Cientistas portugueses fizeram expedição à península Antárctica para estudar degelo
Objectivo da expedição da Universidade do Porto à Antárctica foi compreender impactos dos rios atmosféricos no degelo e na precipitação, informação que ajuda a prever a perda de massa dos glaciares.
Investigadores do Centro Interdisciplinar de Investigação Marinha e Ambiental (CIIMAR) realizaram uma expedição à península Antárctica para compreender os impactos dos rios atmosféricos no degelo e precipitação, informação que pode ajudar a prever a perda de massa dos glaciares.
A investigadora do centro da Universidade do Porto que liderou a expedição esclareceu, esta segunda-feira, que o projecto intitulado APMAR2 visava “compreender melhor” os impactos dos rios atmosféricos no degelo e precipitação, mas também realizar medições e fazer “uma recolha intensa de observações”.
A expedição realizou-se entre Fevereiro e Março na ilha do Rei George, a maior ilha do Shetland do Sul, perto da Península Antárctica, onde os investigadores estiveram a trabalhar na estação coreana King Sejong e nos glaciares em redor.
Segundo a investigadora Irina Gorodetskaya, a península Antárctica tem aquecido “muito mais” do que o resto do continente, sendo que, a par do aquecimento, tem também sido observada uma desintegração das plataformas de gelo, especialmente na plataforma de gelo Larsen.
“O aquecimento e o degelo não têm sido contínuos, mas sim, marcados por uma maior frequência e amplitude de fenómenos extremos, como ondas de calor e grandes fenómenos de degelo. Era isso que queríamos investigar, processos durante eventos climáticos extremos de curta duração, especialmente os associados a rios atmosféricos”, esclareceu.
Os rios atmosféricos são “rios no céu invisíveis”, isto é, longos corredores de transporte de vapor de água que se concentram maioritariamente nos primeiros três quilómetros acima da superfície.
Estes rios têm origem nas regiões subtropicais e acarretam humidade e calor para as latitudes médias, chegando, alguns deles, a latitudes polares.
“Quando atingem a Antárctica podem provocar grandes fenómenos de degelo à superfície, bem como um aumento da precipitação”, referiu a investigadora.
Segundo Irina Gorodetskaya, o impacto destes rios no degelo e na precipitação à superfície ajudará a “prever a futura perda de massa do manto de gelo antárctico”, fenómeno que tem como principal consequência a subida do nível do mar.
“Os rios atmosféricos podem ter impactos contrastantes no balanço de massa à superfície da Antárctida”, salientou a investigadora, esclarecendo que, tanto podem “trazer uma queda de neve muito intensa”, como “condições muito quentes que provocaram uma grande fusão à superfície”.
Na ilha do Rei George, a equipa de investigadores lançou radiossondas para medir a “estrutura termodinâmica da troposfera e da estratosfera inferior”, bem como radiossondas com sensores especiais de nuvens para recolher informação sobre o conteúdo de água liquida sobrearrefecida nas nuvens.
Durante os eventos de precipitação, os investigadores recolheram também amostras de chuva e neve, para, posteriormente, serem analisados em laboratório a fim de perceber a sua composição microbiológica e química.
Instalação de radar meteorológico
Na ilha do Rei George foi ainda instalado um radar meteorológico que fornece “perfis verticais de precipitação” e que vai funcionar de forma contínua e autónoma durante todo o ano, sendo que os dados recolhidos pelo radar serão enviados, diariamente, para um servidor do CIIMAR.
“Será o primeiro radar a funcionar a longo prazo nas ilhas Shetland do Sul que fornecerá não só as quantidades de precipitação, mas também os seus mecanismos de formação e propriedades”, salientou Irina, acrescentando que será possível “observar a queda de neve no inverno na ilha Rei George quase em tempo real”.
No próximo início do Inverno na Antárctida, está prevista uma nova campanha de acompanhamento no terreno para verificar o radar, prepará-lo para “mais um ano” e efectuar novas medições.
O projecto APMAR2 é financiado pelo Programa Polar Português (PROPOLAR), em colaboração com o Instituto de Investigação Polar da Coreia. A instalação do radar de precipitação foi possível através da colaboração com o Instituto Francês de Geociências do Ambiente (IGE, na sigla em francês).