Sánchez à procura de uma amnistia que não o seja para somar apoios e formar governo

Para os socialistas, “prudência, diálogo e discrição” é a fórmula para chegar à investidura. Felipe VI começa a receber os partidos esta segunda-feira e deverá ter dois candidatos à presidência.

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Felipe VI já recebeu a nova presidente do Congresso, Francina Armengol, e começa esta segunda-feira a ouvir os partidos CHEMA MOYA/EPA
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Vencido o primeiro desafio, com a eleição por maioria absoluta da candidata socialista à presidência do Congresso, Francina Armengol, a coligação que une o PSOE, de Pedro Sánchez, à plataforma de esquerda Sumar, de Yolanda Díaz, prepara-se agora para o segundo e definitivo round a caminho da desejada formação de um novo governo. Entretanto, quando for recebido pelo rei, na terça-feira, Alberto Nuñez Feijóo vai dizer-lhe que quer ser proposto à investidura, mesmo se a votação da semana passada mostrou que o PP não tem apoios para lá chegar.

Na sede dos socialistas, na rua Ferraz de Madrid, acredita-se na repetição do sucesso das negociações que garantiram à esquerda o controlo da Mesa do Congresso, com 178 votos (mais dois do que a maioria absoluta), incluindo os dos sete eleitos do Juntos pela Catalunha, do ex-presidente catalão Carles Puigdemont, o partido que mais tem pedido em troca do seu apoio. “Uma vez mais, prudência, diálogo e discrição”, será isso a pautar a actuação do partido, escreve o diário online infoLibre, citando membros da direcção do PSOE. “Como ficou claro, é a melhor fórmula para que a maioria que saiu das urnas se reflicta no governo, como já se reflecte na Mesa."

Só que à segunda, as negociações com os partidos catalães prometem ser bem mais duras, com os soberanistas a exigirem nada menos do que uma amnistia a todos os envolvidos no referendo de 2017 que antecedeu a declaração de independência de Puigdemont. Uma missão impossível sem “prudência, diálogo e discrição”, mas que implicará ainda algum engenho: os socialistas “não aceitam um termo como amnistia, que alguns dirigentes independentistas consideram inegociável”, resume o jornal El País.

O que o Governo ainda em funções aceita e até deseja é procurar opções para “desjudicializar” o conflito entre o Estado e a Catalunha, “a palavra suave encontrada para falar de reduzir as penas dos implicados na maior crise política espanhola dos últimos anos”, sublinha o diário de Madrid. Não há opções fáceis, nem do ponto de vista político nem jurídicos – há dois anos, os partidos independentistas tentaram apresentar uma proposta de lei de amnistia, mas o texto não chegou a ser debatido por se considerar que violava o artigo da Constituição que proíbe os indultos gerais.

Um dos problemas de base é saber exactamente o quê e quem estaria incluído: para além dos dirigentes catalães condenados a vários anos de prisão por sedição (crime que deixou de existir com a reforma da lei penal), desobediência e desvio de fundos (para organizar a consulta) – com excepção dos que continuam fugidos, como Puigdemont – há centenas de pessoas potencialmente abrangidas, incluindo dezenas de que ainda aguardam julgamento.

A Òmnium Cultural, uma associação independentista de defesa e promoção da língua catalã, contabiliza 4230 pessoas que sofreram algum tipo de “represália”, incluindo 1432 acusadas judicialmente. Mas o Junts, por exemplo, exige uma amnistia para os “4200” processados.

Cedências e impossíveis

Muitas questões para resolver e pouco tempo até às audiências com o rei – o Sumar é recebido na segunda-feira e na terça será a vez do PSOE e do PP – e a um debate de investidura. Mas a realidade mostra que o “diálogo” tem dado frutos e todos os envolvidos parecem dispostos a ceder, mesmo o irredutível Junts, que nos anos mais recentes não abdicou de nada e foi perdendo relevância política.

A verdade é que já houve muitos impossíveis tornados possíveis, como os indultos de 2021 (que anularam o que faltava das penas sem anular as condenações) aos dirigentes presos ou o acordo para “garantir o uso do catalão e de outras línguas co-oficiais do Estado em sessões plenárias e parlamentares”, alcançado agora nas negociações para eleger a Mesa do Congresso.

Como os partidos independentistas catalães e bascos recusam ser recebidos pelo rei, a tarefa de convencer Felipe VI de que existem apoios para um governo de esquerda ficará nas mãos de Sánchez e da sua vice-presidente, Díaz.

Desta vez, o monarca terá uma experiência inédita em Espanha, com dois líderes partidários a dizer-lhe que pretendem tentar formar governo. Feijóo voltará a repetir que foi o mais votado. Uma posição que se tornou mais difícil depois da votação para a Mesa do Congresso, com o PP a reunir apenas 139 votos – o Vox decidiu não apoiar a candidata conservadora porque Feijóo recusou ajudar o partido de extrema-direita a ter uma vice-presidência.

Por mais que Feijóo insista na legitimidade da sua pretensão, a verdade é que não tem como somar os apoios necessários e as únicas opções são um governo do chamado bloco progressista ou uma nova ida às urnas.

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