É uma festa e é um protesto. É também a solução encontrada pela organização da marcha de orgulho LGBTI+ do Porto, depois de semanas de diferendo com a autarquia local e de uma petição assinada por milhares de pessoas que não demoveu o executivo.
A marcha, cujo início está marcado para as 15h de sábado, dia 8, na Praça da República, tem como destino o Largo Amor de Perdição, junto ao Jardim da Cordoaria. Ali, onde a Câmara Municipal do Porto (CMP) queria impedir a realização do arraial LGBTQI+, terá lugar uma “festa que é um protesto”, explica ao PÚBLICO o membro da comissão organizadora da marcha, Filipe Gaspar.
Haverá intervenções políticas e artísticas, mas não com o programa que a organização estava a preparar. “Talvez não lhe possamos chamar arraial, mas será uma festa popular”, diz, “uma festa que é um protesto”. Filipe Gaspar explica que, como o encontro decorre sob a figura do direito à manifestação, não há necessidade de pedir licenças. Também por isso, não haverá estruturas, nem palco montado.
A Câmara Municipal do Porto tinha feito depender o seu apoio à iniciativa da realização do arraial no Parque do Covelo, uma localização já distante do centro da cidade, o que levou a organização da marcha a acusar a autarquia de sujeitar o evento à “invisibilidade”.
Depois de ver negado o pedido para realizar o arraial no Largo Amor de Perdição, a comissão organizadora sugeriu a Alameda das Fontainhas, também numa zona central. A nova localização viria a ser igualmente rejeitada pela autarquia. Na reunião de executivo de segunda-feira, o presidente da CMP, Rui Moreira, explicou que, "da mesma maneira que as pessoas do Largo Amor de Perdição têm direito ao seu descanso e sossego”, a câmara entende que, “nas Fontainhas, é rigorosamente a mesma coisa”.
Já num artigo de opinião em que responde a uma colunista do PÚBLICO, Rui Moreira utiliza um outro argumento para a não realização do arraial no Largo Amor de Perdição: “a concentração de eventos nesse fim-de-semana no centro do Porto, uma cidade cuja mobilidade se encontra fortemente condicionada pelas obras do metro”. No texto, refere que a autarquia já tinha recusado um pedido semelhante do festival Porto Pride pelos mesmos motivos, cedendo o Parque da Pasteleira.
Ora, o PÚBLICO pediu à autarquia uma lista dos eventos mencionados. O gabinete de imprensa da CMP remeteu para um artigo publicado pela Agência Lusa, que incluía cinco acontecimentos. Apenas um, a Corrida PortuCale, decorre no centro da cidade, com um percurso pelas avenidas Gustavo Eiffel e Paiva Couceiro. Mas acontece no domingo, dia 9, no dia a seguir à marcha.
São também mencionados o Festival da Comida Continente (no Parque da Cidade), o Estádio de Praia (junto ao Edifício Transparente), o Porto Pride (no Parque da Pasteleira) e o Piquenique Dançante (no Parque de São Roque). Os três primeiros eventos têm lugar fora do anel da VCI e o Parque de São Roque fica em Campanhã. Nenhum é no centro da cidade.
O PÚBLICO pediu à autarquia para clarificar o argumento dos constrangimentos à mobilidade, mas a câmara não respondeu.
Covelo era "impossível"
A marcha é planeada por cerca de duas dezenas de colectivos e associações, sendo que a organização espera a presença de 15 mil pessoas este ano, um número que, a confirmar-se, supera as 11 mil pessoas da edição do ano passado.
A organização tinha assumido compromissos com empresas de som, com outros artistas que precisam de outra capacidade de produção e com compras como cerveja ou copos reutilizáveis, numa situação que ainda estão a tentar resolver. “Sentimo-nos mal porque as pessoas assumiram um compromisso connosco e podiam estar a trabalhar noutros sítios”, afirma.
Sublinha que, pelo espaço disponível, realizar o arraial no Covelo era “impossível” face ao número esperado de pessoas. Até à reunião desta segunda-feira, explica, a organização esperava que fosse possível chegar a uma solução consensual com a autarquia. Não foi e, ainda que sem arraial, a marcha de orgulho do Porto vai dar ao Largo Amor de Perdição.