Sophia Kianni é activista climática e tem um conselho para todos: “Usem a vossa voz pelo clima”
Activista de 21 anos fundou organização para melhorar a literacia sobre o clima. Sophia Kianni diz que só há uma forma de resolver as alterações climáticas: o fim da produção de combustíveis fósseis.
Sophia Kianni está muito ocupada. Há sempre algo a fazer na vida desta activista climática de 21 anos. Neste momento, está à nossa frente a mexer energeticamente no telemóvel – ora a responder a algumas mensagens, ora atenta às mensagens que tem de passar nas redes sociais. “Dê-me só mais uns segundos”, diz-nos, momentos antes de uma entrevista, depois de já ter dado outras, e ainda antes de falar numa conferência sobre clima em Madrid. “Estes têm sido dias loucos!”
Os dias loucos chegaram à vida de Sophia Kianni quando decidiu que queria lutar pelo clima. Tudo começou quando tinha 12 anos. “Foi esse o momento em que aprendi sobre alterações climáticas na escola”, conta-nos, quando parou um pouco, para a entrevista. Por essa altura, nas suas férias de Verão, foi a Teerão, no Irão, onde os pais nasceram, e teve o seu primeiro grande choque: “Quando estava lá, fiquei chocada pelo quão horrível era a poluição no ar.” Mais: ficou a saber que, no Médio Oriente, as temperaturas estavam a subir mais do que o dobro do que a média global.
O cenário que encontrou na altura não ficou por aqui. Apercebeu-se ainda que os seus familiares não tinham a noção de quão grave eram as alterações climáticas para o planeta. “Os meus familiares não sabiam de nada!” – diz ainda com espanto. Sophia Kianni não podia ficar de braços cruzados. Foi então que que começou a falar com os seus familiares e outras pessoas à sua volta sobre a crise climática.
Mas Sophia Kianni não se ficou pelo que ia vendo no seu dia-a-dia. A activista começou a fazer pesquisas sobre conteúdo ambiental. E eis que ainda ficou mais chocada com a situação: “Encontrei um estudo que indicava que apenas 5% dos estudantes no Irão conseguiam explicar adequadamente o efeito de estufa. Ter a noção de tudo isto fez com que ficasse extremamente alarmada.”
À medida que ia procurando mais e mais informação, reparou num importante pormenor: a maior parte dos conteúdos sobre alterações climáticas estava só disponível em inglês. Aí, decidiu que não poderia ficar parada. Logo na altura, com a ajuda da sua mãe, traduziu para farsi algum material sobre o clima. Mas este foi só um pequeno passo no que viria a ser uma das suas frentes no activismo climático.
O grande passo foi dado em 2020, quando fundou a organização sem fins lucrativos Climate Cardinals. A missão desta organização é melhorar a literacia sobre o clima a nível global e resolver parte da dificuldade inicial que Sophia Kianni encontrou nas suas pesquisas – a maioria do conteúdo científico sobre o clima está em inglês, mas há muitas pessoas no mundo que não sabem esta língua. Como tal, na sua organização fazem-se traduções de material sobre o clima para cerca de 100 línguas.
Não é um pormenor a organização ter sido fundada em 2020, durante a pandemia de covid-19. As manifestações pelo clima estavam paradas. Muitas das conversas sobre o clima estavam paradas. Mas o problema climático não ficou parado. Sophia Kianni quis mexer, de alguma forma, na crise climática e criou uma rede onde muitos dos jovens pudessem ter um contributo num momento em que as vozes se faziam ouvir online – criou a Climate Cardinals.
Uma organização para a literacia do clima
“O nosso objectivo é capacitar toda a gente no mundo para que faça parte do movimento climático”, sintetiza sobre a missão da Climate Cardinals. Sophia Kianni fala em “nosso objectivo”, porque são mais de 9000 os voluntários da sua organização pelo mundo. Até agora, esses voluntários já traduziram 500.000 palavras desde 2020. Para garantir que as traduções são credíveis e o conteúdo correcto, a organização trabalha com profissionais de serviços como a Respond Crisis Translation e comunidades como a Translators Without Borders.
Este ano, a Climate Cardinals ganhou uma nova ajuda. A partir de 2023, ferramentas de inteligência artificial da Google passaram a ajudar os voluntários. Até agora, a plataforma Translation Hub traduziu 800.000 palavras para mais de 40 línguas. Com todas estas ajudas, Sophia Kianni tem um único desejo: “Combater a desinformação e a informação errada, para que as pessoas percebam qual o caminho que causou a crise climática – que foi a indústria dos combustíveis fósseis.”
Entre o trabalho na sua organização e as palestras que vai dando pelo mundo, Sophia Kianni está a estudar Ciência, Tecnologia e Sociedade na Universidade de Stanford, nos Estados Unidos. O seu grande objectivo neste curso é melhorar a sua forma de comunicar, sobretudo na comunicação do clima. “Vejo-me como uma comunicadora e uma contadora de histórias”, descreve-se.
É desta forma que se reconhece também como activista. “Estou sempre a dizer às pessoas: não sou uma cientista climática. O meu objectivo é ser uma comunicadora.”
A sua voz foi uma das escolhidas para integrar o Comité Jovem do Programa Ambiental das Nações Unidas. “Tenho tentado comunicar da melhor forma sobre quais são os conselhos dos jovens nos Estados Unidos [sobre o clima]”, conta, sobre a experiência. “Quão preocupados estão? Que tipo de acções climáticas querem eles ver?” Além disso, tem juntado jovens por todo o mundo para que escrevam documentos que demonstrem as suas preocupações com o ambiente, bem como propostas aos ministros dos seus países.
Sobre o que querem os jovens, Sophia Kianni é bastante clara: querem mais investimento em educação climática, mais empregos ligados ao ambiente e que os grandes poluidores sejam responsabilizados pelos danos que estão a causar ao planeta. “Sou muito pragmática relativamente aos assuntos e soluções que precisamos para que haja uma mudança.”
E essa mudança só pode ser feita de uma forma: o fim da nova produção de combustíveis fósseis. “É incompreensível como continuamos a ter a produção de combustíveis fósseis como temos hoje e no tempo em que vivemos”, defende. “Temos de investir fortemente em energias renováveis porque será uma forma de fazermos a transição de forma sustentável.”
Para tal, a mudança tem (também e em grande parte) de estar do lado dos governos. “Cerca de 75% das emissões [de gases com efeito de estufa] vêm de combustíveis fósseis. Não interessa só quanto tu ou eu emitimos ou o que reciclamos. Não é isso que mudará a forma como lidamos com as alterações climáticas “, argumenta. “Toda a nossa energia e todos os nossos esforços têm de ser direccionados para responsabilizar os poluidores pelos crimes que estão a cometer contra a humanidade.”
Um protesto e uma greve de fome
Esta mensagem tem sido cada vez mais clara para Sophia Kianni – desde os primórdios da sua vida como activista decidiu participar numa acção com o movimento Extinction Rebellion em Washington. Em 2019, então com 17 anos, a activista participou nesse protesto e greve de fome em frente ao escritório de Nancy Pelosi, presidente da Câmara dos Representantes dos EUA na altura.“Não podia votar e achava que não tinha voz num sistema político que estava praticamente a planear a minha morte. Foi esta raiva, este impulso e esta ansiedade [que me fizeram participar nesse protesto]”, relembra, hoje com 21 anos e um caminho mais consolidado no activismo.
Estava ali porque queria fazer ouvir a sua voz. “Queria pressionar os responsáveis políticos e fazê-los sentirem-se culpados e envergonhados quanto às alterações climáticas, porque está nas suas mãos tomar o controlo da situação.” Também estava ali porque queria chamar a atenção dos meios de comunicação social. “Lembro-me de perguntar a um jornalista: ‘Se não estivesse a fazer uma greve de fome, estaria aqui?’ Ele não teve nada para me dizer.” É por isso que protestos como estes do Extinction Rebellion podem ter algum efeito, considera: “Podem ser uma forma eficaz de aumentar a consciência sobre a necessidade da acção climática.”
Hoje, anda noutras andanças. Em Junho, foi uma das oradoras da conferência “We Choose Earth”, um evento organizado pela EDP, em Madrid. No seu discurso, Sophia Kianni mostrou o interesse da sua geração nas questões climáticas. “As gerações mais jovens querem mesmo fazer parte da solução! A minha geração é aquela que tem mais a perder com os impactos das alterações climáticas”, assinalou para uma plateia de diferentes gerações. Todas essas gerações a aplaudiram durante a sua intervenção.
A sua missão é conseguir que a voz destas gerações mais jovens seja ouvida: “O objectivo do meu activismo é que outros jovens sejam educados e tenham uma voz.” Sophia Kianni defende que todos fazem parte da solução e que nessa parte da solução é preciso pressionar os decisores políticos. Por isso, este é o seu maior conselho: “Usem a vossa voz pelo clima. Eduquem-se a vocês mesmos, falem nas redes sociais e tenham a maior quantidade de conversas possíveis sobre alterações climáticas. O mais importante é que este assunto seja falado.”
Para a activista, a sua geração tem uma vantagem: é a geração do TikTok. “Gostaria que outros activistas olhassem para mim e percebessem que tudo começou com vídeos no TikTok”, diz, sempre atenta às notificações que vai recebendo no seu telemóvel sempre a piscar. Desses pequenos vídeos salta para o mundo real e espera influenciar outros jovens: “Quero inspirar outros jovens para que percebam que até as mais pequenas acções podem fazer um mundo melhor.”
O PÚBLICO viajou a Madrid a convite da EDP