Elvira Fortunato tentou manter bolsa europeia depois de ser convidada para o Governo
Bolsas atribuídas pelo Conselho Europeu de Investigação são exclusivas do investigador principal que garante o financiamento. Ainda assim, a actual ministra tentou manter bolsa, terminada em 2022.
Quando Elvira Fortunato aceitou o convite para integrar o actual Governo de António Costa, em Março de 2022, perdeu a bolsa de 3,5 milhões de euros do Conselho Europeu de Investigação (ERC, na sigla em inglês). Apesar de a bolsa ser atribuída directamente ao investigador, o Expresso adianta esta sexta-feira que a agora ministra da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior ainda tentou manter a bolsa no seu grupo de investigação junto das entidades europeias – algo que não é possível e no qual não foi bem-sucedida.
“As bolsas do ERC não podem ser transferidas do investigador principal para outro investigador”, afirma a Agência Executiva do ERC em resposta ao PÚBLICO. Este tipo de financiamento atribuído pela instituição sob a tutela da Comissão Europeia permite que os cientistas que ganhem bolsas possam mudar de centro de investigação e levar consigo a verba dos projectos, mas não o podem transferir para outros cientistas ou manter as bolsas depois de entrar para um governo.
A bolsa foi acabando de forma gradual até ao final do ano passado, terminando um ano antes do previsto. A bolsa, na categoria de bolsa Avançada, no valor de 3,5 milhões de euros, tinha sido atribuída em 2018 e o financiamento duraria até ao final de 2023. O projecto da agora ministra definia a criação de um laboratório no Centro de Investigação de Materiais do Laboratório Associado i3N (Cenimat), na Universidade Nova de Lisboa – um trabalho interrompido no final de 2022.
De acordo com o Expresso, as transferências para a universidade pararam nos 2,87 milhões de euros – dos 3,5 milhões previstos. “O ERC foi contactado em Março de 2022 e nas semanas seguintes foi negociada uma solução com a instituição para descontinuar o projecto até 31 de Dezembro de 2022”, acrescenta a Agência Executiva do ERC. O trabalho científico de Elvira Fortunato é dedicado à electrónica transparente e à sustentabilidade dos materiais, área em que garantiu duas destas bolsas Avançadas do ERC (a primeira tinha sido em 2008).
Contactado pelo PÚBLICO, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior não respondeu até ao momento da publicação às questões colocadas.
A Agência Executiva do ERC adianta ainda na resposta que a descontinuação das bolsas “é um procedimento normal, quando o investigador principal não está em posição de dedicar tempo à execução do projecto”, referindo ainda a existência de casos similares no passado.
O Expresso revela ainda que a Representação de Portugal Permanente junto da União Europeia confirmou ter conhecimento da abordagem de Elvira Fortunato junto da Comissão Europeia “sobre a possibilidade de alteração do investigador responsável do projecto financiado pela referida bolsa”. Algo que é, no entanto, negado ao PÚBLICO pela Agência Executiva do ERC.
Os pedidos de Elvira Fortunato terão sido dirigidos à comissária europeia com a pasta da ciência, Mariya Gabriel, que não terá respondido ao pedido, bem como ao ERC. Ao Expresso, o gabinete da ministra responde que os contactos com a Agência Executiva do ERC começaram a 10 de Março de 2022, acrescentando que “estava em causa a contratação de investigadores, assim como a amortização relativa à compra de um grande equipamento no valor de dois milhões de euros (um microscópio de transmissão de elevada resolução).”
O anúncio de que Elvira Fortunato integraria o terceiro governo formado por António Costa surgiria apenas a 23 de Março, uma semana antes da tomada de posse.