PJ sobre ataque no Centro Ismaili: “Estão afastados todos os sinais de terrorismo”
A Polícia Judiciária já interrogou o autor do ataque no Centro Ismaili em Lisboa que fez duas vítimas mortais e diz que tudo aponta para que o refugiado afegão tenha tido um “surto psicótico”.
O director nacional da Polícia Judiciária disse esta manhã que estão "afastados todos os sinais" de que o crime cometido ontem por um refugiado afegão no Centro Ismaili em Lisboa tenha tido motivação religiosa fruto de uma radicalização do indivíduo.
"Não há o mínimo indício, um único sinal, que permita afirmar que estamos perante a radicalização de uma pessoa", afirmou Luís Neves em conferência de imprensa. "Está afastado o crime de terrorismo."
A explicação da investigação aponta para a ocorrência de um "surto psicótico" mas Luís Neves argumentou não poder falar sobre o assunto por uma questão de "intimidade" do atacante e alegou o mesmo quando questionado se este mostrou algum sinal de arrependimento.
Porém, está por explicar se a arma branca com que os suspeito agrediu três pessoas era do centro ou se a tinha trazido de casa, o que poderá, neste último caso, revelar alguma premeditação - que o director da PJ recusou especificar ao PÚBLICO alegando ser uma "questão muito especial da investigação". Salientou, no entanto, que o "surto psicótico surge num determinado momento mas tem por base uma situação de um conjunto de factos que se vão somando" até que se desencadeia a reacção da pessoa.
Está também por explicar o timing de a agressão ter sido levada a cabo na véspera de uma viagem, assim como a origem do telefonema que o terá transtornado durante a aula a que assistia - e que a PJ não quer revelar quem era a pessoa com quem o atacante falou.
De acordo com a avaliação médica, o agressor não terá alta antes de 10 a 15 dias e só nessa altura estará em condições de saúde para se apresentar a um juiz de instrução criminal, apontou Luís Neves.
Questionado pelo PÚBLICO, o director nacional da PJ confirmou que o afegão tinha um voo marcado para hoje com destino à Alemanha e que levaria consigo os três filhos. Apesar de realçar que há casos de refugiados que chegam à Europa e depois mudam de país por terem família ou amigos noutros locais, Luís Neves admitiu ainda não saber se o cidadão afegão teria alguém conhecido naquele país. Neste momento há perguntas que estão a ser colocadas no âmbito da cooperação policial internacional: "Nós esperamos ter respostas nas próximas horas para um conjunto de questões".
O director nacional da PJ explicou que a investigação conseguiu mapear a vida deste homem desde o Afeganistão, de onde fugiu com a mulher e os três filhos, passando pela Grécia, onde a mulher morreu num incêndio no campo de refugiados de Lesbos, até chegar a Portugal em 2021 com os três filhos menores.
"De tudo o que foi recolhido, não há um mínimo indício ou sinal que permita afirmar que estamos perante a radicalização de matriz religiosa de uma pessoa", vincou Luís Neves. "Tinha um modus vivendi ocidentalizado, os filhos estavam numa escola sem grilhetas de uma educação radicalizada", explicou, para salientar que já foram analisados os "costumes, a vivência e as partilhas comunicacionais" feitas por este homem. A informação que foi partilhada com as autoridades gregas revelou isso mesmo.
Luís Neves sustentou que ainda há perguntas às quais faltam respostas, mas que "todos os indícios apontam para um crime de natureza comum". Para revelar que "o que pode estar aqui em causa só uma perícia psiquiátrica" o poderá confirmar de facto, é que "estamos perante um momento de um surto psicótico, que terá levado a que este trágico acidente possa ter ocorrido".
Todas estas conclusões são assentes em declarações do próprio autor dos crimes, com quem a Polícia Judiciária já falou, "do seu entorno" e das informações todas que foram recolhidas tanto em Portugal como no Afeganistão e na Grécia.
A PJ ainda não procedeu a buscas na residência do suspeito, em Odivelas, por estar à espera do mandado judicial. Para além do telemóvel do cidadão afegão que apreendeu como prova, a PJ irá também necessitar de aceder aos dados das comunicações e recorrerá, depois de autorização do juiz, aos dados de facturação da operadora, o "escape" usado pelas autoridades depois da declaração de inconstitucionalidade da conservação de metadados para efeitos de investigação criminal.
"A questão dos metadados assumiria uma enormíssima relevância se estivéssemos a falar de uma esfera de um ataque de matriz terrorista."