Quase metade dos reclusos em Portugal estão em cadeias sobrelotadas

Taxa geral de ocupação dos estabelecimentos prisionais é de 96,1%, mas mais de metade das cadeias em Portugal tem excesso de reclusos. Relatório alerta para reduzidas áreas de alojamento por recluso.

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25 dos 49 estabelecimentos prisionais estão em sobrelotação Paulo Pimenta
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Quase metade dos reclusos em Portugal está alojada num Estabelecimento Prisional (EP) sobrelotado. Os dados divulgados esta terça-feira no relatório anual (relativo a 2022) do Mecanismo Nacional de Prevenção (MNP), que está ligado à Provedora de Justiça, dão conta de 5422 reclusos a viver em condições de sobrelotação, o que representa 44,5% do total. O documento deixa um alerta para o incumprimento pelo Estado das condições mínimas de alojamento digno dos reclusos e sublinha a necessidade de adopção de medidas para acabar com essa realidade.

Quando se olha apenas para os números gerais, a sobrelotação parece estar resolvida: a taxa geral de ocupação era no último dia de 2022 de 96,1%, o que representa uma situação de alto risco, mas não de excesso de pessoas.

Contudo, 25 dos 49 estabelecimentos prisionais albergavam um número de reclusos que ia além das suas capacidades. Ou seja, mais de metade do parque penitenciário, como consta do relatório enviado pela Provedora de Justiça, na capacidade de Mecanismo Nacional de Prevenção, ao presidente da Assembleia da República, Augusto Santos Silva. Segundo a posição expressa pelo Conselho da Europa no Livro Branco acerca da Sobrelotação das Prisões, consideram-se situações de alto risco aquelas em que taxa de ocupação é superior aos 90% da lotação do estabelecimento.

Os peritos do Mecanismo Nacional de Protecção visitaram, em 2022, 18 estabelecimentos prisionais. Cinco desses locais estavam em sobrelotação. São eles os de Lisboa (taxa de ocupação de 105,8%), Vila Real (118,7%), Elvas (101,8%), Porto (125,4%) e o de Viana do Castelo (130%).

No relatório destacam-se ainda as áreas reduzidas de alojamento por recluso e a predominância do “carácter colectivo da maioria dos alojamentos” em detrimento das celas individuais, consideradas pelas direcções e pelos guardas prisionais "um elemento fortemente pacificador". De acordo com as orientações internacionais do Comité Europeu para a Prevenção da Tortura (CPT), “uma cela individual não poderá ter uma área inferior a seis metros quadrados, acrescida das instalações sanitárias, devendo os alojamentos colectivos (celas duplas, triplas e camaratas) assegurar uma área de quatro metros quadrados por pessoa, excluindo os sanitários”. Além disso, o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) tem adoptado o critério de três metros quadrados por pessoa reclusa “como espaço mínimo aceitável para um alojamento”.

O não cumprimento desses parâmetros a nível nacional já motivou condenações ao Estado português – tal aconteceu por duas ocasiões em 2020 – e 2022 não foi excepção, com dois casos de condenação (Jevdokimovs v. Portugal e Santos v. Portugal).

De acordo com o documento do MNP, o TEDH concluiu que em ambos os casos ocorreu a “forte presunção de violação do artigo 3.º da CEDH” (Convenção Europeia dos Direitos do Homem), que determina que “ninguém pode ser submetido a torturas, nem a penas ou tratamentos desumanos ou degradantes”.

Além disso, das conclusões do tribunal europeu constam ainda a “falta de privacidade nas instalações sanitárias, temperatura baixa, instalações eléctricas perigosas, mofo e humidade, má qualidade dos alimentos, falta de assistência médica, partilha de celas com reclusos infectados por doença contagiosa, acesso restrito a água quente, acesso restrito a actividades de lazer ou educativas e infestação da cela por insectos/roedores”, por exemplo.

Sobre o assunto, o MNP sublinha a necessidade de adopção de medidas para acabar com o “reiterado incumprimento pelo Estado Português das condições mínimas para um alojamento digno de pessoas reclusas”. E acompanha por isso o apelo do Subcomité para a Prevenção da Tortura (SPT) ao Governo Português para ser ampliado o uso de medidas alternativas à detenção, incluindo a prisão preventiva, como seja “o regime de permanência na habitação com controlo através de pulseira electrónica, a liberdade condicional, a fiança (caução), a mediação, a prestação de trabalho a favor da comunidade ou a pena suspensa”.

Ainda com o objectivo de contornar a sobrelotação dos espaços, escreve o MNP que, “se necessário, se promovam alterações legislativas tendentes à diminuição da sobrelotação prisional, como, por exemplo, a abolição da prisão para certos crimes como o de condução de veículo automóvel sem habilitação legal”. E sinaliza a necessidade de actualizar a lotação oficial dos EP, já que quatro dos 18 EP visitados tinham uma lotação desactualizada, uma vez que a lotação oficial excedia a efectiva capacidade de alojamento (Lisboa, Tires e Monsanto), devido à inutilização de algumas áreas. Por outro lado, a lotação oficial do EP de Bragança, que foi objecto de obras de ampliação, era ainda inferior à capacidade de instalação, situação que, segundo informação prestada pela Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, foi corrigida até ao final do ano de 2022.

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