110 Histórias, 110 Objectos. O contador de energia, Aron

No 89.º episódio, descobrimos o contador de energia do Técnico. O podcast 110 Histórias, 110 Objectos, do Instituto Superior Técnico, é um dos parceiros da Rede PÚBLICO.

A história do exemplar de contador de energia Aron do Técnico começa numa busca por “velharias” feita nas caves e nos laboratórios da Escola a pensar na futura colecção do Museu Faraday, a funcionar desde 2017 no campus Alameda. Numa dessas jornadas, depois da abertura forçada de armários que já não tinham chave, veio a surpresa: “Aquilo estava cheio de contadores muito antigos, mesmo muito antigos. E provavelmente muitos deles vieram do Instituto Industrial e Comercial de Lisboa (que antecedeu o Técnico entre 1869 e 1911)”, conta Moisés Piedade, responsável pelo Museu Faraday e professor aposentado do Departamento de Engenharia Electrotécnica e de Computadores do Técnico. Foram encontrados cerca de 30 contadores, alguns repetidos, tendo oito deles (com diferentes máquinas internas) integrado um painel que pode ser visto no Museu. Entre essas peças destacava-se um aparelho da marca alemã Aron, “o único diferente dos outros todos”.


Se hoje em dia é corriqueiro saber-se que há instrumentos que medem com exactidão o consumo eléctrico de cada um, com reflexo nas contas de electricidade a pagar, no final do século XIX ainda estava tudo por inventar. E o contador Aron, com patente registada em 1882, foi um dos pioneiros. “Na altura [quando encontrou o contador] eu nem conhecia o princípio do funcionamento. Ao ver aquele contador, a primeira reacção que se tem é achar que é um relógio”, conta. Perante o objecto, a equipa do Faraday foi investigar e descobriu que se tratava do “primeiro contador que media a energia consumida com uma precisão espectacular” e que “realmente funcionava bem”. Desenvolvido por um cientista alemão, Hermann Aron (1845-1913), este contador electromecânico incorporava um visor numérico (de 0 a 9), que andava numa roda de discos, com os dígitos seleccionados a aparecerem numa janela.

Até esse período, a energia eléctrica habitualmente usada era proporcionada por geradores de corrente contínua, como o dínamo de Gramme (ouvir episódio Episódio 70 – O dínamo de Gramme). Em 1882, nos Estados Unidos, Thomas Edison (1847-1931) começou a querer vender energia da corrente contínua, mas antes de o conseguir teve que fornecer energia gratuitamente durante um ano, por não haver contadores. Em 1885 foi a vez de Berlim apresentar um concurso para a compra dos primeiros 100 contadores de energia para aplicar num bairro da cidade. Na lista de concorrentes dois nomes: Edison e Aron. Apesar da maior experiência do primeiro, seria Aron a vencer o concurso com um aparelho que tinha “uma precisão muito superior aos que o Edison forneceu”. “É revolucionário porque o Edison tinha quatro ou cinco patentes a partir do contador químico”, realça Moisés Piedade.


No Técnico não há exemplares desse contador químico de Edison, mas isso não foi problema para a equipa do Museu Faraday. Após um contacto do curador de uma exposição sobre contadores de energia que viria a ser apresentada no MAAT (Museu de Arte, Arquitectura e Tecnologia) e que procurava esse instrumento, a resposta foi simples: “Eu disse: não temos mas vamos fazer uma réplica. Ficou lá exposta o tempo todo”, recorda Moisés Piedade.
O curador da exposição intitulada “Contadores de histórias”, o arquitecto e historiador Joaquim Moreno, relembra a base da exposição: “O Museu da Electricidade é um monumento à produção de energia, não explica nada da distribuição nem do consumo”. “Tinha de encontrar outra coisa que me permitisse explicar a distribuição e o consumo. Como é que a energia saía dali e chegava a casa de toda a gente. Foi aí que achei que o objecto sócio técnico para contar a história disto tudo era de facto o contador”, complementa. A réplica construída pela equipa do Faraday dava assim o mote para a exposição que esteve exposta em 2022.


Dos primeiros 100 contadores de Berlim até Aron desenvolver um negócio com mais de mil funcionários passariam apenas 27 anos. O professor universitário com nome de origem judaica morreria em 1913 e deixava como herança uma empresa que viria a ter também um grande papel no desenvolvimento da rádio. Gerida por um filho, nasceria a empresa Nora (Aron ao contrário para diluir o nome e fugir à perseguição de que os judeus foram alvo). Começava uma nova era em que a rádio também teria um grande papel a contar as histórias que estavam por chegar.


O podcast 110 Histórias, 110 Objectos é um dos parceiros da Rede PÚBLICO. É um programa do Instituto Superior Técnico com realização de Marco António (366 ideias) e colaboração da equipa do IST composta por Filipa Soares, Sílvio Mendes, Débora Rodrigues, Patrícia Guerreiro, Leandro Contreras, Pedro Garvão Pereira e Joana Lobo Antunes.

Siga o podcast 110 Histórias, 110 Objectos no Spotify, na Apple Podcasts ou em outras aplicações para podcast.

Conheça os podcasts da Rede PÚBLICO em publico.pt/podcasts. Tem uma ideia ou sugestão? Envie um e-mail para podcasts@publico.pt.

Sugerir correcção
Comentar