Twitter é a pior rede social para a comunidade LGBTQIA+ — e isto passa para a vida real

O Twitter teve o pior resultado das cinco redes sociais avaliadas quanto à segurança online das pessoas LGBTQ+. O crescimento dos discursos de ódio é um problema assinalado em vários relatórios.

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As redes sociais têm sido um foco de propagação de discursos de ódio. O Twitter foi considerada a mais perigoso para a comunidade LGBTQ+ Pexels
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Das cinco redes sociais estudadas no relatório anual da GLAAD, a organização não-governamental norte-americana Gay & Lesbian Alliance Against Defamation, o Twitter foi considerado a mais perigosa para a comunidade LGBTQIA+. O Instagram e o Facebook da Meta tiveram as melhores pontuações, contudo é necessário continuar a melhorar algumas das regras contra discurso de ódio nestas plataformas.​

As redes sociais têm sido um foco de propagação de discursos de ódio e esta retórica "traduz-se em danos reais no mundo offline", lê-se, nos pontos principais do relatório sobre segurança online publicado pela organização criada em Nova Iorque após a crise de desinformação do VIH, nos anos 1980. Já segundo o Relatório Pride 2023, a consultora LLYC percebeu que nos 12 países onde se insere, e depois de uma avaliação de 169 milhões de publicações nas redes sociais, o discurso anti-LGBTQ+ registou um aumento de 9,4% enquanto as mensagens de apoio registaram uma diminuição de 41,25%. Em Portugal, as mensagens anti-LGBTQI+ nas redes sociais cresceram quase 185% desde 2019.

O relatório anual da GLAAD considera 12 indicadores para atribuir pontuações de segurança a cada rede social. O Instagram é a plataforma mais bem classificada com 63%, seguida pelo Facebook (61%), TikTok (57%), Youtube (54%) e, por último, o Twitter com 33%.

Para estas colocações foi avaliada a existência de políticas de protecção dos utilizadores de qualquer tipo de discriminação, assédio ou ódio na plataforma e na própria empresa. Também se teve em conta se são as opções que os utilizadores têm para controlar o uso, inferência e recolha de dados relacionados com a orientação sexual e identidade de género são claras, e se a rede social recomenda conteúdo e publicidade com base nesses factores apenas quando o utilizador a autorizou.

A possibilidade de colocar pronomes nos perfis e uma política que proíbe o deadnaming (utilizar o nome dado à nascença de pessoas trans) e o misgendering (designar uma pessoa pelo género errado) são também factores de avaliação. Outro indicador é se a empresa proíbe publicidade com conteúdo discriminatório ou nocivo à comunidade LGBTQ+, além de verificar se os funcionários recebem formação sobre questões da comunidade e se as plataformas assumem o compromisso de diversificar o local de trabalho.

Shadow banning

As principais conclusões do estudo indicam que o discurso anti-LGBTQ nas redes sociais pode causar danos na vida real e que a desinformação e os discursos de ódio continuam a ser um problema de segurança. O estudo revelou ainda que as plataformas suprimem conteúdo LGBTQ através da remoção, desmonetização ou do shadow banning (bloquear total ou parcialmente o utilizador e o seu conteúdo de áreas específicas de uma comunidade online sem que este saiba).

Um problema identificado em todas as redes sociais é a falta ou o limitado conhecimento que utilizadores têm sobre o uso, recolha e inferência dos dados relacionados com a identidade de género e a orientação sexual. De acordo com o relatório, as plataformas deveriam diminuir a quantidade de dados que retêm e introduzir criptografia de ponta-a-ponta nas conversas privadas para proteger as pessoas de "possíveis perseguições, stalking e violência".

Numa análise mais pormenorizada, as redes sociais que pertencem à empresa Meta foram as mais bem colocadas, apresentando os mesmos pontos positivos e negativos. O Instagram e Facebook proíbem misgendering, no entanto esta proibição não é aplicada a figuras públicas, nem ao deadnaming. Apesar de terem uma ferramenta para os utilizadores adicionarem os seus pronomes na descrição, ainda não está disponível para todos.

Por sua vez, o TikTok é a única empresa que protege pessoas trans, não-binárias e queer do uso de nomes e pronomes errados. No entanto, em vez de proibir totalmente a publicidade direccionada com base na orientação sexual e na identidade de género, as limitações dependem ainda de leis locais.

Já o Twitter abandonou a proibição que tinha contra deadnaming e misgendering e deixou de publicar um Relatório de Diversidade, apesar de se ter comprometido a diversificar a sua força laboral. Não informam se existe alguma política voltada para as necessidades dos utilizadores LGBTQ+, bem como formação dos funcionários sobre as necessidades dos utilizadores da comunidade.

Do online ao offline

Uma série de estudos realizados nos últimos anos têm alertado para o uso das redes sociais como um centro de campanhas de ódio e desinformação, com repercussão offline.

O relatório Cause For Concern 2024: The State of Hate, feito pelo Leadership Conference Education Fund, avaliou o aumento dos crimes de ódio em períodos de eleições nos EUA e menciona que as redes sociais falharam ao não pararem a crescente desinformação espalhada nas suas plataformas. Segundo o relatório, a recente onda de desinformação sobre aliciamento infantil e a comunidade LGBTQ espalhou-se pelas redes sociais e contribuiu para a introdução de mais de 300 propostas anti-LGBTQ+ em legislaturas estatais. O estudo aponta ainda que o uso de “algoritmos que ampliam o ódio” e a falha das plataformas sociais em “aplicar as próprias políticas” resulta no enfraquecimento da democracia. Refere também que crimes raciais, anti-semitas e xenófobos têm ganho espaço online.

De acordo com o relatório Digital Hate da organização Human Rights Campaign de 2022, a constante presença de discursos de ódio nos feeds das redes sociais “normaliza narrativas falsas” que podem ser aproveitadas por políticos extremistas "como uma evidência legítima para políticas de ódio”. Neste relatório foram investigadas publicações do Twitter e da Meta, dona do Instagram e Facebook.

Assim, conclui-se que a Meta tem lucrado com publicidade anti-LGBTQ. Foram identificados 59 anúncios que promoviam a associação errada a pedofilia e aliciamento infantil, que foram divulgados pelo algoritmo e vistos mais do que dois milhões de vezes. Também o Twitter falhou em aplicar a própria política que proíbe ataques com base na identidade de género e orientação sexual, ao não actuar contra 99% dos tweets ofensivos mais vistos na plataforma (que somam mais de 72 milhões de visualizações) identificados pelos investigadores.

De acordo com a organização Just Security, o funcionamento dos próprios algoritmos das redes sociais incentivam e lucram com conteúdo ofensivo. Quanto mais “incendiário” o conteúdo é, maior o número de utilizadores a interagirem com ele e mais recomendado é pelo algoritmo. Por sua vez, os próprios anúncios de publicidade são direccionados com base em perfis de utilizador e são mais recomendados se o algoritmo determinar que irão manter esse perfil online durante mais tempo.

Texto editado por Renata Monteiro

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