A Terra registou o seu dia mais quente — pela terceira vez esta semana. É normal?

Foram três recordes diários consecutivos da temperatura média global e Junho foi também o mais quente desde que há registo. Um mundo cada vez mais quente pode trazer consigo mais e mais recordes.

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Temperatura global atinge 17,18 graus Celsius, terceiro recorde nesta semana Reuters/Guglielmo Mangiapane
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Poucos dias depois do final do mês de Junho — considerado o Junho mais quente desde que há registos —, o planeta continua a registar recordes: a temperatura média da Terra voltou a atingir um máximo nesta quarta-feira (17,18 graus Celsius), de acordo com o Climate Reanalyzer (da Universidade do Maine, EUA), igualando a temperatura média do dia anterior. Foi o terceiro recorde diário esta semana. E o responsável pela Divisão de Clima e Alterações Climáticas do Instituto Português do Mar e Atmosfera (IPMA), Ricardo Deus, refere que estes recordes “podem acontecer cada vez mais no futuro”.

Não é algo incomum: nas últimas duas décadas, tem sido “frequente alcançar novos valores de temperaturas e que esses extremos de temperatura sejam batidos até nos dias seguintes”, explica Ricardo Deus, em conversa com o Azul. No entanto, é sintomático do aquecimento do planeta: “Todos nós conseguimos perceber que estamos a viver num clima diferente e uma das diferenças que temos constatado, precisamente com reflexo no nosso território continental, tem a ver com a temperatura do ar.”

As projecções futuras apontam para que se possam observar valores de temperatura do ar “ainda mais altos” nos próximos anos, refere Ricardo Deus – e, também, mais recordes de temperatura.

Ricardo Deus explica que as causas deste aumento de temperatura estão directamente relacionadas com as alterações climáticas, resultantes do impacto das actividades humanas no planeta: “Neste momento, a grande concentração de gases com efeito de estufa é uma das grandes causas de um aumento da temperatura à superfície”. Em causa estão os elevados níveis de concentração dos gases com efeito de estufa, como o dióxido de carbono e o metano.

Resumindo: na segunda-feira, 3 de Julho, foi batido o recorde de temperatura média global de 17,01 graus Celsius, de acordo com um serviço dependente da Agência dos EUA para a Atmosfera e os Oceanos (NOAA, na sigla em Inglês). No dia seguinte (4 de Julho), foram registados 17,18 graus Celsius, valor atingido novamente nesta quarta-feira (5 de Julho). A anterior temperatura média mais alta tinha sido registada há um ano, em Julho de 2022: foram 16,92 graus Celsius.

O Junho mais quente

Estes recordes da temperatura média juntam-se ao recorde de Junho de 2023 ter sido o mais quente globalmente desde que há registo, “muito acima do recorde anterior de Junho de 2019”, lê-se num boletim do Serviço de Alterações Climáticas do Copérnico, o programa de observação da Terra da União Europeia. A temperatura média global foi de 16,51 graus Celsius em Junho, pouco mais de 0,5 graus Celsius acima da média de 1991-2020, refere o relatório. As maiores anomalias de temperatura foram detectadas no noroeste da Europa, e Portugal também registou temperaturas ligeiramente acima do normal para o normal neste mês.

As temperaturas de Junho já têm estado acima da média nos últimos 15 anos, mas este mês de 2023 esteve “muito acima dos outros”, afirmou o cientista Julien Nicolas à agência France Press, justificando que este recorde de Junho se deve em grande parte às temperaturas muito elevadas da superfície do oceano. “É o tipo de anomalia a que não estamos acostumados.”

Os cientistas têm vindo a alertar que o ano de 2023 poderá ter vários recordes de temperatura. Estes recordes agora registados acontecem em combinação com o fenómeno climático El Niño, que está a começar a formar-se.

Num comunicado divulgado em Junho, a Organização Meteorológica Mundial (OMM) salientou que a chegada do El Niño, apesar de ter "força moderada", pode "provocar mais calor extremo em muitas partes do mundo e no oceano". Esse fenómeno climático voltou a ocorrer no meio do mês passado, após três anos de La Niña, em que houve pequenas descidas nas temperaturas por todo o planeta. Sob a influência do El Niño, a previsão é de um Verão mais quente e húmido na Península Ibérica.

O chefe da Divisão do Clima do IPMA explica que, por ser um fenómeno climático cíclico que ocorre no Oceano Pacífico, onde a temperatura da superfície do mar se eleva acima do normal, o El Niño desencadeia uma série de fenómenos com impactos variados no clima e nas condições meteorológicas de diferentes regiões do planeta.

Ou seja: em algumas áreas, o El Niño pode causar chuvas intensas e inundações, enquanto noutras provoca diminuição da precipitação e aumento da temperatura. Ricardo Deus não traça uma relação directa entre os recordes de temperatura de Julho e este fenómeno, mas não nega os seus efeitos: “Se estivermos num planeta mais quente, o El Niño terá tendencialmente a temperatura da superfície do mar mais elevada e será ainda mais escalado”.

Texto editado por Claudia Carvalho Silva