Números, para que vos quero?

Já não bastavam os problemas de comunicação entre áreas e línguas distintas como ainda temos de lidar com as vicissitudes dos números. Diz-se que “burro velho não aprende línguas”, mas e números?

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Megafone P3: Números, para que vos quero? Susan Holt Simpson/Unsplash
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O mundo à nossa volta está a mudar mais rapidamente que nunca. Como resultado, assistimos a fenómenos que desafiam o comodismo que nos caracteriza e não traz nada de novo perante a necessidade de abraçar a mudança para seguir em frente. Esta não desaparece se enterrarmos a cabeça na areia. O que emerge, sim, do mar de alterações à nossa volta são as ondas de dados e as tecnologias de informação como forças motrizes da globalização. Quem é que nunca ouviu falar de buzzwords (vulgo “palavras da moda”) como big data, blockchain, ou inteligência artificial?

Independentemente do seu significado, todas dependem profundamente de informação. Para analisar a estrutura e comportamento dessa informação é necessário observar, experimentar e testar. Tendo, de forma simplista, acabado de definir ciência, é caso para dizer que estamos perante uma ciência de dados. Ora, goste-se ou não, qualquer ciência envolve números e esta não é excepção. Ainda assim, não é preciso ser-se cientista para se saber a importância que os números têm. A conversa já é outra quando se trata de os usar e interpretar.

Isto leva-nos à discussão entre literacia e numeracia. Geralmente, a segunda (capacidade de compreender, raciocinar, e aplicar conceitos numéricos) está incluída na primeira (capacidade de ler e escrever para compreender e expressar ideias). No entanto, é fulcral separá-las, ainda mais tendo em conta a influência crescente dos números nas nossas vidas.

Se olharmos apenas para o nosso país, vemos que apenas 3.1% de mulheres e homens não sabe ler e escrever (em média, já que existe um desnível crónico desfavorável às mulheres). Porém, quantos dos restantes 96.9% são, efectivamente, numericamente instruídos?

Há estudos globais que apontam para que apenas 12% da população mundial o seja. Significa isto que a simples interpretação deste mesmo facto numérico ocorra de forma diferente caso o tivesse apresentado como “só 12 em cada 100 pessoas em todo o mundo sabe lidar com números”. Isto para não falar da apresentação do facto ao contrário: “88 em cada 100 pessoas em todo o mundo não sabe lidar com números”. Um simples “não” e um número maior fazem toda a diferença.

Pode não parecer, mas, numa altura em que se apela à colaboração e à multidisciplinaridade para resolvermos os obstáculos que surgem no nosso caminho, já não bastavam os problemas de comunicação entre áreas e línguas distintas como ainda temos de lidar com as vicissitudes dos números. A chave está na educação, que começa na escola e continua em casa e na comunidade.

Criar currículos escolares que não só promovam o entusiasmo pela aprendizagem e aplicação da matemática a contextos reais e actuais, de forma a desenvolver a compreensão prática da mesma no raciocínio e na tomada de decisão no dia-a-dia, mas também foquem áreas transversais de colaboração entre temas, é um bom ponto de partida. Exigi-lo a professores e pais, entre outros, que podem não estar preparados para tal é que não será tão fácil. A educação continuada é uma possibilidade. Diz-se que “burro velho não aprende línguas”, mas e números?

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