Presidente do Equador dissolve Assembleia Nacional para evitar destituição
Guillermo Lasso é acusado pela oposição de ter mantido um contrato lesivo para o Estado. Até ao fim do ano devem ser convocadas eleições legislativas e presidenciais.
O Presidente do Equador, o conservador Guillermo Lasso, dissolveu nesta quarta-feira a Assembleia Nacional e convocou novas eleições legislativas e presidenciais para evitar o avanço do processo de impeachment movido pela oposição.
O anúncio foi feito um dia depois de Lasso ter comparecido a uma sessão na Assembleia Nacional em que apresentou a sua defesa das acusações que motivam o pedido de destituição. A oposição acusa Lasso de peculato por ter permitido a manutenção de um contrato entre uma empresa pública e um consórcio privado de transporte de petróleo que lesava os cofres públicos.
Lasso rejeitou as acusações e disse que o contrato em causa foi fechado antes de ter chegado à presidência e que a renovação teve por base termos que não prejudicam o Estado. Na semana passada, uma comissão de fiscalização tinha concluído não haver indícios suficientes para responsabilizar o chefe de Estado, depois de analisar as provas apresentadas pela oposição.
No entanto, o plenário da Assembleia Nacional decidiu avançar com o processo de impeachment e reuniu uma maioria sólida para dar início aos trabalhos. Para que Lasso fosse afastado seria necessária a aprovação de 92 deputados.
A decisão de dissolver a Assembleia Nacional não é totalmente surpreendente, mas é a primeira vez que o dispositivo constitucional conhecido como “morte cruzada” é utilizado.
Na declaração que fez ao país, Lasso citou a “grave crise política” causada pela abertura do processo de impeachment. O Presidente disse que a dissolução da Assembleia Nacional e a marcação de novas eleições são "a melhor decisão para dar uma saída constitucional para a crise política e para a comoção interna" vivida no país.
Pouco depois de ter sido anunciada a dissolução, o edifício da Assembleia Nacional em Quito foi rodeado por membros das Forças Armadas e da polícia, não permitindo a entrada a ninguém, segundo a Reuters.
O comandante das Forças Armadas, Nelson Proano, assegurou que os militares "estão e vão manter o respeito absoluto pela Constituição e pela lei", sublinhando que a decisão de Lasso cumpre os requisitos legais.
A Constituição equatoriana fixa três justificações que podem sustentar a invocação da “morte cruzada”: obstrução ao trabalho do Governo; crise grave ou comoção interna; e usurpação de competências pelo poder legislativo. Nos dois primeiros casos, a decisão está nas mãos do Presidente e apenas na terceira situação é necessária a validação pelo Tribunal Constitucional.
“Esta é uma decisão democrática, não apenas porque é constitucional, mas porque volta a dar o poder ao povo equatoriano para decidir o seu futuro nas próximas eleições”, afirmou Lasso na declaração desta quarta-feira.
Lasso, que foi eleito em 2021, vai permanecer no cargo por um período máximo de seis meses com poderes para governar por decreto, mas apenas para assuntos económicos urgentes, e cabe às autoridades eleitorais a marcação das eleições antecipadas.
Apesar de estar autorizado a invocar a "morte cruzada", o ineditismo da medida, que surge num contexto de turbulência social e económica no país, pode ter consequências imprevisíveis. A principal organização indígena, que tem estado na linha da frente à oposição a Lasso, utiliza a expressão "cenário de ditadura" para definir a decisão do Presidente e deverá convocar protestos para os próximos dias.
É bastante provável que também o movimento político ligado ao antigo Presidente Rafael Correa, que esteve no poder entre 2007 e 2017, intensifique a mobilização popular contra Lasso. Correa vive há vários anos na Bélgica e responde por vários casos de corrupção no Equador, mas continua a gozar de uma elevada popularidade no país.
Lasso, um antigo banqueiro, conseguiu ser eleito em 2021, após duas candidaturas presidenciais falhadas, derrotando Andrés Arauz, o candidato que representava o correísmo.