Dificuldade em sentar
Como se a um pássaro dessem como destino uma gaiola maior ou menor, mas jamais a possibilidade de sair dela e voar.
A Sãozinha teve um castigo que a deixou com dificuldade em sentar-se durante dois dias e sem sair para passear aos domingos durante um mês. A Sãozinha ficou desesperada com o que iria perder com isso, com o facto de não poder sair do asilo para passear no pinhal. Não contemplava caracóis nem o mar, como fazia a irmã gorda, queria apenas correr e brincar, ser uma criança, portar-se como criança, preencher-se de criança, em vez de ser a futura ferramenta de andar por casa, um produto da sociedade que ela ainda não vislumbrava o que seria — e que tantas meninas desejavam para si, diferindo apenas em ambição: se a casa onde iriam servir era mais ou menos nobre, mais ou menos rica, mais ou menos notável, como se a um pássaro dessem como destino uma gaiola maior ou menor, mas jamais a possibilidade de sair dela e voar, de fazer da sua vida o céu de um pinhal qualquer onde pudesse passear sempre que quisesse, em vez de cumprir os seus dias numa gaiola mais nobre ou menos nobre, mais abastada ou menos abastada, mais notável ou menos notável.
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