A rota entre o aeroporto de Lisboa e o Aeródromo de Tires, uma distância de 20,37 quilómetros, foi a segunda com maior intensidade carbónica da aviação privada na Europa em 2022, segundo um relatório divulgado pela Greenpeace no fim de Março. A Câmara Municipal de Cascais, que explora o aeródromo, justifica-se com o crescimento do sector da aviação privada, e diz fazer compensação de emissões de dióxido de carbono (CO2) num plano que conta com o apoio da Air BP.
“O aumento de tráfego de Aviação Executiva entre o Aeroporto Humberto Delgado e o Aeródromo Municipal de Cascais é uma realidade, proveniente do igual crescimento verificado a nível mundial do sector em questão”, reconhece António Santinhos, responsável do aeroporto de Cascais, numa resposta escrita a perguntas do PÚBLICO, a propósito do relatório da Greenpeace.
O relatório mostra que Portugal surgiu nos últimos dois anos no top 3 das rotas da aviação privada europeias com maior intensidade de emissões de CO2, e é um dos dez países com mais emissões causadas pelos voos de jactos privados em 2022. O aumento de tráfego entre o aeroporto de Lisboa e o Aeroporto Municipal de Cascais (Tires) foi o que levou Portugal para o topo desta tabela desde 2021.
Embora Portugal não esteja na lista dos dez países com maior número de voos, está ainda em nono lugar no rol dos que têm mais emissões: para 7994 voos de jactos privados teve um total de 65.323 toneladas de emissões.
Projectos "globais" para compensar
“Com o sentido de responsabilidade social, visto que o crescimento já era expectável e identificado por diversas previsões realizadas sobre a indústria, em 2020 o Aeródromo Municipal de Cascais tornou-se a primeira estrutura aeroportuária do mundo em que as emissões provenientes das operações de abastecimento de aviões foram neutralizadas”, diz António Santinhos, responsável da empresa municipal Cascais Dinâmica, que explora o aeroporto de Cascais.
As emissões foram compensadas em conjunto com a Air BP, a divisão da petrolífera especializada no sector da aviação, explica. “Conseguimos compensar as emissões de carbono de todos os combustíveis de aviação (Jet A1 e Avgas, 100LL) através do [programa] BP Target Neutral”, escreve António Santinhos na resposta ao PÚBLICO. Os créditos de carbono foram utilizados em “projectos globais que financiam a utilização de energias renováveis, baixo carbono e a protecção de florestas”, avança, sem adiantar mais pormenores sobre estas iniciativas.
Um relatório do ano passado do consórcio Net Zero Tracker, que avalia os dados públicos disponíveis de cerca de 200 países, bem como de grandes empresas cotadas em bolsa, incluindo aquelas de combustíveis, salientava o problema de credibilidade de que sofrem os esquemas de compensação de carbono – ou compra de créditos para emissões reduzidas em outros lugares –, por falta de regulamentação. Apesar disso, quase 40% das empresas da lista Forbes 2000 com metas de “emissões líquidas zero” planeavam usar compensações, apesar das preocupações com a falta de regulamentação.
Portugal tem o objectivo de desenvolver um mercado voluntário de carbono de âmbito nacional. A consulta pública sobre o decreto-lei que promove este mercado decorria até esta segunda-feira.
Um problema para a indústria da aviação
A associação ambientalista Zero expressou, em comunicado divulgado nesta segunda-feira, “preocupação relativamente aos mercados voluntários de carbono enquanto conceito eficaz para a prossecução de acção climática efectiva, pois potencialmente desviam a atenção (e recursos) do foco principal: uma redução célere e profunda das emissões”. A proposta para o Mercado Voluntário de Carbono português “infelizmente é um exemplo disso”, diz a Zero.
O PÚBLICO perguntou à Câmara Municipal de Cascais se tem projectos para tornar mais sustentável o modelo de desenvolvimento do aeroporto de Cascais. O representante da empresa municipal Cascais Dinâmica, que explora o aeródromo, encarou a questão como um desafio à indústria da aviação.
“A preocupação do impacto ambiental proveniente do sector aeronáutico é mundial e os projectos que existem são à escala mundial, dada a dependência da queima de fóssil da aviação”, diz a resposta assinada por António Santinhos. A indústria procura desenvolver acções de mitigação para proteger o sector, “como a utilização de novas tecnologias de propulsão, combustíveis sustentáveis e compensação de carbono”, salienta.
“O Aeródromo Municipal de Cascais é consciente da evolução destes projectos e tem em conta o seu desenvolvimento futuro, com vista à sustentabilidade dentro do que é desenvolvido pela indústria para protecção da mesma e da nossa comunidade”, conclui o responsável da empresa municipal.