A Declaração de Impacte Ambiental (DIA) favorável condicionada, emitida à mina do Barroso, impõe a interdição da captação de água do rio Covas, um acesso à auto-estrada 24 e a alocação dos royalties ao município de Boticas. A Agência Portuguesa do Ambiente (APA) disse esta quarta-feira, em comunicado, que decidiu viabilizar ambientalmente a exploração de lítio na mina do Barroso, no concelho de Boticas, distrito de Vila Real, emitindo uma DIA favorável, mas que integra um “conjunto alargado de condicionantes”.
A mina do Barroso, que a empresa Savannah quer explorar, tem uma duração estimada de 17 anos, a área de concessão prevista é de 593 hectares e é contestada por associações locais e ambientalistas e a Câmara de Boticas. Já esta quarta-feira, também em comunicado, a Savannah salientou que “esta é a primeira vez que um projecto de lítio em Portugal tem uma DIA favorável” e referiu que, após esta decisão pela APA, pode “iniciar a próxima fase de desenvolvimento do projecto ao nível do licenciamento ambiental”.
A associação Unidos em Defesa do Barroso (UDCB) repudiou entretanto a Declaração de Impacte Ambiental favorável condicionada à exploração de lítio, em Boticas, e prometeu continuar a lutar contra as minas a céu aberto. A associação afirmou, em comunicado, que repudia “veementemente” esta decisão, que considera “um desrespeito pelos direitos ambientais, humanos e sociopolíticos” e prometeu que continuará a “defender a natureza e proteger as populações da ameaça de minas a céu aberto”.
A associação Zero também criticou o parecer favorável condicionado dado à mina de lítio do Barroso, considerando que as exigências conhecidas são insuficientes para garantir a qualidade de vida da população e a protecção ambiental. Em declarações à Lusa, o ambientalista Francisco Ferreira disse não estar surpreendido com a decisão tendo em conta “a muito forte pressão política para avançar com a exploração de lítio” e a inexistência de uma Avaliação Ambiental Estratégica (AAE).
“Não somos contra a exploração de lítio em Portugal, mas tem de ser nos locais certos e este é um local errado”, defendeu o especialista, sublinhando que “não há minas sem impacto”, mas há locais que estão “mais longe da população” e em diferentes paisagens.
Projecto "alterado substancialmente"
A APA refere que o projecto foi “alterado substancialmente face à proposta inicial, salvaguardando as suas dimensões ambientais (na dimensão da protecção dos cursos de água, da salvaguarda da biodiversidade ou da gestão de resíduos, entre outros)”.
De acordo com a agência, a mina do Barroso obedecerá “a exigentes requisitos ambientais” e incluirá, ainda, “um pacote de compensações socioeconómicas, tais como a alocação dos encargos de exploração (‘royalties’) devidos ao município de Boticas e, entre outros benefícios locais, a construção de um novo acesso que evite o transtorno das populações.
A DIA impõe a alocação da "parcela devida dos ‘royalties’ ao município de Boticas e o desenvolvimento do 'Acesso Norte', que ligará Carreira da Lebre ao Nó de Boticas/Carvalhelhos da A24".
A decisão ambiental emitida incorpora um conjunto alargado de medidas a cumprir pela Savannah Lithium, entre as quais a APA destaca a interdição de captação de água no rio Covas, a definição de uma zona de protecção, com o mínimo de 100 metros de largura, para cada lado do limite do leito do rio Covas.
Ainda a definição do período de desmatação entre 1 de Setembro e 15 de Março, isto é, fora da época crítica de nidificação da avifauna da região, da época de reprodução do lobo ibérico e das demais espécies da fauna, bem como a criação de um corredor que permita e promova a circulação de lobos entre alcateias.
A empresa terá de desenvolver e aplicar um plano de acção, no qual deverão também ser aprofundados os mecanismos de compensação da área do Barroso Património Agrícola Mundial.
Entre as medidas compensatórias a aplicar estão um Plano de Compensação do Património Cultural, o qual deverá incluir um estudo histórico e etnográfico dos vales dos rios Beça e Covas, face à importância do Barroso enquanto Património Agrícola Mundial, um programa de apoio aos criadores de gado, um Plano de Compensação de Carvalhal (habitat 9230), um Plano de Compensação de Gralha-de-bico-vermelho.
Inclui ainda a criação e manutenção de um centro de reprodução de mexilhão-de-rio (Margaritifera margaritifera) no rio Beça, um projecto de compensação do regime florestal e de áreas de povoamentos florestais.
No comunicado, a APA refere que o “aproveitamento do lítio, quando feito em condições ambiental e socialmente responsáveis, tem a potencialidade de gerar uma oportunidade económica nos territórios onde os jazigos minerais se localizam, assim como de promover o cluster industrial associado, potenciando a transição energética, criando emprego e valor acrescentado nacional”.
Assim, acrescentou, “perante a potencialidade de ocorrência deste mineral no nosso território, importa assegurar as condições para a valorização deste recurso do domínio público, assegurando a necessária salvaguarda dos requisitos ambientais”.
A consulta pública do reformulado Estudo de Impacte Ambiental (EIA) da mina do Barroso terminou em Abril com 912 participações submetidas através do portal Participa.
A empresa submeteu o EIA da mina do Barroso em Junho de 2020 e, dois anos depois, o projecto recebeu um parecer “não favorável” por parte da comissão de avaliação da APA, mas, ao abrigo do artigo 16.º do regime jurídico de Avaliação de Impacte Ambiental (AIA), o projecto foi reformulado e ressubmetido a apreciação.
“Como é natural neste tipo de aprovações, a DIA prevê o cumprimento de um conjunto de condições, medidas e compensações e que merecem o acordo da Savannah”, sublinhou a empresa, acrescentando que “estas condições garantem que o projecto será desenvolvido de forma responsável e que os benefícios socioeconómicos serão partilhados com todas as partes interessadas”. O director executivo (CEO) da Savannah, Dale Ferguson, considerou que a decisão positiva da APA “é um passo extremamente importante, não só para o desenvolvimento do projecto lítio do Barroso, mas também para a indústria de matérias-primas do lítio em Portugal”.
“Dado o compromisso da Savannah com práticas responsáveis, que minimizem o impacte e partilhem os benefícios socioeconómicos, a empresa também concordou com as condições associadas à decisão”, afirmou, citado no comunicado.
A Savannah disse ainda que, outras condições, como a não captação de água do rio Covas e o enchimento e a recuperação paisagística das áreas de extracção de minério “reflectem os planos e compromissos que a empresa já assumiu nas suas apresentações à APA, bem como o programa de envolvimento da comunidade e os objectivos de descarbonização”.
“A decisão favorável da APA marca o início de uma nova fase para o projecto de Lítio do Barroso, para a Savannah e para Portugal, que dá o primeiro passo para assumir um papel significativo na cadeia de valor europeia das baterias de lítio e na transição energética”, salientou Dale Ferguson.
Uma DIA favorável permite à Savannah avançar “com os principais estudos económicos do projecto, incluindo a publicação de um estudo actualizado de definição do âmbito, no início do segundo semestre de 2023 e recomeçar o Estudo de Viabilidade Definitivo”.
De acordo com a empresa, o “processo de licenciamento ambiental do projecto vai continuar” e a Savannah espera “apresentar à APA, dentro de nove a 12 meses, o Relatório de Conformidade Ambiental do Projecto de Execução (RECAPE), que incluirá os planos finais para o projecto com todas as condições da DIA, juntamente com as medidas e planos de monitorização ambiental a implementar durante as fases de construção e operação, de forma a cumprir todos os critérios estabelecidos pela DIA.