É para preparar a primeira avaliação sobre a acção climática global, a avaliação dos esforços feitos pelos Estados, empresas e outras entidades para reduzir as suas emissões de gases com efeito de estufa, que representantes de perto de 200 nações se reúnem a partir desta segunda-feira e até 15 de Junho em Bona. Esse trabalho, previsto pelo Acordo de Paris, será discutido na Conferência do Clima das Nações Unidas agendada para o fim de Novembro, nos Emirados Árabes Unidos, a COP28.
Em Bona não serão tomadas decisões, não é uma conferência a que compareçam chefes de estado e de governo, é uma reunião técnica. Mas o encontro decorre, no entanto, num ambiente de grande tensão, devido à contestação do presidente da COP28, Sultan Ahmed Al-Jaber, ministro da Indústria dos Emirados e administrador da Empresa Petrolífera Nacional de Abu Dhabi.
Nunca o dirigente máximo de um grupo petrolífero, ou mesmo de uma grande empresa, exerceu a presidência da reunião anual das partes signatárias da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (este ano, a COP28). E isto acontece num momento determinante para a crise climática, em que seria decisivo haver um compromisso de desinvestimento nas energias fósseis (como o petróleo e o carvão), que são as principais causadoras das emissões de gases com efeito de estufa.
No ano passado, na COP27, no Egipto, os países não conseguiram pôr-se de acordo para fazer novos compromissos sobre o abandono das energias fósseis – apesar de os efeitos das alterações climáticas se fazerem sentir de forma cada vez mais intensa sobre o planeta, sob a forma de fenómenos meteorológicos extremos, como tempestades, cheias e secas, que afectam milhões de pessoas.
Carta de deputados da UE e dos EUA
Antes desta Conferência de Bona, a 23 de Maio, mais de 130 deputados europeus e membros do Congresso dos Estados Unidos divulgaram uma carta em que apelavam à demissão de Ahmed Al-Jaber da presidência da COP28 e pediam ainda que fosse “limitada a influência” da indústria de combustíveis fósseis nas cimeiras climáticas, diz o jornal francês Le Monde.
O Presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, a presidente da Comissão Europeia, Ursula Von Der Leyen, o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, e o secretário executivo da Convenção da ONU sobre Alterações Climáticas, Simon Stiell, são os destinatários desta carta.
“Pedimos-vos que defendam que os Emirados Árabes Unidos retirem a designação de presidente da COP28 a Sultan Al-Jaber, administrador da Empresa Petrolífera Nacional de Abu Dhabi”, pedem os deputados. “As negociações estão em risco com a decisão de nomear como presidente da COP28 o administrador de uma das maiores empresas de petróleo e gás natural – que recentemente anunciou planos para adicionar 7600 milhões de barris de petróleo à sua produção nas próximas semanas, o que representa o quinto maior aumento mundial”, escrevem.
Mais de duas mil organizações não-governamentais tinham já pedido o afastamento de Al Jaber, considerando que a credibilidade da Cimeira do Clima está posta em causa.
O que Al-Jaber fizer em Bona será lido atentamente como um sinal das prioridades da presidência da COP28 exercida pelos Emirados Árabes Unidos – o clima ou os seus interesses económicos, nomeadamente a produção de combustíveis fósseis, salientou, em declarações ao Le Monde, Tom Evans, do think tank E3G, especializado em questões relacionadas com as alterações climáticas.
Há uma grande expectativa em relação à COP28 porque, como previsto pelo Acordo de Paris, será o momento para os países avaliarem a eficácia da acção climática a nível mundial. Os compromissos assumidos pelos Estados de redução das emissões de gases com efeito de estufa encaminham o planeta para um aquecimento global de 2,5 graus Celsius no fim deste século – longe do objectivo de não ultrapassar 1,5 graus acima dos valores anteriores à Revolução Industrial.
Por isso, na COP28 devem ser definidas formas de corrigir esta curva de emissões que teima em não descer tanto quanto é necessário para não se ultrapassarem limiares a partir dos quais os cientistas consideram aumentarem consideravelmente os riscos das alterações climáticas.
Desacordo no fundo de "perdas e danos"
Outra questão em debate é o financiamento aos países com menos recursos, que têm mais dificuldade de se adaptarem aos efeitos das alterações climáticas e sofrem mais as consequências que já se fazem sentir, como os fenómenos meteorológicos extremos. Embora na COP27, no ano passado, tenha sido decidido criar um fundo de “perdas e danos”, que deveria ser financiado pelos países mais desenvolvidos, responsáveis pela maior parte das emissões de gases de estufa na atmosfera, as negociações adivinham-se difíceis.
As duas reuniões já realizadas da comissão encarregada de tornar este fundo operacional, que decorreram em Março e Maio, mostraram que continua a haver um bloqueio nos mesmos temas, diz o Le Monde. Por exemplo, os países do Norte e do Sul opõem-se sobre a natureza do fundo – para financiar a recuperação de catástrofes climáticas ou igualmente para financiar fenómenos lentos? Em discussão continua, também, a lista de países que devem contribuir (aqueles que eram considerados desenvolvidos na Convenção do Clima de 1992, ou os países ricos de hoje? A China, por exemplo, faria toda a diferença?).
Há duas novas reuniões marcadas, em Agosto e em Outubro, para discutir a criação do fundo, até à data da COP28 (30 de Novembro a 12 de Dezembro, no Dubai).