Aliado de Johnson demite-se do Governo britânico, acusando Sunak de ser “hostil” ao meio ambiente
Goldsmith foi um dos conservadores que uma comissão parlamentar disse ter atacado e interferido com a investigação que concluiu que o ex-primeiro-ministro “enganou” o Parlamento sobre o “Partygate”.
Menos de 24 horas depois de ter sido identificado como um dos membros conservadores do Parlamento britânico que participou num “ataque sem precedentes” e numa “campanha coordenada para interferir” e “pôr em causa” a legitimidade democrática da investigação de uma comissão parlamentar à conduta de Boris Johnson no escândalo das festas na sede do Governo durante a pandemia, Zac Goldsmith apresentou esta sexta-feira a sua demissão do executivo de Rishi Sunak.
Assumido apoiante e defensor do antigo primeiro-ministro – e crítico feroz das conclusões da investigação da Comissão de Privilégios, que atestaram que Johnson “enganou deliberadamente” o Parlamento durante o “Partygate” – o até agora secretário de Estado dos Territórios Ultramarinos, da Commonwealth, da Energia, do Clima e do Ambiente, que é membro da Câmara dos Lordes, justificou, no entanto, a sua renúncia, com a “falta de interesse” do actual chefe do Governo com a causa climática.
“O problema não é apenas o facto de o Governo ser hostil ao ambiente, [o problema] é que você, o nosso primeiro-ministro, está simplesmente desinteressado”, acusou, num comunicado publicado esta manhã, dirigido a Rishi Sunak. “Esse sinal, ou a falta dele, alastrou-se por Whitehall [sede do Governo] e causou uma espécie de paralisia.”
Insistindo na “apatia” e no “desinteresse” do Executivo conservador pelo clima, Goldsmith disse ainda ter ficado “horrorizado” com o “abandono”, por parte do Governo conservador, de algumas metas, “internas e no plano mundial”, com as quais se comprometeu no âmbito da luta contra as alterações climáticas.
“Ainda mais preocupante”, acrescentou, “é que o Reino Unido se afastou visivelmente do palco global e renunciou à sua liderança” nas questões “do clima e da natureza”.
Goldsmith criticou ainda o primeiro-ministro por “ainda na semana passada” ter “escolhido ir a uma festa de um barão dos media – que o Guardian diz tratar-se do empresário bilionário Rupert Murdoch, detentor de vários órgãos de comunicação social britânicos, norte-americanos e australianos de linha editorial assumidamente conservadora – “em vez de participar numa cimeira fundamentalmente importante, em Paris, que, normalmente, o Reino Unido teria co-liderado”.
Sunak fragilizado
Devido às suas ligações com Boris Johnson e com os seus aliados, que se opõem abertamente à liderança de Sunak, a demissão de Goldsmith não surpreende – Partido Trabalhista e Liberais-Democratas tinham-na exigido, face às revelações “graves” da Comissão de Privilégios na véspera. Mas a justificação que deu esta sexta-feira para a renúncia, levantam dúvidas sobre se não terá procurado argumentos políticos, que até têm apoio junto dos críticos da política ambiental do Governo, para incomodar e atingir o primeiro-ministro.
A PA Media e a BBC citam fontes próximas do Governo que revelam que Goldsmith apresentou a demissão pouco depois de lhe ter sido exigido que se retractasse publicamente das suas posições que punham em causa a credibilidade da investigação a Johnson. Mas este recusou pedir desculpa.
Recorde-se que, na quinta-feira, pouco de depois de a comissão ter visado sete deputados – incluindo os ex-ministros Jacob Rees-Moog, Priti Patel e Nadine Dorries – e três membros da Câmara dos Lordes nas suas acusações, um porta-voz de Sunak manifestou total confiança política do primeiro-ministro no secretário de Estado, mesmo que este tenha aderido a posições contrárias à política oficial do Governo tory.
Entre as provas citadas no relatório da comissão parlamentar, de maioria conservadora, para justificar as tentativas de descredibilização da investigação a Johnson – que tinha sido requisitada com o apoio unânime de todos os partidos, incluindo dos tories, quando este anda era chefe do Governo –, estão publicações de Goldsmith nas redes sociais a demonstrar apoio a descrições da comissão como um “tribunal de fachada” e do inquérito como uma “caça às bruxas”.
O facto de Goldsmith ter aproveitado o momento da demissão para fazer duras críticas a Rishi Sunak deixam o primeiro-ministro numa posição ainda mais fragilizada, principalmente num partido em constantes guerras internas, que, para além de estar a mais de 20 pontos percentuais de distância do Partido Trabalhista nas últimas sondagens a nível nacional, tem somado derrotas ou fracos desempenhos em praticamente todos os actos eleitorais realizados nos últimos meses no Reino Unido.
Sarah Olney, deputada dos Liberais-Democratas – que conquistou o seu lugar em 2019 numa eleição contra Goldsmith – reagiu à demissão dizendo que ela resulta do facto de Sunak “não ter tido coragem” de afastar o secretário de Estado depois das acusações da Comissão de Privilégios.
Algumas organizações ambientalistas, e até Natalie Bennett, antiga líder do Partido Verde, optaram, no entanto, por dar os parabéns ao ex-secretário de Estado, por ter enfatizado a “inércia” do Governo no que toca à luta contra as alterações climáticas.