Projecto português Native Scientists premiado no Novo Bauhaus Europeu

Projecto que junta crianças e cientistas das mesmas comunidades imigrantes recebeu prémio de 30 mil euros. Recuperação de matadouro em Viana do Castelo recebe financiamento de cinco milhões.

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A comissária europeia Elisa Ferreira entregou esta tarde os prémios do Novo Bauhaus Europeu Sergio Azenha
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O projecto educativo Native Scientists, com sede em Braga e em Londres, foi vencedor dos prémios do Novo Bauhaus Europeu na categoria de “Campeões da Educação”, levando o galardão na temática “Recuperar um Sentimento de Pertença”. Foi o único, entre seis projectos nacionais, a levar o prémio para Portugal, num ano em que houve 61 finalistas.

Os prémios Novo Bauhaus Europeu foram entregues esta quinta-feira numa cerimónia em Bruxelas, com a presença da comissária europeia para a coesão, Elisa Ferreira. Os galardões, criados em 2021 pela Comissão Europeia, visam distinguir projectos ambientais, económicos e culturais que combinem sustentabilidade, inclusão e estética, enquadrado a transição climática e a mudança cultural, em linha com o Pacto Ecológico Europeu.

O projecto educativo Native Scientists leva cientistas às comunidades migrantes nas escolas, incentivando os alunos a experimentar e falar sobre ciência em oficinas na sua língua de herança, contrariando as desvantagens de aprender numa língua que não é a sua. Criado em Londres há 10 anos, envolvendo a comunidade portuguesa e outras na cidade, o projecto expandiu-se e chegou a países como Portugal, Bélgica, Alemanha, França, Espanha, Áustria, Irlanda, Hungria, Países Baixos ou Suécia, unindo cientistas e crianças da mesma comunidade migrante.

Afonso Bento, que trabalha no projecto Native Scientists junto de comunidades migrantes de toda a Europa, conta que o prémio trará ao projecto “a capacidade de continuar o trabalho de tornar a ciência acessível para diferentes comunidades migrantes”. Se por um lado o prémio de 30 mil euros ajudará na profissionalização do projecto, que depende em grande parte do trabalho de voluntários, o grande desafio continuará a ser o de chegar às comunidades marginalizadas e às crianças que mais podem beneficiar deste contacto. “Sabemos que as crianças que são descendentes de pais emigrantes normalmente têm menos acesso a este tipo de actividades”, salientou o responsável.

Luísa Dutra, adjunta da coordenação de ensino de português no estrangeiro para a Bélgica e Países Baixos do Instituto Camões, destacou que o Native Scientists, apoiado pelo IC, “é uma forma das crianças ouvirem falar de ciência em português, de terem a possibilidade de participarem em experiências, e isso são oportunidades óptimas”.

Na cerimónia, foram também anunciados dois dos projectos que vão receber financiamento no âmbito do Urban Innovative Actions, que seleccionou 14 projectos entre cerca de 100 candidaturas. O S+T+ARTS Centre, proposto pela câmara municipal de Viana do Castelo, pretende converter um antigo matadouro num centro de ciência, tecnologia e arte. “Num local onde antes matávamos, agora vamos criar novas coisas”, afirmou o vereador Ricardo Rego, no anúncio do financiamento.

“Já havia várias ideias para o projecto de re-funcionalização do matadouro”, desactivado há vários anos, explicou o vereador aos jornalistas portugueses presentes. A ideia apresentada à linha de financiamento do Novo Bauhaus Europeu terá um custo total de seis milhões de euros, dos quais a Comissão Europeia avançará com cinco milhões, e deverá estar concluído dentro de dois anos. Trata-se de “um projecto vital para a regeneração urbana do espaço”, garantiu o vereador, enunciando elementos como a construção com “materiais sustentáveis” - tornando edifício “100% neutro” em termos climáticos - e o facto de pôr em prática “um conceito inovador, de co-criação entre várias áreas”.

“Precisamos de mudança social”

Em declarações aos jornalistas antes da cerimónia, a comissária europeia Elisa Ferreira, responsável pelas políticas de coesão e reformas, falou sobre a intenção por trás do Novo Bauhaus Europeu, um dos pilares do Pacto Ecológico Europeu dedicado à sustentabilidade, inclusão e fruição estética nas cidades, sublinhando o carácter não elitista dos projectos.

Questionada sobre a resistência que algumas das políticas do Pacto Ecológico Europeu têm sofrido, a responsável sublinhou que programas como o Novo Bauhaus Europeu têm mostrado o acolhimento das populações a estas temáticas através dos seus processos inclusivos.

Elisa Ferreira reconhece que se apenas se falar que “é preciso ter cuidado com o clima e com o ‘verde’, as pessoas não percebem” do que se está a falar. “Se virmos que um bairro social fica todo requalificado, que melhora completamente a qualidade de vida das pessoas, e que fica bonito, que o jardim e o pátio onde os miúdos brincam fica com melhor qualidade, as pessoas sentem no concreto que aquilo é qualidade de vida, à sua escala”, argumentou a comissária.

Para Elisa Ferreira, um factor essencial nos projectos bem-sucedidos é “ser inclusivo, isto é, não ser um projecto de elite”. Ou seja, “ser fácil de reproduzir noutras zonas, ser sustentável em termos ambientais, mas também tem de ser sustentável economicamente”, prosseguiu a comissária europeia.

A urbanista Eszter Dávida, membro do Centro Húngaro de Arquitectura Contemporânea e parte do painel de especialistas que promovem o Novo Bauhaus Europeu nos vários países, sublinha que “fazer política não é só trabalho dos políticos, mas de toda a gente”, e que “esta é uma forma diferente de envolver as pessoas”.

A ideia do prémio - mas do Novo Bauhaus Europeu em geral - é “dar visibilidade aos pequenos actores”, sendo importante comunicar às pessoas que “esta é uma boa altura para formular estes projectos” e mostrar que “existem opções” para participarem na resolução dos problemas das suas comunidades.

“Precisamos de mudança social, precisamos de processos diferentes”, sublinha a urbanista. “Temos que trabalhar nestas ligações e tentar incluir isso nas vidas quotidianas das pessoas.”

A jornalista viajou a convite da Comissão Europeia