O que precisas de saber sobre animais dentro de casa – do número máximo às condições mínimas
Tens um animal (ou vários) em casa? Há regras que tens de cumprir, quer vivas num apartamento, condomínio ou numa moradia. Para te ajudar, fizemos um resumo.
Um cão a ladrar durante a noite no apartamento do lado, um gato a passear-se nas zonas comuns ou dejectos de cão no jardim do condomínio... As razões para as zangas entre vizinhos são inúmeras — e algumas têm os animais no centro das quezílias.
Para evitar estes desentendimentos, preparámos-te um guia com algumas regras que precisas de saber sobre animais de estimação dentro de casa, quer seja num apartamento, condomínio ou numa moradia. Afinal, existem mais de três milhões de animais de companhia registados no Sistema de Informação de Animais de Companhia (SIAC), de acordo com os últimos dados divulgados, de 2022, o que quer dizer que este guia pode ser útil a todos esses tutores.
Podem impedir-me de ter animais de estimação?
Tentar arrendar uma casa e ler nos anúncios que “não se aceitam animais de estimação” é um relato comum. Em entrevista ao P3, a jurista Catarina Salazar Silva explica que “o que a lei não proíbe, o contrato pode proibir”. Assim, os senhorios podem decidir que não querem animais no seu imóvel e acrescentar essa cláusula ao contrato.
Esta premissa também é válida em sentido inverso, ou seja, não havendo qualquer referência legal sobre isto, é possível ter animais no interior de uma casa alugada, desde que ambas as partes estejam de acordo. O ideal é negociar, “tal como se negoceia o valor das rendas e outras condições do contrato”.
Quais são as condições mínimas para se ter animais dentro de casa?
Seja um apartamento alugado ou casa própria, a lei define alguns requisitos para se poder ter animais de estimação, como esclarece o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF).
“Qualquer detentor particular deve ter em atenção o cumprimento de requisitos mínimos de bem-estar” tais como a existência de espaço adequado para a “prática de exercício”, evitar a fuga e proporcionar “refúgio dos animais”, “contra o sol, a chuva e o vento”.
Consoante a espécie, também há outros factores a ter em conta como a “ventilação, temperatura e condições de luminosidade” e, claro, o acesso a comida e água. De uma forma geral, as premissas base, como esclarece Catarina Salazar Silva, são a “existência de boas condições e a ausência de riscos higiénico-sanitários relativamente à conspurcação ambiental e doenças transmissíveis ao homem”.
E o número de animais? Quantos posso ter?
Também o número de animais está legalmente estabelecido. Em Portugal, a lei estabelece como limite três cães ou quatro gatos, mas “não há especificidades em relação a raças ou ao porte dos animais”, esclarece a jurista.
Este número pode ser estendido até um limite máximo de seis animais, mediante um pedido de autorização remetido à Câmara Municipal da zona de residência. A resposta “depende de um parecer de um veterinário municipal e de um delegado de saúde”, mas sempre até ao limite máximo de seis animais por habitação.
Assim, ter mais do que seis animais em casa pode dar multa “na sequência de uma queixa”. São as Câmaras Municipais que fazem a fiscalização destes casos, depois de uma denúncia e um auto levantado pela PSP ou pela GNR. A coima começa nos 50 euros e pode ir até aos 3740.
O meu cão pode ladrar durante o dia?
Ouvir o cão do vizinho do lado a ladrar pode ser aborrecido — e é motivo de muitas chamadas à polícia. De acordo com o Regulamento Geral do Ruído, se um animal estiver a fazer barulho dentro de casa entre as 23h e as 7h da manhã (isto é, durante o período nocturno), as autoridades podem intervir e pedir ao “produtor de ruído de vizinhança” que adopte medidas para “fazer cessar imediatamente a incomodidade”, lê-se no artigo 24.º. Acalmar o animal, levá-lo a passear ou dar-lhe comida são alguns exemplos do que se pode fazer nestas alturas.
A jurista reconhece, no entanto, que o conceito de “incomodidade” não está definido na lei. “Se o ruído se ouvir na casa dos vizinhos, pode considerar-se que estes se podem sentir incomodados”, afirma. Apesar disso, o ladrar ou latir dos cães dentro de casa apenas constitui contra-ordenação a partir das 23h: “Durante o dia ou fora desse horário não constitui nenhuma infracção”, sublinha.
As coimas oscilam entre os 200 e os 2000 euros em casos de negligência e os 400 a 4000 euros em caso de dolo, ou seja, “quando a pessoa tem consciência e vontade de praticar o acto”.
Condomínios e espaços comuns. Que regras há a cumprir?
No caso dos apartamentos em condomínio, o enquadramento legal é diferente. Quezílias provocadas por cães que usufruem da piscina ou donos que não recolhem os dejectos dos animais podem ser evitadas através das decisões tomadas em reunião de condomínio. As regras, como as que ditam a proibição da circulação nos espaços comuns, têm de ser aprovadas por unanimidade obrigatoriamente. E se não houver consenso, “até pode estar no papel, mas os condóminos podem não cumprir”.
Catarina Silva recorda ainda que, caso um morador se mude para um condomínio onde estas regras já existam, a deliberação deve ir novamente a votos para que se verifique uma vez mais a unanimidade. Caso contrário, o recém-chegado não é obrigado a cumprir a regra com a qual não concordou.
Mas vamos a casos específicos. O meu cão pode nadar na piscina do condomínio? Mesmo sem deliberação escrita e considerando as condições higiénico-sanitárias do equipamento “parece-me difícil que os cães possam ir à piscina”, antecipa a jurista.
Já no caso dos jardins, todos os donos de animais de estimação são obrigados a “proceder à remoção imediata dos dejectos produzidos pelos animais”. Aqui aplica-se o regulamento 26/2019, de 7 de Janeiro, que “também é aplicado a espaços de utilização pública como os espaços verdes do condomínio”, argumenta a jurista.
E se tiver um cão de raça potencialmente perigosa? O que tenho de saber?
A jurista ouvida pelo P3 admite que a informação relativa aos cuidados a ter com cães de raças potencialmente perigosas “não circula de forma simples para que as pessoas a percebam”. Por isso, vamos por partes.
A legislação portuguesa começa por definir as raças de cães potencialmente perigosas, tais como rottweiler, cão de fila brasileiro, staffordshire, entre outros. Para ter estes animais dentro de casa há regras extra a cumprir, além das regras de bem-estar animal.
Começa logo na adopção. “Há muitos documentos que temos de entregar na junta de freguesia” para fazer o registo, como o termo de responsabilidade, certificado de registo criminal do tutor, comprovativo do seguro de responsabilidade civil, comprovativo de formação para detenção de cães de raças potencialmente perigosas, entre outros, especificados no artigo 5.º do decreto-lei 315/2009, de 29 de Outubro.
A placa a dizer “cuidado com o cão” parece ser uma opção em tom de brincadeira, mas é mesmo uma obrigação legal, uma vez que o dono “fica obrigado a manter medidas de segurança reforçadas, nomeadamente nos alojamentos” do animal.
Alguns exemplos dizem respeito à vedação exterior, que “não pode ter menos de dois metros de altura” e tem de garantir a separação “do alojamento do animal e dos vizinhos ou dos espaços públicos”. É ainda obrigatório que o espaçamento das grades do espaço onde fica o animal não seja superior a cinco centímetros.
Quando estes animais vivem em apartamentos ou condomínios, os cuidados adicionais estendem-se à circulação nos espaços públicos. Aí, o cão de raça potencialmente perigosa tem de usar um açaime “que não permita comer nem morder” e também circular “com trela curta até um metro de comprimento”, lê-se no mesmo documento.
Quem fiscaliza as regras relativas aos animais de estimação?
As autoridades não fiscalizam de forma rotineira as habitações onde há animais de estimação registados. A fiscalização “acontece sempre na sequência de uma denúncia”, esclarece Catarina Silva.
Aí, entram em acção as autoridades como a PSP ou a GNR que fazem um auto da ocorrência e depois o processo segue os trâmites legais através das Juntas de Freguesia ou das Câmaras Municipais.
No caso das habitações inseridas em condomínios, não vale a pena chamar as autoridades. “A polícia não vai intervir porque são regras entre as pessoas”, enquadradas nos regulamentos dos condomínios. O que fazer? “Os condóminos têm de falar com o administrador do condomínio” para “tentar mediar o conflito entre as pessoas” de forma amigável. Em última instância, “poderá levar a procedimentos judiciais”, conclui.