A petrolífera estatal brasileira Petrobras está a captar e armazenar uma quantidade crescente de dióxido de carbono no fundo do mar, uma estratégia que permite impulsionar a produção de petróleo e gás natural. E chamam-lhe uma política verde.
A empresa desenvolve a estratégia em três terrenos de offshores petrolíferas, localizadas a cerca de 230 quilómetros da costa do Rio de Janeiro. Lá, a Petrobras recorre a membranas especializadas para separar CO2 de gás natural, produzido como um subproduto da extracção de petróleo. Depois, injecta o carbono de novo no reservatório.
Esta técnica aumenta a pressão subterrânea nos reservatórios, o que facilita a tarefa de extrair mais petróleo para a superfície e permite prolongar a vida dos terrenos. Ao remover o CO2, a Petrobras também consegue canalizar, em segurança, o restante gás natural para a costa.
De outra forma, o processo poderia conduzir a eventuais fugas, uma vez que o CO2 produz ácido carbónico que corrói os gasodutos de aço, e o gás offshore do Brasil contém elevados níveis de contaminação.
“É [uma técnica] que acontece por preocupações operacionais. Nada tem a ver com a consciência ambiental”, disse Cleveland Jones, consultor e investigador no Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP). “Eles [Petrobras] não deveriam ter qualquer reconhecimento por isso”, acrescentou.
No mais recente relatório sobre sustentabilidade, a Petrobras salientou como o programa de captura de carbono ajudou a reduzir a intensidade das emissões, ou a quantidade de gases com efeito de estufa emitidos por barril.
O documento também refere a captura de carbono como uma das suas maiores conquistas na tecnologia verde. No fim da primeira década do século XXI, a petrolífera desenvolveu a tecnologia como uma das formas mais viáveis para levar gás do meio do oceano para os consumidores finais, em terra.
As injecções de carbono podem ter um efeito positivo no clima, no caso de o carbono ser captado a partir da atmosfera ou de fontes industriais, ao invés de reinjectar o CO2 que já estava no solo no princípio do processo. Este último, porém, é amplamente usado na indústria petrolífera para aumentar a extracção de combustíveis fósseis.
As políticas brasileiras que regem as operações de combustível fóssil também contrariaram a prática da Petrobras: queimar ou ventilar o CO2 separado do gás natural seria uma infracção da lei. Para trazer o gás natural para terra sem corroer os gasodutos, a Petrobras foi obrigada a encontrar uma solução técnica.
Questionada, a petrolífera esclareceu que não incluiu o programa de reinjecção do carbono — conhecido como captura, utilização e armazenamento do carbono — como parte da real redução de emissões, ou como uma potencial fonte de créditos de compensação de carbono.
Ainda assim, a companhia destaca o plano para reinjectar 80 milhões de toneladas de CO2, acumuladas entre 2015 e 2025, como um avanço importante nos compromissos sobre o clima. “Temos o maior programa de reinjecção de CO2 offshore no mundo”, lê-se no relatório sobre as alterações climáticas.
A Petrobras tem dois gasodutos onde o carbono captado serve para limpar o gás natural oriundo de terrenos nas profundezas do mar e do oceano. Além disso, a petrolífera espera conseguir um terceiro gasoduto, a produzir em 2024.
Tal poderia aumentar o abastecimento até 21 milhões de metros cúbicos num dia e, assim, diminuir a dependência do Brasil de importações caras de gás natural liquefeito produzido na Bolívia, que se tornou um fornecedor pouco fiável de combustível proveniente de centrais térmicas.
A Petrobras produz combustível que é relativamente baixo em carbono, tanto pela quantidade de energia usada para produzir o petróleo como pela composição química deste combustível. Um único poço na dita região offshore “da camada pré-sal” do Brasil poderia produzir mais de 50 mil barris por dia.
Entretanto, na Bacia do Permiano, no Texas, são necessários mais de cinco mil poços para produzir a mesma quantidade. A menor quantidade de energia e o menor número de emissões necessárias no Brasil resultam, em parte, do uso de CO2 pela Petrobras para aumentar a eficiência dos poços.
Enquanto muitos produtores se esforçam para cortar a poluição local, a maioria das emissões de gases com efeito de estufa a partir de um barril é produzida quando o combustível é queimado pelos consumidores para transporte ou energia.
A Petrobras também considera que a experiência em reinjecção de CO2 acumulada ao longo de mais de uma década vai ajudar a encontrar novas formas para armazenar o carbono, assim como captar as emissões das refinarias e depois armazená-las em terrenos de petróleo desactivados, o que poderia resultar em potenciais fontes de compensação de carbono.
A indústria petrolífera tem avançado com a captação de carbono e projectos de armazenamento para contrariar as suas emissões. A Occidental Petroleum, por exemplo, está a captar carbono da atmosfera e injectá-lo nos terrenos de petróleo como parte de um plano para conseguir o combustível bruto livre de emissões.
Em sentido contrário, outras empresas petrolíferas de renome encontraram dificuldades para rentabilizar o processo de captação de carbono. Um projecto da Chevron na Austrália está apenas a injectar um terço do carbono que se esperava e tem pela frente anos de trabalho para atingir a capacidade máxima. O projecto foi idealizado para captar quatro milhões de toneladas de CO2 por ano a partir de combustível proveniente de centrais térmicas e armazená-lo num reservatório submarino.
De acordo com vários especialistas, a captura de carbono vai precisar de crescer até 2050 para atingir as zero emissões de gases com efeito de estufa, no caso de o mundo pretender evitar o aquecimento acima de 1,5ºC, tal como o previsto no Acordo de Paris.
Enquanto mais de sete milhões de dólares (cerca de 6,5 milhões de euros) foram investidos em projectos de captura de carbono entre 2018 e 2021, mais de 70% de todo o CO2 captado está a ser usado para promover a recuperação avançada de petróleo, de acordo com um relatório publicado pelo BloombergNEF no final de 2022.
O documento refere também que a captura de carbono para extracção de petróleo, desenvolvido por empresas de combustíveis fósseis ao longo de mais de 30 anos, contribuiu para a fraca aceitação social desta tecnologia.
Exclusivo PÚBLICO/The Washington Post