Acaba onda de calor que durou dez dias. Temperaturas altas em Abril indicam Verão maior

Depois da onda de calor, há uma descida de temperatura em Portugal, com chuva em alguns pontos do país. Mas não será por muito tempo: as temperaturas altas voltam em breve e indicam Verão prolongado.

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Temperaturas elevadas indicam que as condições associadas ao Verão poderão acontecer também na Primavera e Outono Nuno Alexandre

O território de Portugal continental passou por uma onda de calor que em alguns locais durou dez dias, mas que terminou nesta terça-feira. As temperaturas altas em Abril identificam-se com uma tendência para Verões mais alargados, disse à Lusa o professor e investigador Pedro Matos Soares, que garante que o clima é hoje diferente de há duas décadas.

A onda de calor foi comunicada pelo Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA). Este fenómeno acontece quando as temperaturas são cinco graus celsius (5ºC) acima da média durante pelo menos seis dias consecutivos.

A partir desta quarta-feira, todo o continente deixa de estar em onda de calor, com descida de temperatura generalizada e alguma precipitação fraca a norte e centro, prevendo-se que as temperaturas voltem a subir no final da semana.

Segundo o meteorologista Jorge Ponte, do IPMA, as temperaturas acima da média durante seis dias foram sentidas em todo o país, mas há regiões, especialmente no Alentejo, que estiveram com dez dias de temperaturas cinco graus acima da média para a época. Jorge Ponte explicou ainda que Abril está a ser um mês quente e seco.

Segundo o último boletim climatológico do IPMA, a situação de seca meteorológica aumentou em Portugal continental durante o mês de Março, piorando na região sul.

A 31 de Março, 48% do território encontrava-se em seca meteorológica, enquanto no último dia de Fevereiro a percentagem era de 28%.

Primaveras e Outonos mais quentes

As projecções sobre as alterações climáticas, explica o investigador Pedro Matos Soares, apontam para Verões mais alargados, com Primaveras e Outonos com mais características de Verão.

Investigador principal do Instituto Dom Luiz e professor no Departamento de Engenharia Geográfica, Geofísica e Energia, ambos da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, Pedro Matos Soares, doutorado em Física da Atmosfera, é especialista em modelização climática regional, alterações climáticas, eventos extremos e interacções terra-atmosfera-oceano.

E é socorrendo-se da ciência que afirma por duas vezes à Lusa: o clima dos últimos anos é diferente do que era há duas décadas.

O clima, explica, é retratado numa escala mais longa, de 30 anos, mas passados 23 do novo século já há dados concretos que indicam que “é claramente diferente do que era no século passado”.

“Estávamos num clima diferente até 2000. Quase todos os anos a nível mundial, europeu e regional, temos recordes de temperaturas médias e extremas mais quentes”, afirma.

Seca e incêndios

Com quase metade de Portugal continental (48%) em seca meteorológica e a viver uma onda de calor, segundo o Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA), o país registou vários incêndios nos últimos dias.

Pedro Matos Soares avisa que as projecções são de que os riscos de incêndio vão aumentar e que são “muito preocupantes”. “O Governo tem essas projecções”, diz.

E as projecções para as temperaturas? O especialista afirma que, para os próximos 20 ou 30 anos, as projecções são todas “muito robustas” a apontar para um aquecimento e maior frequência de eventos climáticos.

“Todos os modelos apontam para isso, mas dependem das emissões globais de gases com efeito de estufa. Com a continuação do crescimento dessas emissões, o clima é de mudança acelerada”, mas, se for cumprido o Acordo de Paris, o aumento das temperaturas será muito mais reduzido, explica.

Pedro Soares admite que, nas sociedades, há por vezes a “percepção emocional” de que o clima está a mudar muito depressa e acrescenta que, olhando para os dados, há de facto essa aceleração.

A situação actual contraria a sabedoria popular de “Abril, águas mil”, mas também os dados sobre a “precipitação muito importante na Primavera”.

O professor salienta que é impossível prever o que se vai passar, mas acrescenta que não ficaria admirado se o país estivesse já a entrar no Verão, “porque as Primaveras sem chuva têm tendência a aumentar”.

Inacção “por incúria e incapacidade”

E continuam os países e governos a ignorar estas tendências? Pedro Matos Soares diz que não, porque se fala muito das emissões de gases com efeito de estufa, das alterações climáticas e das suas causas e consequências, porque os cientistas deixam alertas.

Mas, diz, os países não observam o problema de maneira estratégica para eles e para o planeta. Há, considerou, uma inacção “por incúria e incapacidade”.

Na Europa, que como os Estados Unidos ou a China tem responsabilidades históricas, há uma trajectória decrescente das emissões, mas é preciso que outras regiões a acompanhem, salienta.

O especialista admite que se trata de um problema complexo, porque urgem acções globais e cada país “empurra” para os outros.

Por vezes, os países só agem quando são atingidos, admite o responsável, salientando que o Paquistão e a Índia não tinham divulgado limites de emissões até serem vítimas de fenómenos climáticos extremos, como foram no ano passado.

Mesmo em Portugal só se começou a falar a sério de alterações climáticas a partir dos incêndios de Pedrógão Grande, em 2017, considera Pedro Soares.