O Gafanhoto da Gafanha da Encarnação: cozinha “danada” com sabor a ria e a mar

Partindo da base tradicional, O Gafanhoto acrescenta à sua rusticidade a inovação e o cosmopolitismo que lhe refinam o gosto. Sabor e satisfação neste restaurante da Gafanha da Encarnação, Ílhavo.

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Restaurante O Gafanhoto, na Gafanha da Encarnação NELSON GARRIDO

Há um ar regenerador na Gafanha da Encarnação, que mistura a brisa marítima e a frescura do pinhal e nos revigora e abre o apetite. Talvez possa explicar o topónimo e a dezena de gafanhas estabelecidas ao redor da ria de Aveiro, que muitos associam às gafarias, os lugares isolados e afastados para onde durante a Idade Média eram remetidos leprosos. A história mais recente dá, por outro lado, conta da chegada de vários grupos de colonos vindos de outras regiões com o propósito de tornar produtivas aquelas terras áridas de areia branca, que fertilizaram aproveitando esses ares regeneradores e o moliço da ria.

Seja qual for a origem, juntando ares e moliço, a riqueza e larga experiência piscatória das suas gentes, é mesmo revigorante a viagem até à Gafanha da Encarnação, onde, junto à escola, na larga avenida que liga pinhal e ria, está o restaurante O Gafanhoto, propondo “uma cozinha directa e rústica, assente essencialmente nos produtos do mar e da ria, para quem gosta de comer bem num ambiente descontraído e informal”. Falta dizer que é também sempre fresca, aromática, rigorosa e equilibrada a cozinha que Paulo Rocha e a mulher, Gina, ali oferecem há já quase três décadas.

Em visita recente, a meio da semana e em hora de almoço, a oferta estendia-se por 10 entradas, a que se juntavam duas sopas (de peixe ou e alho francês). “O peixe fresco” desdobrava-se em 15 propostas, mais quatro para “O fiel amigo”, três para “os búzios e as gambas”, seis para “A vaca e o porco”, e ainda as alternativas vegetarianas (duas) e uma meia dúzia de sobremesas.

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Restaurante O Gafanhoto - Gafanha da Encarnação NELSON GARRIDO

Começou-se com a “cavala marinada” (7,50€), com filetes de lombo temperados com grãos de pimentas e o complemento de cebola (branca e roxa), seguiram-se as inevitáveis “petinguinhas fritas” (7,50€), enfarinhadas de fritura crocante e frescura imaculada. As ostras da ria de Aveiro (panadas, 4, 11€) ou ao natural (2,40€ cada), pataniscas (7,50€) ou ovas temperadas (6,60€) de bacalhau, e camarão ao alho (12,50€), faziam também parte das propostas do dia.

Entre “O peixe fresco” alinhavam-se a lula, linguadinhos, sável, enguias, pescada, besugo, garoupa ou pregado, em preparações desde o escabeche aos tradicionais filetes e ensopados, até fritos, cozidos (cabeça de garoupa) e grelhados.

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Paulo e Gina comandam as operações NELSON GARRIDO

Em terra de “ceboleiros”, como são apelidados os locais, a opção recaiu sobre o “Ensopado de garoupa” (30€), um cozinhado de estalo onde a qualidade da batata e da cebola local têm um papel distintivo. Tacho na mesa, aroma quente de ar salgado, peixe de carnes macias, textura firme e envolvência suculenta. Um prato divinal, a que os ingredientes locais conferem textura e sabor únicos.

A par dos ensopados ou da tradicional caldeirada de enguias, também as lulas e gambas salteadas com tomate e coentros ou a feijoada de búzios com gambas são referências deste Gafanhoto, que tem no “Especial de bacalhau” (2 pax / 40€) outra das suas propostas incontornáveis.

É uma viagem em quatro etapas pelo mundo do bacalhau. Duas frias e duas quentes e que à abordagem às diferentes partes do maravilhoso gadídeo (lombos, barriga, ovas e sames) associa igualmente a qualidade distintiva da cebola e batatas locais. Começa com as ovas temperadas que são servidas em fatia de broa, seguem-se as pataniscas onde se afirmam também a textura da cebola e o aroma da salsa, que antecedem os dois cozinhados quentes.

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Primeiro a feijoada de sames, que é abundante também em cenoura cuja doçura equilibra na perfeição com as gelatinas e ponto de sal; depois o Bacalhau à Gina, um autêntico grand finale, que também pode ser servido a solo (19,59€). A posta inteira é gratinada no forno com cebola, azeite e rodelas de batatinha da areia, tudo suavemente polvilhado com pão ralado

Um prato “danado”, com gostam de classificar os locais quando o cozinhado é mesmo de estalo. Pela qualidade do bacalhau, claro, a decompor-se em lascas firmes e gelatinosas, pela excelência da cozedura, mas também pela envolvência do conjunto e ainda o complemento das migas de grelos com broa e feijão frade. “Danado” mesmo!

O Gafanhoto NELSON GARRIDO
O Gafanhoto NELSON GARRIDO
O Gafanhoto NELSON GARRIDO
O Gafanhoto NELSON GARRIDO
O Gafanhoto NELSON GARRIDO
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O Gafanhoto NELSON GARRIDO

Desta vez ficaram sem espaço “A vaca e o porco”, que se oferecem num “mar e terra” (19,50), num grelhado de vaca, lulas e gambas com batata frita à rodela e migas; “Naco de vaca grelhado” (18,50), com cogumelos portobello e puré de batata; “Posta à Lagareiro” (18€) ou “Bife com três pimentas” (17,50€); e “Cataplana de lombinhos de porco com cogumelos” (2 pax / 36€).

“Danada” é também a cozinha deste Gafanhoto que partindo da base tradicional acrescenta à sua rusticidade um plus de inovação e cosmopolitismo que refina o gosto, dá agrado e sabor. Satisfação que é potenciada pela simpatia e eficácia do serviço e uma alargada e qualificada carta de vinhos, que, privilegiando a Bairrada, oferece também boas opções para a restante regiões. E a preços sensatos.

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O Gafanhoto Nelson Garrido
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