Inteligência artificial: Elon Musk e Casa Branca pedem ajuda a pioneiro que saiu da Google

Dias depois de sair da Google, Geoffrey Hinton afirma que tem recebido contactos a cada dois minutos depois de classificar a evolução da inteligência artificial como “assustadora”.

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Geoffrey Hinton demitiu-se esta segunda-feira da Google para poder criticar a evolução da inteligência artificial Universidade de Toronto

Do político Bernie Sanders, ao empresário Elon Musk (financiador inicial da OpenAI, que criou o ChatGPT) ou mesmo à Casa Branca, todos leram as palavras de Geoffrey Hinton na última segunda-feira, quando alertou para os perigos da inteligência artificial depois de se demitir da Google. Mais do que lerem, todos terão já pedido ajuda a este pioneiro da inteligência artificial, conforme conta Geoffrey Hinton ao jornal britânico The Guardian.

Mais do que a saída do cientista britânico, radicado no Canadá há várias décadas, a surpresa na última segunda-feira foi o tom crítico utilizado para se referir às tecnologias criadas com a inteligência artificial. “Veja como [a tecnologia de inteligência artificial] era há cinco anos e como é agora”, afirmou Geoffrey Hinton, conhecido como o “padrinho” da inteligência artificial, citado pelo jornal The New York Times. “Pegue nessa diferença e multiplique para o futuro. [A evolução] é assustadora.”

Esta quinta-feira, ao The Guardian, mantém o tom. “É necessário reflectirmos muito sobre isto agora e perceber se há algo que possa ser feito. A razão pela qual não sou tão optimista é porque não conheço nenhum exemplo de algo mais inteligente que seja controlado por coisas menos inteligentes”, sublinha, destacando novamente a evolução da inteligência artificial.

“Durante os últimos 50 anos, tentei criar modelos computacionais que pudessem aprender coisas um pouco como o cérebro também aprende, de forma a compreender melhor como o nosso cérebro aprende coisas. Mas muito recentemente, decidi que, possivelmente, estes grandes modelos são muito melhores do que o cérebro”, afirmou.

Geoffrey Hinton estava na Google desde 2013, depois de décadas de investigação em redes neuronais artificiais – onde um sistema matemático simula os neurónios para, por exemplo, analisar fotografias e aprender a identificar flores ou carros sem necessitar da nossa intervenção. Nesta área, onde começou a trabalhar nos anos 1970, tornou-se um dos pioneiros da inteligência artificial, já que estas redes são uma das bases teóricas para o funcionamento das novas tecnologias que deram o seu grande salto em 2022, sobretudo com o aparecimento do ChatGPT – baseado num grande modelo de linguagem, o GPT-3.5.

Perigo para a democracia

Outra das preocupações elencadas pelo cientista é o perigo para a democracia. “Estas ferramentas ajudam os governos autoritários a destruir a verdade ou a manipular o eleitorado”, diz Geoffrey Hinton.

Ao PÚBLICO, em Fevereiro último, Paulo Castro, investigador da Universidade de Lisboa, alinhava no mesmo alerta: “São tecnologias que não são neutras e que podem influir na estabilidade das democracias ocidentais ou dos nossos modelos de democracia.”

Nos últimos meses, depois do crescimento explosivo do ChatGPT, houve vários pedidos de abrandamento ou de bloqueio das ferramentas com inteligência artificial. No final de Março, um grupo de especialistas e responsáveis pela indústria tecnológica – incluindo Elon Musk e Steve Wozniak, co-fundador da Apple – pediu um travão de seis meses no desenvolvimento da inteligência artificial. Dias depois, a Itália bloqueou o ChatGPT por desrespeitar a privacidade dos cidadãos e ser pouco transparente – algo que já foi revertido perante as promessas da OpenAI, que gere esta ferramenta.

Também existe a visão menos pessimista, como defende Virgínia Dignum, especialista em ética da inteligência artificial: “O exemplo que costumo dar é o da introdução das calculadoras científicas há 30 ou 40 anos. Antes disso, todos aprendíamos a calcular uma raiz quadrada à mão e parte do exame de matemática era demonstrar que sabíamos calculá-la. Agora não se aprende isso. Aprende-se a perceber quando é preciso utilizar uma raiz quadrada e o que ela significa. O resto do trabalho é feito pela calculadora e ninguém pensa agora em tirá-las do ensino da matemática”, apontou a investigadora portuguesa da Universidade de Umea (Suécia) ao PÚBLICO, em Fevereiro deste ano.

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