Falta de critério para o reconhecimento público de atletas gera desagrado
A forma como várias selecções nacionais não mereceram idêntico carinho, apoio e destaque do que o dado à selecção feminina de futebol por parte do Presidente da República origina críticas.
Foi sem escolta de caças F-16 da Força Aérea Portuguesa que Diogo Ribeiro aterrou em Lisboa depois de ter representado Portugal nos Mundiais de natação em Fukuoka, no Japão, apesar de trazer na bagagem uma inédita medalha de prata. Na sua primeira participação na competição, o nadador português (medalha de bronze nos Europeus e campeão mundial júnior na distância) foi segundo classificado na final dos 50m mariposa. Diogo Ribeiro e restantes atletas da selecção nacional de natação também não mereceram nenhuma recepção no Palácio de Belém à partida para o Campeonato do Mundo, nem tão-pouco à chegada, apesar dos resultados de relevo alcançados. Um contraste absoluto com o que se verificou com a selecção feminina de futebol.
“Pelo menos até à data em que estou a falar consigo, ninguém da presidência da república entrou em contacto comigo para a realização de qualquer tipo de cerimónia ou de reconhecimento público”. Foi desta forma que António José Silva, presidente da Federação Portuguesa de Natação, acabado de chegar do Japão, respondeu quando ontem foi questionado pelo PÚBLICO sobre se a comitiva nacional que esteve presente nos Mundiais de natação tinha sido de alguma forma sondada para algum tipo de evento público de felicitação pelos resultados alcançados.
As críticas sobre a diferença de tratamento que as duas comitivas nacionais presentes em Mundiais (de futebol e de natação) receberam não se centram tanto em Marcelo Rebelo de Sousa mas mais em quem o rodeia. “Não estou a criticar o Presidente. Ele não tem obrigação de saber todos os resultados dos atletas nacionais, mas sim dos assessores que trabalham para a presidência da república”, acrescenta o líder da natação portuguesa, que subscreve as críticas recentes feitas por Vítor Félix, presidente da Federação Portuguesa de Canoagem, que falou daquilo que designou ser a “promoção e fomento da monocultura desportiva” em Portugal.
Segundo António José Silva, apesar de a natação portuguesa ter conquistado nos Mundiais uma medalha de prata nos 50m mariposa, por Diogo Ribeiro, um 4.º lugar nos 5km em águas abertas, por Angélica André, uma presença inédita na final da prova de natação artística, por Cheila Vieira e Beatriz Gonçalves, e uma qualificação olímpica nos 100m costas, por João Costa, não houve por parte da Presidência da República nenhuma manifestação de interesse em receber a comitiva nacional antes da viagem para o Japão, nem tão-pouco após a chegada da comitiva nacional a solo português. “O único contacto que houve foi a solicitar o telefone do Diogo Ribeiro depois de ele ter conquistado a medalha de prata”, confessou António José Silva.
Uma diferença de tratamento gritante com aquilo a que teve direito a selecção feminina de futebol, que garantiu um inédito apuramento para o Mundial com um golo nos descontos frente aos Camarões, no play-off de acesso a uma competição que viu alargado o número de países que puderam participar na prova (de 24 para 32) - recepção no Palácio de Belém antes da viagem para a Nova Zelândia, visita do primeiro-ministro e da ministra do Trabalho em dois jogos na Nova Zelândia e recepção pelo Presidente da República, novamente em Belém (já depois da escolta dos F-16), no regresso de uma selecção que não passou a fase de grupos, somando uma vitória, um empate e uma derrota.
Nas palavras do líder da federação de natação, que fala também em nome da plataforma do desporto federado (organismo que congrega um grupo de 26 federações com estatuto de utilidade pública desportiva), “nada contra o futebol, toda a gente sabe da sua implantação na sociedade portuguesa. Agora se ainda cavam mais o fosso entre o futebol e as restantes modalidades, desta vez com o argumento da questão de género, fica muito difícil”. E conclui: “Há uma falta de critério para o reconhecimento público. Se houver critério, as pessoas entendem. Podem concordar ou não, mas pelo menos há critérios. Agora, quando não há um racional que justifique estas atitudes, é a casuística que impera.”
No dia em que António José Silva falou com o PÚBLICO, partiu para Roterdão, nos Países Baixos, a delegação portuguesa que vai competir nos Campeonatos Paralímpicos Europeus. São 26 atletas que estarão em acção em seis modalidades (badminton, boccia, ciclismo, judo, ténis em cadeiras de rodas e tiro). Antes da viagem, não houve paragem no Palácio de Belém, nem no Palácio de São Bento.