Cabo Verde extradita “assassina do gelo seco” para Portugal
Fernanda Baltazar foi condenada por ter morto namorado em 2016, um crime com contornos de ficção cinematográfica.
As autoridades cabo-verdianas extraditaram este sábado para Portugal a professora portuguesa condenada a 17 anos de prisão pelo homicídio do seu namorado, anunciou a Polícia Judiciária cabo-verdiana, através do gabinete da Interpol na Praia.
Agora com 42 anos, Fernanda Baltazar sempre alegou que a morte do namorado tinha tido origem num pacto suicida conjunto do qual ela havia desistido à última hora. E, de facto, o casal encomendou gelo seco que foi usado na noite fatal, a 24 de Dezembro de 2016. Depois de regada com água, esta substância usada para criar efeitos cinematográficos liberta vapores que são intoxicantes se produzidos em grande quantidade.
Sucede que no apartamento do Parque das Nações onde moravam e onde tudo aconteceu foram também encontrados vestígios de fogo posto. Aparentemente não foi o dióxido de carbono que matou o homem, e sim o monóxido de carbono do fumo provocado por um incêndio que deflagrou em dois pontos diferentes da cama onde dormia, e que carbonizou o cadáver, concluíram os peritos da Judiciária.
Por outro lado, no computador que o casal usava foram encontradas pesquisas consideradas comprometedoras: “Como matar alguém com gelo seco, como matar uma pessoa sem deixar pistas, quanto tempo é necessário estar alguém exposto ao dióxido de carbono para morrer.”
Para trás ficavam cinco anos de uma relação que, segundo relatou Fernanda Baltazar, foi marcada por constantes depressões e ciúmes doentios.
Na noite fatídica, véspera de Natal, foram jantar ao hotel Ritz. Comeram veado e gastaram 200 euros. Regressaram ao apartamento, onde já estavam 35 quilos de gelo seco. Garante a professora que há anos que o namorado falava em morrer assim, por acreditar que não iria sofrer.
A suspeita foi condenada pela primeira vez a 17 anos de cadeia em 2017, decisão judicial confirmada pelo Supremo Tribunal de Justiça quatro anos mais tarde. Porém, a certa altura esgotou-se o prazo máximo de prisão preventiva e acabou por ser colocada em liberdade, por ainda haver recursos judiciais por decidir. Nesse interregno chegou a dar aulas no ensino público, em escolas do centro de Lisboa.
Continuava em liberdade quando se apercebeu de que o Supremo Tribunal de Justiça estava prestes a declarar a sua condenação definitiva, acabando por fugir para parte incerta no final de Fevereiro de 2021. Só em Setembro de 2022 foi localizada em Cabo Verde, na Cidade da Praia, tendo tentado desde aí evitar a extradição para Portugal.
“Não constituo perigo para ninguém. Não sou nenhuma assassina. Os erros judiciários acontecem a toda a hora”, declarava em 2019, numa entrevista que deu ao PÚBLICO.
Quando o cadáver foi encontrado, naquela véspera de Natal de 2016, no apartamento que ambos partilhavam, já ela estava a apanhar um táxi para a sua casa de Vila Nova de Gaia, uma viagem de 300 quilómetros.
Não chamou a polícia, não contou nada a ninguém. “Estava desnorteada. Ajudei a morrer a pessoa de quem mais gostava”, justificou. Regressou a Lisboa quando a Judiciária a chamou para a interrogar. Para a justiça, assassinar o companheiro foi a única saída que encontrou para se libertar do namoro asfixiante.