Mais de 2034 km2 arderam já este ano até 29 de Julho em países da União Europeia, diz a Agência Espacial Europeia (ESA), bem acima do valor médio entre 2003 e 2022 (1600 km2). Em termos de dimensão, é mais ou menos como se tivesse ardido toda uma Área Metropolitana do Porto. Mas quando se olha para a área ardida até agora nos incêndios de grande escala no Canadá, percebe-se que o fogo pode ser uma das armas mais destruidoras: 131 mil km2, segundo números oficiais canadianos.
Os dados europeus são do Sistema Europeu de Informação sobre incêndios Florestais (EFFIS, na sigla em inglês). São suficientemente graves para a ESA tenha reactivado o Atlas Mundial dos Incêndios, uma ferramenta online interactiva em que usa dados do satélite Sentinel-3A para permitir a visualização da distribuição de incêndios que estão a ocorrer tanto à escala global como nacional. Depois de um ensaio em 2019, em que apoiou a actividade de agências de protecção civil e bombeiros europeus, está de novo acessível e com dados de todo o mundo.
Analisando os dados disponíveis, a ESA salienta que Portugal, por exemplo, esteve à frente no número de deflagrações em Agosto de 2016 (quando um incêndio no parque de estacionamento do festival Andanças destruiu 422 carros, por exemplo) e em Outubro de 2017 (depois do incêndio de Pedrógão Grande, em Junho, quando morreram 66 pessoas, na madrugada de 15 e 16 de Outubro, deflagraram cerca de 500 focos de incêndio que lavraram quase sem controlo e provocaram a morte a 51 pessoas).
O Atlas Mundial dos Incêndios usa os dados captados por um sensor do satélite Sentinel-3A que “funciona como um termómetro no céu, medindo a radiação térmica infravermelha. Isto permite medir a temperatura das superfícies de terra do planeta, e detectar onde há incêndios”, diz um comunicado da ESA. A partir de Dezembro de 2023 serão adicionados dados do satélite Sentinel-3B.
Para além de Portugal, nos últimos sete anos, a ESA destaca a quantidade substancial de incêndios detectada em Itália, Grécia, França e Espanha.
Emissões de carbono recorde no Canadá
Mas também a situação grave que o Canadá está a viver: durante os primeiros sete meses de 2023, foram contabilizados 11.598 incêndios florestais. “É um aumento de 705% em comparação com os incêndios detectados no mesmo período durante os últimos seis anos”, diz o comunicado da ESA.
Os últimos dados do Centro Canadiano Interagências para os Incêndios Florestais apontam para que este ano já tenha ardido uma área de 131 mil km2. Isto é quase duas vezes mais do que o registo mais elevado até agora, que era de 71 mil km2 durante todo o ano de 1995, salienta o comunicado do Copérnico.
E estes grandes incêndios têm consequências: libertam enormes quantidades de carbono, armazenado nas árvores que são queimadas. Isso faz com que o valor estimado para as emissões totais de carbono do Canadá seja o maior de sempre, segundo um comunicado do Serviço de Monitorização da Atmosfera do programa europeu de observação da Terra Copérnico.
Até agora, os incêndios florestais do Canadá causaram a emissão de cerca de 290 megatoneladas (milhões de toneladas) de carbono para a atmosfera, o que representa cerca de 25% do total do país este ano até agora. Este valor é mais que o dobro do anterior máximo de carbono enviado para a atmosfera por causa dos fogos florestais no Canadá: 138 megatoneladas, em 2014, diz o comunicado do Copérnico.
“Altamente invulgar”
As chamas não devem ficar por aqui. Continuam a surgir fogos de grande escala tanto nas províncias de Leste como de Oeste do Canadá, e mesmo no Círculo Árctico. “Nos últimos anos temos visto acontecer incêndios florestais significativos no Hemisfério Norte, mas o que se passa este ano no Canadá é altamente invulgar”, comentou Mark Parrington, cientista coordenador do Serviço de Monitorização da Atmosfera do Copérnico, citado na nota de imprensa.
“A meteorologia teve o seu papel, com tempo quente e seco a tornar a vegetação mais inflamável, o que faz aumentar o risco de incêndios de grande escala”, acrescentou o investigador. As alterações climáticas estão a fazer com que estas condições meteorológicas sejam mais frequentes e alongam a época de incêndios. No Árctico, as temperaturas estão a aumentar mais rapidamente do que a média global, o que pode contribuir também para os incêndios no Canadá.
O padrão climático El Niño, que se está a formar, pode também estar a ajudar a criar condições favoráveis a estes incêndios excepcionais no Canadá.
As alterações climáticas contribuem certamente para esta catástrofe no Canadá. E sabe-se que a actividade humana - que está na origem das emissões que causam as alterações climáticas - é o principal gatilho da ignição de incêndios florestais, sendo responsável por quase 70% da área total queimada a nível global, avançava um relatório da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) divulgado em Maio.
As emissões de carbono relacionadas com os fogos florestais nas regiões boreais costumam chegar ao ponto mais alto no fim de Julho e início de Agosto, diz Mark Parrington. “Por isso, ainda devem continuar a aumentar durante algumas semanas”, adiantou.
O Serviço de Monitorização da Atmosfera usa observações de satélite da potência radiactiva do fogo, uma medida da intensidade e do calor dos incêndios activos, para estimar as emissões dos diferentes poluentes que constituem o fumo.
Em Junho, centenas de milhares de pessoas foram forçadas a deixar as suas casas por causa dos grandes incêndios na Nova Scotia (uma das províncias marítimas do Leste do Canadá, no oceano Atlântico), cujo fumo chegou até Nova Jérsia, Nova Iorque e Pensilvânia, nos Estados Unidos. Os seus rastos de fumo chegaram até a Portugal. Em Julho, foi a vez de ver o fogo a destruir uma boa parte das ilhas gregas, sobretudo Rodes, e a mandar milhares de turistas de volta para casa.
Tem havido também incêndios florestais significativos na Leste da Rússia, em Junho e Julho, mas não tão disseminada com nos verões de 2019, 2020 e 2021, diz o comunicado do Copérnico.