Nações Unidas: o tratado para a protecção do alto-mar já é oficial
Após mais de 15 anos de negociações, o primeiro acordo global de protecção do alto-mar foi adoptado esta segunda-feira nas Nações Unidas. Agora falta ser ratificado por cada país e... sair do papel.
Após mais de 15 anos de negociações, o primeiro tratado internacional de protecção do alto-mar foi oficialmente adoptado esta segunda-feira em Nova Iorque, nos Estados Unidos, durante a durante a Conferência Intergovernamental das Nações Unidas (ONU) dedicada à biodiversidade marinha de áreas fora da jurisdição nacional.
O acordo global para a protecção do alto-mar, aprovado por delegados de mais de 100 países-membros da ONU, cria agora uma moldura legal para salvaguardar ecossistemas marinhos vitais para humanidade. “Um feito histórico”, definiu António Guterres, secretário-geral da ONU.
As negociações para o tratado foram concluídas no início de Março de 2023, em Nova Iorque, após uma longa e difícil negociação. Agora, cada um dos países que o subscreveram tem de ratificar o tratado, sendo que o sexagésimo país a fazê-lo dará início a uma corrida de 120 dias no contra-relógio. Passados esses quatro meses, o acordo passa a ser uma lei sem fronteiras.
“Elogiamos todos países por terem dado um passo para que este acordo possa ser colocado em prática no alto-mar, adoptando formalmente hoje este tratado histórico. Os países devem agora ratificá-lo o mais rápido possível para colocá-lo em vigor, para que possamos proteger o nosso oceano, aumentar a resiliência às mudanças climáticas e salvaguardar as vidas e os meios de subsistência de milhares de milhões de pessoas”, afirmou Rebecca Hubbard, directora da High Seas Alliance, citada numa nota de imprensa.
A High Seas Alliance é uma organização não-governamental que agrega mais de 40 entidades ligadas à protecção ambiental, incluindo a União Internacional para a Conservação da Natureza. Ao longo das duras negociações entre os 193 países, este grupo exerceu pressão para que o tratado para o alto-mar se tornasse realidade. Esta segunda-feira, o texto do documento foi adoptado oficialmente.
O acordo global chama-se oficialmente Tratado de Biodiversidade para Além da Jurisdição Nacional. Este novo documento estará disponível para subscrição em Nova Iorque, por um período de dois anos, a contar partir de 20 de Setembro (um dia após um encontro sobre os objectivos de desenvolvimento sustentável da ONU), de acordo com a agência Reuters.
Caminho aberto para a meta 30x30
Como as águas internacionais não estão sob a jurisdição de país algum, a exploração de recursos marinhos em vastas zonas ricas em biodiversidade não era regulada por uma moldura legal específica. Agora, a ideia é que o alto-mar deixe de ser uma área sem lei.
“Muitas pessoas não percebem que o oceano cobre 71% da superfície do planeta; sendo que 61% está fora das águas territoriais. Estamos a falar de águas internacionais, terrivelmente desprotegidas. Não temos legislação, não dispomos de um mecanismo de criação de áreas protegidas em alto-mar que seja universalmente aceite pelos países. Estes 61% do oceano que estão fora de qualquer jurisdição nacional correspondem a 43% da superfície da Terra. É alarmante pensar que quase metade do planeta não tem um mecanismo comum para proteger a biodiversidade”, explicava o oceanógrafo Callum Roberts, numa entrevista concedida ao PÚBLICO no ano passado.
O novo tratado deve introduzir avaliações de impacto ambiental que permitam um uso sustentável dos recursos oceânicos, limitando actividades humanas potencialmente destrutivas - a pesca industrial, por exemplo.
O acordo global deve ainda garantir uma partilha justa e equitativa do património genético marinho e, por fim, abrir caminho para a meta 30X30. Este objectivo, que prevê a protecção de 30% dos oceanos até 2030, foi desenhado com base em dados científicos obtidos por Callum Roberts e outros cientistas. A repetição do valor 30 na percentagem e na data é apenas uma coincidência.
“Estamos empenhados em alcançar [a meta] 30x30. Trabalharemos dia e noite para garantir que este tratado seja ratificado em tempo recorde e que os santuários oceânicos livres de actividades humanas destrutivas, numa área correspondente a 30% dos oceanos, se tornem realidade até o final desta década”, garante Chris Thorne, responsável da campanha de protecção dos oceanos da Greenpeace, num comunicado de imprensa.