O mini-biólogo Dinis quer convencer-nos que todos os animais contam. “Não é só um bicho, é uma vida!”

Eis o mundo de Dinis Rocha, de 11 anos, o “mini-biólogo” com uma missão: “Fazer com que as pessoas parem de matar animais”. Desde um mosquito ao tubarão.

Foto
Dinis, o mini-biólogo Tiago Bernardo Lopes
Ouça este artigo
00:00
10:53

A praia do Castelo do Queijo, em Matosinhos, está tranquila. São 9h30 da manhã de um dia de semana e algumas pessoas aproveitam a maré baixa para estender a toalha e aproveitar um pouco de sol com pouco vento. De repente, uma pedrada no charco: entra na areia Dinis Rocha, 11 anos acabados de fazer, vestido com o fato de mergulho e pronto para explorar a praia preferida para descobrir os seus mistérios.

“Cada praia tem a sua própria fauna”, explica logo de caras Dinis, “o mini-biólogo”, como passou a ser conhecido nas redes sociais. Na sua conta no Instagram @dinis_o_mini_biologo (e às vezes no Youtube), explora praias e parques naturais à procura de animais para mostrar. São eles, visivelmente, a sua grande paixão. “Nunca devemos matar um animal, é uma vida”, ouvimos-lhe várias vezes ao longo do dia.

i-video

O mini-biólogo explora as praias e parques naturais à procura de animais para mostrar. São eles, visivelmente, a sua grande paixão.

Tiago Bernardo Lopes

A motivação para criar o canal no Instagram, em Setembro do ano passado, veio da vontade de partilhar com outros miúdos - e também com adultos - que os animais importam e que, conhecendo-os, podemos perder o medo deles e, quiçá, conviver. “A missão aqui é fazer com que as pessoas parem de matar animais e conhecer mais sobre a natureza”, explica-nos Dinis. Até os mosquitos mais chatos, reforça, têm o seu papel e a sua importância no nosso planeta.

Foto
Nelson Rocha ajuda o filho Dinis, apaixonado por animais, a vestir o fato de mergulho na Praia do Castelo do Queijo, em Matosinhos Tiago Bernardo Lopes

A paixão por animais começou desde cedo. Primeiro foram os animais marinhos, descreve, falando sobre as idas à praia onde encontrava caranguejos, maragotas, camarões - “e fiquei a gostar muito deles”. Foi com o livro Fauna e flora do mar que descobriu o gosto pela biologia. “Consegui estudar aqui sobre os animais marinhos, tem vários animais engraçados”.

Dinis leva muito a sério o seu trabalho como divulgador de ciência: “Faço ao máximo por ser um biólogo.” A decisão de gravar um vídeo para o Instagram parte sempre de leituras apaixonadas sobre um ou outro animal que lhe chama a atenção. Se tem dúvidas, procura vídeos de biólogos no Youtube ou no Instagram - e, claro, consulta os seus livros de eleição.

Mostra-nos o Guia Fapas dos Anfíbios e Répteis de Portugal, o “livro lendário” que o deixou “com mais amor por répteis e anfíbios”, aprendendo, por exemplo, a diferenciar sapos de rãs e a distinguir melhor as relas. Há poucas semanas, no seu aniversário, recebeu Anfíbios e Répteis de Portugal - “apresento-vos o melhor livro, tenho aqui muita informação” -, que já apresenta um aspecto de algum uso.

Agora, usa ambos os livros para estudar e preparar as expedições, para não ser apanhado desprevenido por espécies que não conhece. Com o apoio do pai, Nelson, que produz os vídeos e dá uma ajuda a gerir a página no Instagram, Dinis Rocha organiza expedições onde os seus seguidores podem explorar a fauna de diferentes lugares.

Na primeira, foram pouco mais de uma dúzia de pessoas. Na quarta expedição, que aconteceu na Praia do Castelo do Queijo já depois da sua participação no programa Praça da Alegria, foram mais de 50. “O meu canal é uma coisa de que sinto muito orgulho. Pensei que ao fim de muitos anos ainda ia ter só uns 100 seguidores, não sabia que ia fazer sucesso. Mas nove mil seguidores é muito.”

Nelson Rocha ajuda o filho Dinis, apaixonado por animais, a gravar um vídeo na Praia do Castelo do Queijo, em Matosinhos Tiago Bernardo Lopes
Dinis Rocha mergulha na Praia do Castelo do Queijo, em Matosinhos Tiago Bernardo Lopes
Dinis, o mini-biólogo, na Praia do Castelo do Queijo, em Matosinhos Tiago Bernardo Lopes
Dinis e o pai, Nelson, na Praia do Castelo do Queijo, em Matosinhos Tiago Bernardo Lopes
Fotogaleria
Nelson Rocha ajuda o filho Dinis, apaixonado por animais, a gravar um vídeo na Praia do Castelo do Queijo, em Matosinhos Tiago Bernardo Lopes

Agora, promete fazer um vídeo especial quando chegar ao patamar dos dez mil seguidores. “Prometo-vos que vou encontrar um animal especial. E muito provavelmente vai ser uma cobra.”

“Debaixo de água estás noutro mundo”

“Pai, deixa o Tiago ver-me a nadar!”, pede Dinis, quando a equipa do Azul se junta à expedição pelas rochas da praia do Castelo do Queijo. Sempre atento, Nelson Rocha vai dando algumas dicas, tentando que a paixão do filho não seja demasiado intensa para os animais de que tanto gosta. “Isto para a maior parte dos animais é um bocado stressante”, vai relembrando ao filho.

Vestido a rigor com o fato de mergulho, Dinis faz snorkeling (mergulho em águas rasas) nas poças que se formam entre as rochas da praia. “Debaixo de água parece que estás noutro mundo”, comenta, deslumbrado. “Vemos o que é que está colado às rochas. O que é que está escondido debaixo das algas. O que é que vive dentro das poças”, descreve. “Parece que és mesmo um peixe. É mesmo o POV [point-of-view] do peixe!”

Vai recolhendo os animais num balde com água e pára de vez em quando para depositá-los num recipiente de plástico maior. Numa das passagens pela areia, uma senhora comenta: “Que bonito, ensinar estas coisas às crianças!” Explicamos que é o Dinis que nos está a ensinar, o que deixa a interlocutora entusiasmada.

Mais à frente, quando o “mini-biólogo” desafia os jornalistas a segurar numa vinagreira-negra, a senhora - que continuou por perto - segue a deixa e segura uma destas lesmas-do-mar ao colo, como se fosse um bebé. “Nunca tinha visto, mas gostei de ver”, comenta. Entretanto, notamos que o seu braço ficou com uma mancha roxa - o bicho, afinal, não gosta de ser tão mimado. A amiga parece dizer-lhe que não mexa nos animais. “Então, se o menino pôs a mão, porque é que não pomos?”

Foto
Nelson Rocha ajuda o filho Dinis, apaixonado por animais, a gravar um vídeo para o canal no Instagram Tiago Bernardo Lopes

A curiosidade é contagiante. “Há realmente muitos mistérios que existem nesta praia, tem vários buracos e os animais escondem-se e não consegues perceber bem o que são”, descreve, entusiasmado. Na "expedição" que fez com a equipa do Azul, recolheu vários peixes e mostrou também uma minúscula estrela-do-mar serpente, um caranguejo porcelana e as enormes vinagreiras-negras (que fez questão que segurássemos).

Mas é a navalheira que mais o apaixona. “Sabem as colecções de cromos que toda a gente comprava? Havia uma caderneta chamada Fome de vencer. Ela não está com fome de vencer, está com fome de matar”, brinca Dinis, enquanto segura no animal que se debate com as tenazes.

Há ainda tempo para gravar um vídeo a mostrar as descobertas do dia e, claro, várias desculpas para regressar para a água, apesar dos dedos já enrugados ao fim de quase três horas de mergulho. “Pai, deixa só libertar na poça!”

“Estás pronta para morrer de fofura?”

Como é o dia-a-dia de um mini-biólogo? “Costumo tentar passar a maior parte do tempo com os animais”, começa Dinis. Há também tempo para estudar, jogar videojogos, muitas vezes fica a falar com os amigos, que ainda não conseguiu convencer a abandonarem a expressão “é só um bicho!” - “Não é só um bicho, é uma vida!”

Ao almoço, não há animais por perto mas há a aplicação iNaturalist, em que diz estar “viciado” e que recomenda vivamente (sim, também no Azul acabamos por instalar). “Estás pronta para morrer de fofura?”, pergunta, enquanto procura na app fotografias de uma cobra-nariz-de-porco a contorcer-se de forma engraçada. A dada altura, a conversa é interrompida por uma chamada da mãe. “Encontramos bicharada boa e uma grande navalheira!”

Ao longo da conversa, que quase nunca se afasta dos animais, aprendemos que o louva-a-deus é “o verdadeiro rei da selva”, já que “mata o que quiser com as pinças - aquilo são umas foices!”. Mas no que toca a predadores, é mesmo o homo sapiens que assume o top, causando destruição de outros animais muito além da sua cadeia alimentar. O pai aproveita para sublinhar a mensagem: “Cada espécie, cada insecto, cada mamífero tem o seu espaço. E nós também temos o nosso, e infelizmente às vezes não sabemos respeitar o espaço dos outros animais.”

Ao início da tarde, junta-se a pequena Margarida, que aos oito anos já se deixou contagiar pelo entusiasmo do irmão mais velho. Para já, quando for grande, quer ser veterinária - “vais poder trazer-me todos os teus animais doentes”. Há muito tempo que ficou para trás qualquer medo dos animais do irmão - e junta-se ao Dinis na insistência em que a equipa do Azul segure nos bichos exóticos.

Dinis brinca com Marcos, a sua rã-de-olhos-vermelhos Tiago Bernardo Lopes
Dinis com o seu cão, Woody Tiago Bernardo Lopes
Fotogaleria
Dinis brinca com Marcos, a sua rã-de-olhos-vermelhos Tiago Bernardo Lopes

No apartamento da família Rocha, conhecemos os animais da casa: Carlos, o gecko leopardo, Marcos, a rã arborícola de olhos vermelhos, Bob, o axalote, Pleco, o plecostomus, Woody, um enorme e simpático cão da família, e Pirulito, o coelhinho branco.

Nelson Rocha ri-se quando perguntamos como é viver com tantos animais. Estão em processo de despedida das tartarugas Mimi, Josefina e Pedra, e à procura de soluções para limitar a bicharada em casa. “Não que não possa ou não deva ter animais em casa, mas deve ter se calhar um, dois no máximo”, pondera. Até porque, explica, “se ele quer seguir esta carreira de biologia, o Dinis vai acabar por perceber que o interessante é observar os animais num ambiente real, e não ter animais em cativeiro”.

Todos os animais contam

No mundo do Dinis, onde aprendemos que répteis, anfíbios e insectos têm vidas interessantes e que os tubarões são essenciais para os nossos ecossistemas, também se descobre que os animais mais populares entre os humanos não são assim tão diferentes dos outros. Um vídeo dos golfinhos, que publicou recentemente, gerou alguma controvérsia. “As pessoas gostam de golfinhos e descobriram que os golfinhos não são assim tão fofos. Eles são espertos, mas continuam a ser animais selvagens”, explica o Dinis.

“Os animais têm lados bons, lados menos bons, e faz parte. Aqui fala-se das coisas boas e das coisas más”, explica o pai do mini-biólogo, que não é da área das ciências. “Nós somos biólogos por afinidade”, conta Nelson Rocha, que trabalha no sector audiovisual, e que com a esposa teve que aprender mais sobre os animais para conseguirem guiar o filho nas suas explorações.

“Ele sempre gostou de pegar em tudo o que via na rua e em qualquer sítio. Insectos, caracóis, tudo o que mexesse ele gostava de explorar, ver o que era.” Hoje em dia, brinca, “isto é o futebol dele”. “Se eu tivesse um filho que gostasse de futebol, tinha que ir levá-lo aos treinos, aos jogos. E é isso que fazemos com o Dinis”, resume o pai. Mas todos acabam por sair a ganhar: as idas à praia ou para alguma serra são também oportunidades de estar em família na natureza.

Começaram já há algum tempo a fazer registos das explorações, em jeito de diário de campo, e a partir daí não faltou muito para criar o canal, que coincidiu com a mudança de escola para o 5.º ano. Além de abrir uma janela do mundo do Dinis, para os miúdos da escola e da turma perceberem o seu fascínio, tem “um propósito muito claro de prevenir que as pessoas matem os animais porque não conhecem o comportamento deles”.

Para o pai, “a grande vantagem que o Dinis tem é a capacidade de reter informação e de comunicação". "É isso que acho que ele é singular. Ele aprende as coisas de uma forma muito rápida e tem uma forma de comunicar que é muito assertiva. E é muito empático. Quando é a área que ele gosta de falar, ele cria empatia de forma facilitada.”

Entretanto, Dinis também vai mantendo contacto com alguns biólogos profissionais e também outros mini-biólogos. Fez alguns amigos entre os membros do Adventure Club Lisboa, para quem gosta de “bichos e bicharocos”, e até se lançou a criar a sementinha para um Adventure Club Porto - mas, por enquanto, tem sido difícil ter tempo para alimentar tantos canais de vídeos.

Na hora da despedida, os irmãos perguntam-nos quais foram os nossos momentos preferidos (a resposta: segurar animais em que nunca sequer teríamos tocado se não fosse pelo incentivo das duas crianças). E o do Dinis? “Só sei que tivemos uma sorte bem grande de encontrar aquela navalheira.”