O abandono animal aumenta sempre no Verão. O que se pode fazer para acabar com ele?

Provedora do Animal quer rede de apoio para animais de famílias carenciadas. PAN defende redução do IVA das rações e hospital veterinário público. Só neste ano já foram abandonados quase 300 animais.

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Abandono animal aumenta sempre no Verão. Como acabar com ele? Margarita Kosior/Unsplash
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O Verão é, cada vez mais, sinónimo de abandono animal. Apesar de ser crime desde 2014 (com direito a oito meses de pena de prisão), é uma situação que acontece com cada vez mais frequência, especialmente quando os tutores vão de férias e não têm onde deixar o cão e o gato.

Com o aumento das temperaturas, chegam também as campanhas contra o abandono. Este ano, segundo dados enviados ao P3, a GNR registou 180 crimes de abandono e a PSP 94 (274, no total). Além destes números, o abandono animal costuma ser quantificado pelo número de cães e gatos que chegam aos centros de recolha oficial. Em 2022, afirma a porta-voz do PAN, Inês Sousa Real, chegaram 42 mil (41.994) animais aos vários centros do país. Tinham sido quase 44 mil em 2021, no entanto, é provável que os "valores reais sejam muito superiores". São “cerca de 115 animais abandonados diariamente”, reforça.

Para a deputada do PAN, é um problema que “se agudiza no Verão”, em parte, devido à limitação de entrada de animais em vários espaços como praias, estabelecimentos comerciais ou alojamento de férias, o que serve de motivo para muitos donos os deixarem nas ruas. Ainda assim, reforça, estes entraves não são desculpa para o abandono.

Neste momento, existem cerca de 90 praias em Portugal que autorizam a presença de cães, número que a porta-voz do PAN considera “muito pouco significativo”. O ideal seria que todas permitissem a entrada com a possibilidade de existirem zonas específicas para as pessoas que levam os seus cães à praia e outras para as que não têm ou preferem manter-se afastadas destes animais pelos mais variados motivos. No entanto, defende, o maior problema que existe actualmente “é a ausência de opções para animais nos hotéis e espaços de alojamento” e, por isso, apela a uma mudança a tempo destas férias.

O que fazer com os animais errantes?

Outro dos problemas é sobrepopulação de cães e gatos e, por isso, é importante continuar com as campanhas de esterilização de colónias. Na mesma linha, está, neste momento, em curso na Assembleia da República uma iniciativa proposta pelo PAN que propõe, à semelhança do que aconteceu com os gatos, programas de esterilização para as matilhas de cães, pelo menos, enquanto “os números alarmantes” do abandono não diminuírem.

“Uma matilha não tem características para adopção e também não tem características para estar fechada num canil, uma vez que isso poria em causa o seu bem-estar”, defende Inês Sousa Real, alertando ainda para o facto de nem todas as autarquias terem parques de matilhas e de algumas não terem sequer centros de recolha oficial ou programas de captura, esterilização e devolução (CED).

Laurentina Pedroso, provedora do Animal, partilha da mesma opinião. Embora reconheça que Portugal nunca aplicou tanto dinheiro na ajuda à causa animal e que o Governo "deu largos passos" em proporcionar esta ajuda, defende que o Estado deveria ter um papel mais activo para evitar a “reprodução indesejada” de animais através de campanhas de esterilização obrigatórias não só de cadelas e gatas errantes, como também das que têm dono e demasiadas ninhadas.

“Do meu ponto de vista, o próprio Estado e as câmaras municipais podem garantir a esterilização desses animais. É uma obrigação em termos de saúde e bem-estar animal e em termos de saúde pública”, reitera. Ainda assim, o primeiro passo passa sempre por sensibilizar e educar os tutores que se recusam ou mostram algum cepticismo em esterilizar ou castrar os seus animais para o problema da sobrepopulação.

Por outro lado, é também preciso pensar nos animais sem dono acolhidos pelos centros de dia, escolas ou corporações de bombeiros. Neste caso, Inês Sousa Real defende que a figura do animal comunitário, ou seja, espécies que vivem na rua, mas cuja alimentação e cuidados médico-veterinários são assegurados por uma pessoa ou grupo colectivo, deve ser reconhecida para que estes animais possam ser registados em nome destas entidades. “É menos um animal que entra num canil e menos um animal que está abandonado. Mas isto em nada deve desresponsabilizar o abandono, que é crime e um acto absolutamente cruel”, completa.

Hospital veterinário público e tratamentos gratuitos

A par do abandono por perda de ligação com o animal, a subida dos preços das rações e aumento das despesas veterinárias também têm contribuído para agravar o problema. Neste momento, à excepção das marcas brancas, a ração mais barata para cão custa 30 euros e para gato 43,36 euros, segundo o comparador de preços KuantoKusta.

A redução do IVA de 23 para 6% na alimentação de pessoas e animais de companhia foi uma das medidas propostas pelo PAN durante a pandemia e devido ao aumento da inflação, mas acabou rejeitada. Em contrapartida, recorda Inês Sousa Real, nesse mesmo período o IVA para alimentação dos animais de pecuária passou para 0%. Cuidar de um animal ainda é considerado um luxo em Portugal, sentencia.

Outra das medidas que o partido tem vindo a sugerir nos Orçamentos do Estado (OE) dos últimos anos é a criação de uma rede de cuidados médico-veterinários gratuitos para os animais de famílias carenciadas, bem como a criação de um hospital veterinário público acessível a todos e que cobraria taxas consoante os rendimentos dos tutores.

A segunda proposta acabou por ser recusada, mas a primeira está no OE deste ano com uma verba de um milhão de euros. Contudo, e segundo dados do ICNF enviados ao P3, até esta segunda-feira, apenas 56 de 830 municípios se candidataram aos apoios. As autarquias têm até quinta-feira, dia 13 de Julho, para aderir.

Laurentina Pedroso vê a medida com bons olhos, mas questiona se existe uma estrutura pensada para a aplicar na prática "de forma correcta e transparente".

“Desde a minha tomada de posse que ando a pedir ao Governo para me deixar criar uma rede nacional de apoio aos animais de risco, incluindo os que estão nos centros de recolha oficial. Essa rede nacional baseia-se num sistema estruturado. O que acontece aqui é que dar verbas para tratamentos médico-veterinários num sistema que não é equitativo no país”, afirma, acrescentando que o mesmo tratamento tem diferentes custos consoante a clínica e localidade onde o cão ou o gato é tratado.

Inês Sousa Real completa a dúvida lançada pela provedora abordando “a asfixia financeira” dos tutores que é cada vez maior. Prova disso são os cerca de mil pedidos de ajuda que o PAN recebe por ano de pessoas com animais de companhia que já não conseguem suportar os custos das rações ou despesas veterinárias.

Além de aliviar as despesas dos tutores, a criação de uma rede de serviços médico-veterinários diminuiria o tempo de espera entre o pedido para que o animal seja tratado e o início do tratamento, uma burocracia que, para a deputada do PAN, "não se coaduna, muitas vezes, com a urgência que possa existir com o tratamento do animal”.

“Achamos que em conjunto será perfeitamente possível encontrar uma solução que sirva ao país, mas que, acima de tudo, não deixe os animais para trás”, conclui Inês Sousa Real.

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