A menos de um ano das próximas eleições para o Parlamento Europeu, o caderno de encargos para uma escola de Verão da Comissão Europeia não é difícil de reduzir à pergunta: como será o futuro da UE? Alargamento, guerra na Ucrânia, emergência climática, migrações, inteligência artificial, transição energética, mais alargamento, democracia, prosperidade e direitos são palavras que vão permear as várias conversas sobre a Europa nos próximos meses e anos.
Abordamos a eurodeputada Margarida Marques, veterana em andanças europeias, no Summer CEmp, a escola de Verão da Comissão Europeia, a preparar-se para uma sessão de speed debating com dezenas de jovens estudantes. Que grandes desafios aguardam o Parlamento Europeu que será eleito nas próximas eleições? A resposta está na ponta da língua e até numerada. Um: protecção da democracia e dos direitos humanos. “Independentemente dos resultados eleitorais, a direita que já provou que não respeita valores europeus, incluindo os direitos humanos”.
Dois: vamos continuar a lidar com o impacto da guerra da Ucrânia, assim como a possibilidade de alargamento da UE a outros países. Isto coloca um desafio duplo, por um lado de adaptação da UE para receber estes países, que passará por uma revisão do orçamento e da arquitectura de financiamento da UE para que haja meios para gerir uma comunidade em crescimento, e por outro o trabalho com estes outros países, sendo “fundamental que se mantenha o equilíbrio geográfico” e garantindo que “o centro nevrálgico político” continue alinhado com os valores europeus.
Três: cumprir os objectivos em matéria climática e trabalhar em políticas próprias para lidar com a crise planetária. Quatro: reforço da autonomia estratégica da UE, uma construção que “não é nem pode ser o isolamento da UE”, mas sim baseada na relação multilateral. Cinco: desenvolver a política externa da UE, incluindo a vertente do comércio e dos tratados, garantindo a transversalização dos direitos também nas exigências aos países parceiros.
Recursos próprios e transição gradual
Já depois da conversa com os jovens, José Manuel Fernandes, eurodeputado do PSD, responde à mesma questão. Sublinha que "é importantíssimo que para a UE responder os desafios que enfrenta à escala global tenha recursos suficientes para esse objectivo", com um olho nos novos recursos próprios da União e a ratificação das propostas pelos Estados-membros.
Recorda que o custo do Plano de Recuperação e Resiliência (que também se fez de emissão de dívida) a partir de 2027 andará à volta dos 20% do orçamento actual da União, considerando crucial que haja "novas receitas que não sobrecarreguem os cidadãos". E para levar a cabo a implementação das soluções encontradas até agora, é necessário "um parlamento aberto a esses novos recursos próprios" e que os egoísmos nacionais - que, considera, já existem no conselho - "não sejam transportados para o parlamento".
O futuro passará por uma aposta na autonomia estratégica da UE, por exemplo, com a construção de projectos comuns na área da energia. "A união da energia implica interconexões", explica o eurodeputado social-democrata, que deixa a nota: "Portugal não pode ser uma ilha energética."
Em termos políticos, defende que "seria importantíssimo que os moderados tivessem maioria", sublinha José Manuel Fernandes. Eurodeputado desde 2009, fala no aumento do radicalismo de direita que tem crescido na Europa mas também "de esquerda", assim como aquilo a que chama "radicalismo verde", com grupos que "extremam posições que complicam a negociação" para objectivos que "queremos todos atingir".
"Há uma necessidade de agirmos rapidamente para atingirmos os objectivos climáticos", reconhece, notando que "é urgente planear e planear de forma concertada". Está quase tudo por fazer: incluir a população na mudança, garantir que os empregos que vão ser destruídos sejam recuperados numa transição justa, apostar na investigação para novos materiais, atingir objectivos de forma gradual. "Esse trabalho não está a ser feito."
À margem das actividades do Summer CEmp, a secretária de Estado dos Assuntos Europeus francesa, Laurence Boone, também deixou a sua lista de desafios que a UE tem que resolver nos próximos meses: a reforma do mercado da electricidade, o debate sobre migração, a reforma da governação económica, a grande questão do alargamento.
Algo que a governante prevê ser "muito divisor" - pelo menos no seu país - é "usar a transição energética como argumento contra a Europa". Os detractores, acredita, vão alegar que a transição energética está a custar dinheiro dos consumidores à UE, obrigando a mudar os carros e o aquecimento. O que é verdade", sublinha. "Mas a Europa está a fazer imenso para garantir que as pessoas têm não só carro e aquecimento, mas também uma oferta segura de energia".
"Só juntos podemos dar resposta"
Anna Lürmann, secretária de Estado da UE e do Clima alemã, alerta que a comunicação contrária às políticas de transição energética vem muitas vezes da extrema-direita, mas também da própria indústria de combustíveis fósseis, que procura manter o seu domínio do mercado energético perante uma encruzilhada existencial.
A resposta, no caso da transição iminente na economia, é o diálogo: "Precisamos abordar as indústrias e negócios como parceiros." Na Alemanha, por exemplo, o governo está a trabalhar com a indústria do aço para mudar do uso do gás natural para hidrogénio verde.
Depois, o foco deve ser na eficiência energética. "Reduzir o consumo de energia deve ser a principal prioridade, sublinha a secretária de Estado, membro dos Verdes na Alemanha. "As próximas eleições são cruciais para o futuro da Europa", remata. "Temos tantas questões importantes. A crise climática a todo o vapor, a crise a guerra na Ucrânia, toda a questão do alargamento, enumera." Isto significa que precisamos mesmo de um Parlamento Europeu que é pró-europeu, que saiba que só juntos podemos dar resposta a estes desafios."