óvulo fecundado. Ainda assim, estes modelos ainda têm uma taxa de insucesso elevada e, portanto, a maioria das vezes não se desenvolvem para estes estágios. Um dos objectivos da equipa de investigação israelita é precisamente tornar este um processo mais fiável.
“Pode ser importante ter um modelo com células praticamente iguais às humanas, pré-embrionário, que permita estudar este período. Esta fase de implantação [do embrião no útero] é uma das que menos conhecemos”, nota Patrícia Rodrigues, que acrescenta que estes resultados já tinham sido conseguidos com embriões de ratinhos.
Em Junho, outro trabalho, da Universidade de Cambridge (Reino Unido) e do Instituto de Tecnologia da Califórnia (Estados Unidos), também publicou na revista Nature um estudo sobre o crescimento de modelos similares a embriões humanos com 14 dias – e gerados numa placa de laboratório, como este do Instituto Weizmann. Apesar deste novo estudo, esta área promete continuar a trazer novos avanços no futuro próximo: seja com o desenvolvimento de modelos de embrião parecidos com o humano, seja com o estudo destes modelos para desvendar o que acontece neste período crítico do desenvolvimento embrionário.