Sánchez lança-se para a investidura e Feijóo repete que foi o “vencedor das eleições”
Líder socialista diz que tem consigo a “maioria social” do país e respondeu com ironia à carta de Feijóo. O líder popular acusa Sánchez de querer “marginalizar milhões de espanhóis”.
Já não era propriamente um segredo, mas Pedro Sánchez decidiu desfazer o tabu e anunciou nesta segunda-feira que vai procurar manter-se como presidente do Governo espanhol. Num vídeo divulgado a meio da manhã nas redes sociais do PSOE, o líder socialista diz querer “trabalhar para conseguir uma investidura” e fecha definitivamente a porta à possibilidade de viabilizar a chegada de Alberto Núñez Feijóo ao poder.
O líder popular escreveu no domingo uma carta a Sánchez para que este aceitasse uma reunião entre ambos com vista à sua investidura, o que dependeria de uma eventual abstenção dos socialistas. “Um factor contínuo de governabilidade e de normalidade no nosso país, ao longo da sua história democrática, tem sido o reconhecimento de que a força política vencedora das eleições legislativas é a que deve governar”, argumentava o líder do PP.
Mas Sánchez não demorou muito a responder e com uma diferença de tom notória, a começar logo pela pessoa gramatical escolhida: enquanto Feijóo tratou o adversário por “tu”, como é coloquial em Espanha, Sánchez devolveu com um tratamento de “você”. Além disso, também não se coibiu de ironizar, ao escrever que hoje existem “meios mais ágeis de interlocução do que o diálogo epistolar”.
De resto, a missiva do líder socialista é uma negativa a Feijóo em toda a linha. Responsabiliza o líder do PP por não existir mais diálogo entre os dois maiores partidos, afirma que existem “regras claras” para a formação de Governos na Constituição espanhola e diz que o próprio Feijóo já as aproveitou. “Estou seguro de que compreende e partilha este princípio básico da democracia parlamentar, porque tem sido historicamente aplicado pelo seu partido, de modo sistemático em todas as latitudes de Espanha, de cada vez que lhe permitiu alcançar a presidência de governos autonómicos e câmaras municipais embora não fosse a força mais votada”, escreveu Sánchez.
Quanto ao pedido de reunião propriamente dito, o socialista remeteu-a para depois de o rei encarregar um dos líderes partidários para formar Governo.
Isso deverá acontecer depois de 17 de Agosto, dia em que toma posse o novo Congresso dos Deputados. Tradicionalmente, o rei convida o líder da força mais votada a tentar formar um Executivo, mas este pode recusar o encargo se perceber que não tem maioria suficiente – foi o que aconteceu com Mariano Rajoy em 2016. Nesse caso, também não foi possível a Pedro Sánchez criar uma maioria em seu redor e Espanha voltou a ter eleições legislativas uns meses depois.
Depois de contados os votos dos espanhóis no estrangeiro, o PP ficou com 137 deputados e complicou um pouco mais uma tentativa de investidura de Sánchez. Somados os deputados socialistas (121) com os do Sumar (31) e os das forças nacionalistas catalãs e bascas (19), o bloco de esquerda alcança 171 eleitos, exactamente os mesmos que os do bloco constituído por PP (137), Vox (33) e UPN (um).
Nestas contas não estão os sete deputados do Junts, o partido independentista da Catalunha liderado por Carles Puigdemont, cujo voto favorável, e não apenas a abstenção, se tornaram imprescindíveis para a investidura de Sánchez.
A menos que a deputada única da Coligação Canária decida votar a favor. Cristina Valido surgiu inesperadamente na cena política espanhola como a pessoa que pode desbloquear o impasse tanto para o PSOE como para o PP. Na primeira votação de investidura é preciso ter maioria absoluta (176 votos a favor) para esta ser aprovada, mas na segunda basta uma maioria simples. “Não está nada predefinido. Nós temos sido perfeitamente capazes de manter uma relação cordial com ambos os partidos”, disse Valido à rádio SER. “Poderíamos alcançar um acordo pontual de investidura com o candidato que tenha mais votos”, acrescentou, sublinhando que as negociações se devem fazer em torno “das Canárias e dos seus problemas” e desde que “a extrema-direita e a extrema-esquerda” não estejam no Governo.
No seu vídeo desta segunda, Sánchez dizia ter do seu lado uma “maioria social” que agora quer “traduzir numa maioria parlamentar”.
Pouco depois, Feijóo reiterava que foi o “vencedor das eleições” e garantia: “Não vou aceitar, em nenhum caso, que se pretenda converter em minoria metade dos espanhóis. Marginalizar milhões de cidadãos não é formar maiorias, mas sim dividir o país.”
De acordo com a lei espanhola, a partir da primeira sessão de investidura começa a contar um relógio de 47 dias – se nesse período não for investido nenhum presidente do Governo, os espanhóis voltam às urnas. Neste caso, seria por volta do Natal.