Reduzir a pegada hídrica pode trazer mais de 400 mil milhões de euros às empresas

Análise feita pela CDP mostra que as empresas que apostarem na eficiência hídrica e outras oportunidades na gestão da água têm vantagem estratégica - e até financeira - num mundo de escassez.

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Não será possível alcançar a segurança hídrica sem uma liderança firme do sector privado, conclui o relatório GettyImages

Todas as análises apontam 2023 como um ano explosivo devido à crise da água, e há muitas empresas que já começaram a trabalhar para conter os riscos reduzindo a sua “pegada hídrica” e a dependência de um recurso cada vez mais escasso. De acordo com cálculos da organização sem fins lucrativos CDP, as oportunidades nesta área podem significar ganhos de cerca de 250 milhões de dólares (cerca de 232 milhões de euros) para as grandes empresas globais.

Não será possível alcançar a segurança hídrica sem uma liderança firme do sector privado, reitera a CDP ao longo do relatório. “A acção empresarial é crucial para abrandar o esgotamento dos recursos hídricos.” Mas se por um lado é cada vez mais comum ver indicadores de emissões de CO2 ou gases equivalentes nas secções sobre sustentabilidade dos relatórios das grandes empresas, o mesmo não se pode dizer sobre o consumo de água e redução da poluição a nível das suas operações e da cadeia de produção.

A CDP trabalha com centenas de investidores e grandes clientes para fazer os seus relatórios globais, usando o peso destes parceiros nos conselhos de administração e cadeias de valor para angariar informação. Neste caso, foram pedidos dados sobre o consumo hídrico de 8477 das maiores empresas do mundo. Apenas 3909 empresas responderam aos seus investidores, e, entre as que enviaram informações, apenas 45% identificaram oportunidades na gestão dos recursos hídricos.

No total, foram reportadas 2718 oportunidades; caso as empresas coloquem em acção os planos para explorar estas oportunidades, o retorno financeiro poderá chegar a 436 mil milhões de dólares (cerca de 405 mil milhões de euros) - ou seja, “bom para as empresas e bom para o planeta”.

Copo meio cheio

Entre os sectores que identificaram mais oportunidades estão o da electricidade, nomeadamente a nível de eficiência hídrica e gestão da água ao longo do ano. Aliás, os ganhos com a eficiência hídrica foram identificados por 53% de todas as empresas que responderam, denotando alguma consciência do desperdício de água que actualmente se regista. Houve mesmo uma fatia de empresas (16%) que, para melhor compreender a sua pegada hídrica, atribuiu um preço à água para reflectir com mais precisão o seu real valor.

Contudo, aqueles onde as oportunidades significam mais ganhos são os sectores como a manufactura (empresas como a Boeing ou a Canon) e os serviços (Fujitsu, Microsoft), onde as empresas consideram ajustar os seus produtos para que sirvam melhor os consumidores que querem reduzir a sua pegada hídrica.

Em tempos em que tantas empresas são acusadas de greenwashing, o relatório mostra o copo meio cheio e aposta na transparência: é altura de as empresas divulgarem a informação de forma clara para que as boas práticas possam ser replicadas e tenham um efeito de contágio dos mercados.

Alerta global

Um maior investimento do sector privado é uma das expectativas com que se chega à Conferência das Nações Unidas sobre Água, em Nova Iorque, que acontece 46 anos depois da primeira conferência análoga, em 1977.

Quase meia década depois, “os riscos associados à escassez de água e à poluição estão em permanência nas manchetes”, descreve o relatório. Entre cheias e secas, o acesso à água potável tem-se tornado cada vez mais um factor de desigualdade; enquanto isso, “os decisores continuam a confiar em medidas de curto prazo e de emergência e a não avançar com a mudança sistémica de que precisamos.”

Também do ponto de vista das empresas, descreve o relatório, uma acção protectora do ambiente está ligada à sobrevivência dos próprios negócios: sem eficiência hídrica, as cadeias de produção ficam vulneráveis à cada vez maior escassez de água; também os produtos adaptados a contextos de utilização com pouca água poderão ter um mercado potencial muito maior, à medida que os consumidores procuram reduzir a sua pegada hídrica ou simplesmente em mercados onde não existe acesso a água em abundância.

Por fim, o relatório destaca também as acções de empresas para promover o acesso dos próprios trabalhadores a água potável e condições de higiene, que melhoram a saúde - e a produtividade - dos trabalhadores.