Presidente guineense diz que não nomeará o líder do PAIGC se este ganhar as eleições

“Eu disse ‘Domingos Simões Pereira nunca o vou nomear’”, garantiu Umaro Sissoco Embaló. “É uma afronta ao povo guineense”, responde Domingos Simões Pereira.

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O Presidente da Guiné-Bissau, Umaro Sissoco Embaló, no palácio presidencial Aaron Ross/REUTERS

Em plena campanha eleitoral para as eleições legislativas de 4 de Junho, o Presidente da Guiné-Bissau voltou a mostrar publicamente a sua animosidade em relação ao líder do maior partido guineense, garantindo que se o PAIGC ganhar, não nomeará o seu líder como primeiro-ministro: “Eu disse ‘Domingos Simões Pereira nunca o vou nomear”.

Para Domingos Simões Pereira (DSP), citado pela Lusa, a declaração de Umaro Sissoco Embaló “é uma afronta ao povo guineense, porque essa afirmação só pode significar uma coisa, que o Presidente está a afirmar que não está disposto a aceitar e respeitar a escolha livre do povo guineense”.

Embaló, como antes o seu antecessor, José Mário Vaz, mantém uma forte rejeição da figura política de DSP, que nestas eleições se apresenta como candidato a primeiro-ministro por uma coligação, a Plataforma da Aliança Inclusiva (PAI)-Terra Ranka, que ainda esta sexta-feira anunciou a assinatura de um acordo político com um grupo de 18 partidos que não apresentou candidatura às eleições legislativas.

“Democracia não é pancada, não é meter medo, não é comprar consciência. Democracia são valores, disse, citado pela Lusa, Alípio Silva, representante do grupo dos 18, que nas últimas eleições presidenciais apoiaram Embaló contra Simões Pereira. Salientando que, nos últimos três anos, DSP “mostrou um carácter ímpar de resistência pela democracia”, Alípio Silva referiu que o apoio à coligação PAI-Terra Ranka “tem a ver com princípios, valores”.

Desde que chegou ao poder, assumindo o cargo de Presidente ainda antes de o processo eleitoral estar terminado, Umaro Sissoco Embaló tem lidado com o semipresidencialismo do sistema político guineense como se na verdade fosse um presidencialismo sem limites e controlos, demitindo o Governo do PAIGC que tinha saído das urnas, tentando promover uma revisão constitucional que só pode ser feita pela Assembleia Nacional e acabando por dissolver o Parlamento em Maio do ano passado.

Por várias vezes nestes três anos, organizações da sociedade civil, partidos políticos e meios de comunicação social independentes denunciaram o clima de medo e perseguição que se instalou no país, com ataques e intimidações por parte de militares e da polícia a adversários políticos, analistas independentes, jornalistas e membros da sociedade civil.

Ainda na semana passada, o advogado Fransual Dias, dirigente do Partido da Renovação Social (PRS), se demitiu do Conselho de Estado depois de um ataque a tiro contra a sua residência e que terminou com a sua viatura incendiada.

No anúncio de demissão, publicado no Facebook, para seguir a “forma informal de tratar os assuntos do Estado” que o Presidente guineense usa, Fransual Dias diz que resistiu “contra ventos e marés, apesar do cúmulo de tristonhos de desgovernação” levados a cabo pelo regime, por ordem directa de Embaló “ou por iniciativas de pessoas do seu circuito”, mas que o ataque foi a gota de água.

“Tendo chegado ao ponto de você e seus comparsas mandarem homens armados para me atacar em minha própria residência, com vários tiros dirigidos ao portão e à parede”, o dirigente do PRS afirmou ao Presidente que não lhe restavam “mais condições” para se manter no Conselho de Estado.

Já esta quarta-feira, a Liga Guineense dos Direitos Humanos (LGDH), uma das mais importantes organizações da sociedade civil, veio reagir “com bastante inquietação” a “mais uma intervenção deplorável, antidemocrática e anti-republicana das forças de segurança em relação ao líder do PAIGC e da PAI-Terra Ranka”, impedido, na terça-feira, “de forma abusiva e ilegal, de aceder à sede do partido e ao centro da cidade” de Bissau.

No comunicado, a LGDH denuncia o “tratamento discriminatório” em relação à campanha de uma das coligações que “viola os princípios basilares do sufrágio eleitoral” e constitui “um desvirtuamento” da democracia e da vontade popular.

Nem DSP nem Geraldo

Nas suas declarações, feitas esta sexta-feira na inauguração do porto de pesca artesanal no bairro do Bandim, em Bissau, o Presidente guineense, sem se importar com a necessidade de manter a equidistância na campanha para as legislativas, não só disse aos guineenses que não convidaria DSP a formar Governo, se a coligação PAI-Terra Ranka vencer no dia 4 de Junho, como afirmou que fará o mesmo se for o vice-presidente do PAIGC e antigo ministro das Finanças Geraldo Martins a ser proposto para a chefia do executivo.

“Eu disse ‘Domingos Simões Pereira nunca o vou nomear’. Tem de ir à Justiça e esclarecer as questões que pendem sobre si. Isso também é valido para o Geraldo. É claro e repito. Mas isso não significa que se a coligação do PAIGC vencer vou dizer que não” deve formar Governo, disse Embaló.

Garantindo não ter nada contra o antigo partido único, o Presidente guineense até referiu que o PAIGC e o Movimento de Alternância Democrática (Madem G-15) poderão formar uma coligação pós-eleitoral para governar o país, mesmo tendo em conta que este último é uma dissidência do primeiro fomentada pelo anterior Presidente, José Mário Vaz, para fragilizar DSP e o PAIGC.

Embaló também aproveitou para enviar uma mensagem ao PRS que, apesar de fazer parte do actual Governo de iniciativa presidencial (junto com o Madem G-15), tem feito uma campanha muito crítica em relação à acção do executivo do primeiro-ministro, Nuno Gomes Nabiam.

“Que as pessoas não façam um erro de avaliação e comprem problemas para si”, ameaçou o chefe de Estado. “Eu não gosto de ingratos”, acrescentou, considerando tratar-se de “infantilismo político e hipocrisia” que o PRS ataque o Governo de que faz parte.

“Cada intervenção do Presidente da República nesta fase é uma oportunidade que perde de honrar a sua própria assinatura da fixação da data de 4 de Junho para as eleições legislativas”, comentou à Lusa Domingos Simões Pereira. “A nossa Constituição convoca para as eleições legislativas os partidos políticos, não convoca outros órgãos de soberania.”

Para o líder do PAIGC, Embaló “devia manter-se equidistante, neutral, respeitador das normas constitucionais”, mas a verdade é que não está a fazê-lo. DSP espera agora que seja o “povo guineense” a responder nas urnas ao Presidente, ao “soberanamente afirmar a sua escolha”.