FBI detém Jack Teixeira, 21 anos, suspeito da fuga de informação do Pentágono
Detenção do lusodescente membro da Guarda Nacional Aérea do estado do Massachusetts foi confirmada pelo procurador-geral dos EUA, Merrick Garland.
Jack Teixeira, de 21 anos, membro da Guarda Nacional Aérea do estado norte-americano do Massachusetts, foi esta quinta-feira detido na cidade de North Dighton como suspeito pela fuga de informação no Pentágono que expôs segredos militares e políticos de vários aliados e adversários dos EUA, incluindo pormenores sobre operações da guerra na Ucrânia.
De acordo com a CNN Portugal, que cita Francisco Viveiros, presidente da Casa dos Açores de Fall River, no Massachusetts, Jack Douglas Teixeira é luso-descendente, sendo o avô natural da ilha de São Miguel.
A detenção de Teixeira, que trabalha nos serviços de informação daquela força de reserva na estrutura militar dos Estados Unidos, foi confirmada pelo procurador-geral, Merrick Garland, que acrescentou que o suspeito será presente a um tribunal federal em Boston.
"Agentes do FBI detiveram Teixeira ao início desta tarde, sem incidentes", disse Garland num breve comunicado do Departamento de Justiça. A identidade do responsável pela fuga de informação, que o porta-voz do Pentágono, o brigadeiro-general Pat Ryder, classificou esta quinta-feira como "um acto criminoso deliberado", tinha sido avançada pelo jornal New York Times e pelo canal NBC News.
Segundo informações divulgadas pela Força Aérea dos EUA e citadas pela CNN, Jack Teixeira é oficial de 1.ª classe da Guarda Nacional Aérea do Massachusetts, força na qual ingressou em Setembro de 2019. A sua função é de especialista do Sistema de Ciber-Transporte, com a tarefa de garantir que a “vasta rede global de comunicações” do serviço está a operar correctamente.
Na noite de quarta-feira, o Washington Post avançou um perfil e as supostas motivações do presumível responsável, com base em entrevistas a dois adolescentes que frequentavam um grupo na plataforma Discord, a partir da qual os documentos foram disseminados, de nome Thug Shaker Central.
O Post adiantava então que a fuga teria sido obra de um jovem de 20 e poucos anos que frequentava um canal na plataforma Discord — muito popular nas comunidades de jogos online —, criado por um grupo de adolescentes em 2020, no auge dos períodos de confinamento decretados por causa da pandemia de covid-19.
As autoridades norte-americanas continuam a investigar o caso, ao mesmo tempo que tentam minimizar o impacto da fuga nas relações dos EUA com os seus aliados.
Guterres espiado
Nesta quarta-feira, a BBC noticiou que os documentos revelam uma avaliação muito negativa, por parte dos EUA, sobre a postura do secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, em relação à guerra na Ucrânia.
Segundo os documentos citados pela BBC, Guterres é acusado de ser “demasiado atencioso” com as tentativas da Rússia para melhorar a sua capacidade de exportação de cereais e fertilizantes, mesmo quando as propostas de Moscovo incluem entidades e indivíduos sancionados por causa da guerra na Ucrânia.
Entre muitos outros segredos, os documentos que vieram a público nos últimos dias indicam que os EUA mantêm uma operação de espionagem permanente sobre os seus aliados, uma prática que já tinha sido noticiada noutras ocasiões — e que também é seguida, sob as mais variadas formas, por outros países em relação aos EUA e entre si.
Em 2013, na sequência das revelações feitas por Edward Snowden, soube-se que a Agência de Segurança Nacional norte-americana [NSA, na sigla original] espiava as comunicações dos Presidentes do Brasil, Dilma Rousseff, e do México, Enrique Peña Nieto. E, em 2021, o canal dinamarquês DR noticiou que a NSA usou uma parceria com os serviços de informação da Dinamarca para espiar a ex-chanceler alemã Angela Merkel e outros líderes europeus.
Desta vez, os documentos extraídos do Pentágono mostram, por exemplo, que o Governo da Coreia do Sul se sente pressionado pelos EUA a fornecer munições de artilharia ao Exército ucraniano — uma decisão que seria contrária às leis sul-coreanas, que proíbem o envio de armamento para países em guerra.
Noutros documentos, o Presidente do Egipto, Abdel Fattah el-Sisi — um dos principais parceiros dos EUA no Médio Oriente, apesar da instabilidade nas relações entre os dois países —, é acusado de ordenar, em segredo, a produção de dezenas de milhares de rockets para o Exército russo; e a Turquia, um membro da NATO, é apontada como um alvo do grupo de mercenários russos Wagner para uma possível compra de armamento e outro tipo de equipamento militar.
De visita à Irlanda, o Presidente dos EUA, Joe Biden, disse que a investigação conduzida pelo Departamento de Justiça estava "perto" de identificar o responsável pela fuga, e tentou desvalorizar a importância das revelações.
"Preocupa-me o facto de [a fuga] ter acontecido, mas pelo que sei não foi divulgado nenhum facto contemporâneo que tenha grande significado", disse Biden.
“Jovem carismático”
No artigo do Post, o responsável por estas e outras revelações, agora confirmado como Jack Teixeira, é descrito como “um jovem carismático e entusiasta de armas, que partilhou documentos secretos com um grupo de conhecidos que procuravam companhia durante o isolamento da pandemia”.
Segundo o jornal, trata-se de um jovem que diz trabalhar numa base militar norte-americana, onde teria acesso a instalações usadas para guardar informações confidenciais do Governo dos EUA.
As informações sobre o perfil e as possíveis motivações do responsável pela fuga de informação foram obtidas a partir de entrevistas com dois adolescentes que frequentavam o canal onde os documentos começaram a ser partilhados, ainda em 2022.
Segundo um dos adolescentes — que tem menos de 18 anos, e cuja entrevista teve de ser autorizada pela sua mãe, segundo o Post —, o responsável pela fuga era tratado no grupo como “OG”.
Criado em 2020, o canal na plataforma Discord era um espaço partilhado por 25 utilizadores, a maioria homens e adolescentes, “unidos por uma paixão por armas, por equipamento militar e por Deus”, diz o jornal norte-americano. Na maior parte do tempo, os membros do grupo “trocavam memes e anedotas ofensivas” e “viam filmes e rezavam”.
Nas entrevistas aos dois adolescentes, os jornalistas do Post notaram que os membros do grupo admiravam “OG” e que ainda hoje se sentem fascinados por ele.
“Ele está em forma. Anda armado. Tem treino. Tem tudo o que podemos esperar de um filme de acção”, disse um dos jovens citados pelo jornal. “Senti-me como se estivesse no cume do monte Everest”, disse o mesmo jovem, sobre o que sentiu quando viu os primeiros documentos secretos partilhados por “OG” no grupo. “Senti que estava acima de toda a gente, por saber coisas que mais ninguém sabia.”
Família online
Segundo o Post, os adolescentes entrevistados diziam conhecer a verdadeira identidade de “OG” e sabiam onde ele trabalha, mas não quiseram dar essas informações ao jornal.
Quanto às possíveis motivações de “OG”, um dos adolescentes afirma que não o vê como um verdadeiro whistleblower (denunciante), já que nunca notou qualquer intenção, por parte do responsável pela fuga, de expor eventuais abusos de autoridade perante todo o país.
A divulgação dos documentos teria como únicos destinatários os utilizadores do grupo na plataforma Discord — a quem o membro entrevistado pelo Post se refere como a sua “família online“, e que inclui utilizadores da Europa, da Ásia e da América Latina.
Os utilizadores entrevistados pelo Post afirmam que “OG” “não é um agente russo nem ucraniano”, mas o jornal salienta que as plataformas de jogos online são alvos habituais de operações de espionagem e contra-espionagem por parte dos EUA e da Rússia.
“Os EUA suspeitam de que agentes russos travam amizade com jogadores que dizem trabalhar em agências de espionagem, e que os encorajam a divulgar informação confidencial” em plataformas como o Discord, diz o jornal. Com Pedro Guerreiro