Um grupo de cidadãos manifestou-se nesta terça-feira, 15 de Agosto, contra a construção de um parque eólico em Sines, no distrito de Setúbal, que implica o abate de mais de 1800 sobreiros. “Era importante que o Governo pusesse a protecção das florestas à frente deste tipo de transição energética, que, na verdade, não está a ser feita de forma sustentável”, afirmou à agência Lusa Patrícia Herdeira, da organização do protesto.
Promovido por um grupo denominado Vamos Salvar os Sobreiros e por associações ambientalistas, a manifestação começou com uma concentração na praia de Morgavel, seguindo-se uma caminhada até ao montado, junto à barragem com o mesmo nome. Patrícia Herdeira, que também faz parte do Movimento pelas Águas e Serras, realçou que “os sobreiros são árvores protegidas” por lei, assinalando que apenas podem ser abatidas “em caso de morte ou de doença e com a devida licença”.
“Agora, querem abater mais de 1800 sobreiros, numa zona com um ecossistema que é muito importante para a região e que tem um dos únicos dois ninhos de águia-pesqueira, que é uma espécie em estado crítico de extinção”, lamentou.
A activista ambiental advertiu que “não são só estes sobreiros” que podem vir a ser abatidos para o projecto do novo parque eólico avançar, mas também “muitas outras árvores e toda a vida envolvente”. “Com tanto território desertificado e que, por exemplo, tem monoculturas de eucaliptos, era importante haver uma revisão deste projecto para poupar estas florestas autóctones, que são importantes para o combate à desertificação e à seca”, sublinhou.
Insistindo na necessidade de o projecto ser revisto, referiu que haverá no país território onde a construção do parque, “de certeza, não terá de implicar o abate, principalmente, de sobreiros”. O projecto “devia ser um acto ilegal, mas vai avançar por ser considerado de extrema utilidade pública e, com este pretexto, conseguem avançar”, considerou, atribuindo responsabilidades ao Governo e às câmaras municipais.
O ministro do Ambiente e da Acção Climática declarou a “imprescindível utilidade pública” do Parque Eólico de Morgavel, que a EDP Renováveis quer construir em Sines, autorizando o abate de 1821 sobreiros, segundo um despacho já publicado em Diário da República. No despacho, Duarte Cordeiro considera que estão reunidas as condições necessárias, como a conformidade ambiental do projecto, as autorizações de abate/corte de sobreiros pelos proprietários e que a Parque Eólico de Moncorvo, da EDP Renováveis, apresentou um projecto de medidas compensatórias por arborização de povoamento misto de sobreiros e medronheiros numa área de 50,07 hectares.
Em Fevereiro, a Autoridade da Concorrência (AdC) autorizou a EDP Renováveis a comprar a Parque Eólico de Moncorvo, que actualmente se dedica a conceber e implementar o Parque Eólico de Morgavel, no concelho de Sines.
Corticeiras dizem que abate é difícil de compensar
Já a Associação Portuguesa da Cortiça (Apcor) alertou que o abate destes sobreiros provoca “danos de curto prazo” que “serão difíceis de compensar”, por serem árvores adultas. Este abate “causa grande apreensão entre os agentes da fileira, devido ao impacto directo e indirecto que terá sobre o Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina, mas, sobretudo, porque os danos de curto prazo serão difíceis de compensar visto serem árvores adultas”, afirma a Apcor.
“A preocupação é ainda maior, pois esta é mais uma decisão que aumenta o número de sobreiros abatidos em Portugal, que pode ascender a mais de 35 mil, desde o ano de 2011”, adianta a associação, que representa cerca de 250 empresas do sector.
Sem contestar o cumprimento dos procedimentos e enquadramento da decisão, a Apcor solicita ao Governo uma reflexão para que sejam avaliados “possíveis equilíbrios ou alternativas” entre a construção do parque e a preservação dos sobreiros.
Citado no comunicado, João Rui Ferreira, secretário-geral da Apcor, lembra “a existência de um objectivo nacional assumido de preservação do sobreiro como árvore símbolo nacional” e dos montados pelo seu “potencial actual e futuro no alinhamento com a estratégia nacional de neutralidade carbónica”. “A conservação da biodiversidade, preservação de espécies autóctones, combate à desertificação e, por último, um país social, económico e ambientalmente mais coeso são razões adicionais para a surpresa e preocupação desta tomada de decisão”, acrescenta.
Segundo esta associação, Portugal reforçou, em 2022, a sua posição de liderança mundial na transformação e exportação de produtos em cortiça, atingindo valores históricos de exportação para mais de 100 países, num valor total que ultrapassa os 1200 milhões de euros. “Além do valor absoluto, a fileira da cortiça reforçou o enorme valor acrescentado para o país, onde por cada euro exportado mais de 80% é retido em Portugal. Números reforçados no primeiro semestre de 2023, em que se ultrapassou um novo recorde do valor das exportações.”