Recordações da casa-alfabeto

Como muitos livros de culto, House of Leaves vive perpetuamente entalado entre opiniões extremas: as da facção militante e as de quem reage mais a essa militância do que ao objecto em si.

Publicado, com certeiro sentido de oportunidade cronológica, em Março de 2000, House of Leaves é um fortíssimo candidato ao estatuto de objecto “mais-anos-noventa” na história das desenrascadas periodizações culturais. O livro de Mark Danielewski é quase um artefacto sintético dessa década, não apenas pela tipologia de romance literário que representa — o calhamaço de prodigioso ecletismo, relíquia da última época em que a ambição de qualquer jovem escritor (tipicamente americano) era produzir algo cujo título implícito era aquele que Dave Eggers tornou explícito: Uma Obra Enternecedora de Assombroso Génio – mas sobretudo na constelação de referências específicas que evoca. Como num museu de curiosidades regionais, podemos encontrar naquelas páginas o registo fóssil parcial de uma década remota: Infinite Jest e os Ficheiros Secretos; o Projecto Blair Witch e a ascendência dos filmes de terror sobre tecnologia assombrada (como Ring); o grunge e o nu metal; a cultura de fóruns da Internet 1.0 e a predominância cultural do VHS; o ápice da popularidade académica da desconstrução e o Caso Sokal; Monica Lewinsky e os primeiros reality shows.

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