Executivo do Porto condena “censura” da Misericórdia a exposição no Conde de Ferreira

Com votos contra dos vereadores do PSD, Câmara do Porto aprovou, por proposta do BE, voto de condenação a “censura” e “mutilação” de obra artística no hospital psiquiátrico do Conde de Ferreira.

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Encerramento da cela onde está a peça Adoçar a Alma para o Inferno III, no hospital Conde Ferreira DR
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É um acto de “censura” e “mutilação” de uma obra artística e merece a “condenação e repúdio” do executivo do Porto. O Bloco de Esquerda (BE) apresentou um voto de condenação relativo à acção da Misericórdia do Porto em relação a uma exposição no Centro Hospitalar do Conde de Ferreira (CHCF). Só o PSD não se juntou à proposta, argumentando que os artistas aproveitaram a “boa-fé” da instituição para a criticar injustamente.

A exposição Vento (A)Mar, dos artistas Dori Nigro e Paulo Pinto, foi inaugurada no CHCF no dia 19 de Maio, integrada na terceira edição da Bienal’23 Fotografia do Porto. Meia hora depois da abertura, a sala onde estava instalada uma obra alusiva ao passado esclavagista do patrono do hospital foi mandada encerrar pela Misericórdia do Porto, que tutela o Hospital do Conde de Ferreira. O argumento era de que a alusão aos milhares de pessoas escravizadas pelo conde de Ferreira, que as levou de Angola para o Brasil e as vendeu aos proprietários dos engenhos de açúcar, poderia causar “desconforto” aos doentes do centro hospitalar.

A dupla de artistas brasileiros e os dirigentes da bienal não gostaram e contestaram a acção. Mas a Misericórdia manteve a sala fechada e há cerca de uma semana voltou mesmo a intervir na exposição, retirando várias peças da instalação Adoçar a Alma para o Inferno III. Restam apenas aquelas que não têm referências explícitas ao passado esclavagista do patrono do hospital.

O presidente da Câmara do Porto juntou-se à iniciativa dos bloquistas, considerando a intervenção da Misericórdia do Porto um “acto de censura inaceitável”. Rui Moreira recordou que o evento é “co-financiado” pela autarquia e, por isso, há “legitimidade” para esta tomada de posição. “É um acto censório, independentemente do resto. Já tivemos exposições organizadas pela câmara em que sou exibido como ‘o Selminho’ e coisas do género e nunca exercemos actos censórios desta natureza. Não devemos permitir que, naquilo em que apoiamos, haja censura, independentemente de podermos concordar ou não com a expressão artística.”

O autarca admitiu compreender o desconforto da Misericórdia do Porto, mas deixou um conselho à instituição: “Se tinha dúvidas, devia ter-se inteirado previamente. Quem vai à guerra dá e leva.”

A socialista Rosário Gamboa sublinhou que “qualquer censura é um acto condenável”, tal como a comunista Ilda Figueiredo, que se juntaram à proposta do BE.

Para Mariana Ferreira Macedo, vereadora do PSD que tem substituído Vladimiro Feliz, qualquer acto censório é inaceitável. Mas, no caso, a situação é distinta, entende: “Pelo que pudemos apurar, tratou-se aqui de uma frase, que foi ‘quantos escravos valem um hospital psiquiátrico’”, apontou, dizendo que a Misericórdia a terá entendido como uma “provocação”.

O trabalho dos artistas “colocava em causa o trabalho do próprio hospital”, considerou, rejeitando que a arte seja usada para fazer qualquer tipo de crítica: “No limite, estamos a justificar a arte para dizer coisas que fora dela não são legítimas e agradáveis.”

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