Em ofensiva israelita, muitos vêem ecos da “batalha de Jenin”

Cidade palestiniana foi um dos palcos de violência da Segunda Intifada. Há de novo bulldozers nas ruas, disparos do ar, e residentes a queixar-se de castigo colectivo.

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Confrontos entre palestinianos de Jenin e as forças militares de Israel Reuters/MUSSA ISSA QAWASMA
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Os relatos eram de desespero: pessoas a ver explosões sem saber de onde vinham, a ouvir disparos sem saber o que atingiam, a considerar se arriscavam espreitar pela janela para perceber o que se passava ou se esperavam que terminasse.

A operação militar israelita no campo de refugiados de Jenin – a maior dos últimos 20 anos na Cisjordânia ocupada – entrou esta terça-feira no segundo dia. Morreram pelo menos onze palestinianos, com cem feridos, dos quais 20 em estado grave; ao final do dia, as autoridades israelitas anunciaram que os militares tinham começado a retirada.

Milhares de residentes do campo saíram, segundo a versão de Israel, ou foram forçados a sair, segundo a versão palestiniana, do campo, onde vivem mais de 15 mil pessoas (expulsas ou que fugiram das suas casas quando foi criado o Estado de Israel e os seus descendentes), em menos de meio quilómetro quadrado de espaço, como indica o diário israelita Haaretz.

Enquanto isso, um palestiniano residente na Cisjordânia atirou o seu automóvel contra transeuntes no Norte de Telavive, saindo depois do automóvel e atacando mais uma pessoa com uma faca antes de ter sido atingido, e morto, a tiro por um civil.

O movimento islamista Hamas (no poder na Faixa de Gaza) reivindicou o ataque e disse que se tratava de uma resposta às acções de Israel em Jenin.

Entre os mortos em Jenin estavam quatro combatentes da Jihad Islâmica, e um do Hamas. Não era claro, segundo a agência Reuters, se havia mais combatentes de outros grupos, como alguns que foram surgindo mais recentemente em Jenin ou em Nablus, ambas grandes cidades do Norte da Cisjordânia, que não têm estruturas centralizadas, ligação às facções tradicionais palestinianas, ou inclinação religiosas. Responsáveis israelitas disseram não ter indicação de ter atingido civis.

Depois de cerca de ano e meio de raides cíclicos, tanto em Jenin como em Nablus, as forças israelitas começaram, na segunda-feira de madrugada, uma operação em larga escala para atacar os grupos palestinianos armados que existem na cidade e sobretudo no campo de refugiados.

Jenin evoca sentimentos fortes entre palestinianos – e também israelitas. Foi o palco da chamada batalha de Jenin, em 2002, durante a Segunda Intifada (2000-2005), em que morreram 52 palestinianos e 23 israelitas. Era a cidade da resistência para os palestinianos e a cidade dos terroristas para israelitas.

Como uma operação militar no campo densamente povoado e nas suas ruas estreitas é um desafio, na altura, como agora, bulldozers abriram caminho. Israel diz que procuravam explosivos, residentes dizem que destruíram infra-estrutura, deixando muitas casas sem electricidade ou água, e ainda estradas.

Agências humanitárias corroboram, dizendo que os danos causados nas estradas fizeram com que as ambulâncias deixassem de conseguir passar. “As equipas de paramédicos palestinianos foram forçadas a seguir a pé, numa área com disparos activos e ataques de drones”, segundo a organização não-governamental Médicos Sem Fronteiras.

O sentimento ecoado por agências internacionais era de “alarme” pela “escala das operações aéreas e terrestres”, com “ataques aéreos num campo de refugiados densamente povoado”, nas palavras de Vanessa Huguenin, porta-voz do gabinete de coordenação de acções humanitárias da ONU (OCHA).

“É a mesma atmosfera, o mesmo perigo, a mesma destruição”, disse, citado pelo site israelita +972, o director artístico do Freedom Theater de Jenin, Ahmed Tobasi, falando da operação de 2002. Os bulldozers, os grupos de soldados de casa a casa, “snipers em todo o lado”, a “mesma estratégia que usaram em 2002”. É, para Tobasi, um castigo colectivo.

A destruição “não foi limitada apenas a ruas e às redes de água e electricidade, mas estendeu-se a casas, edifícios residenciais, e até hospitais e mesquitas”, dizia o site Middle East Eye. “A internet e linhas telefónicas foram destruídas”, descreveu ao site Sari Samour, residente do campo. “O objectivo é impedir a comunicação com o campo e isolá-lo do mundo exterior.”

Num comentário no diário Haaretz, o jornalista Jack Khoury dizia que há duas décadas, a operação militar israelita em Jenin foi muito maior – era dirigida contra combatentes apoiados por Yasser Arafat, muito mais bem organizados e com mais verbas à disposição.

“Hoje, Israel combate contra aqueles que eram então bebés ou ainda nem tinham nascido”. Uma geração pós-Acordos de Oslo, “que cresceu na devastação de 2002, arrogância israelita, indiferença internacional, e desintegração da unidade nacional palestiniana”. Uma geração que surgiu de “adolescentes zangados e frustrados, que não têm objectivos além de pegar em armas e disparar”.

Israel, previa Khoury, fará um balanço positivo da operação, com dados sobre armamento destruído e mortes nos grupos de combatentes palestinianos. “Mas as imagens de Jenin serão terreno fértil para mais uma geração que não verá um futuro”.

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