As casas que Portugal tem

É o Estado que tem a responsabilidade de promover políticas de investimento em construção e descentralização: as únicas formas concretas de combater os preços elevados do mercado imobiliário.

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As casas que Portugal tem Nelson Garrido

A habitação nas grandes regiões urbanas, nomeadamente em Lisboa, é um tema em destaque e que eclodiu na opinião pública, especialmente depois do pacote de medidas anunciado pelo Governo. Não pude deixar de reparar nos comentários que um artigo de opinião sobre este mesmo tema, escrito por um aluno de faculdade, conseguiu reunir. Alguns contra-argumentos expressos deixaram-me, no mínimo, intrigada.

Os preços das rendas em Lisboa são demasiado elevados para conseguir conciliar com os salários baixos da maioria dos portugueses, sendo o principal objectivo reduzir esses encargos. Muitos falam do direito à habitação ser fundamental, o que é uma verdade inegável, porém, para que esse direito seja possível de concretizar é necessário investimento em construção e reabilitação de casas. Se forem entidades privadas a fazê-lo por si só, é provável que os preços praticados continuem altos, apesar da maior oferta, devido a tratar-se de um projecto dispendioso. Nenhuma empresa privada vai investir milhões de euros em projectos cujo retorno demore largos anos a compensar o investimento inicial.

Por outro lado, caso o Estado seja o impulsionador do processo, há garantia de que o valor das rendas consiga ser mais baixo pois não depende do mecanismo de ajuste de mercado. As empresas têm a garantia de que o Estado vai pagar, por isso o seu investimento torna-se muito mais seguro.

É também essencial perceber que obrigar as rendas a baixarem “artificialmente” não passa de remendar um problema que só continuará a crescer cada vez mais a médio e longo prazo. Fixar as rendas vai reduzir as possibilidades que os proprietários têm de obter lucro através de arrendamentos, tornando a opção da venda de casa mais atractiva. Se estas propriedades forem vendidas para habitação, o número de casas para alugar reduz, o que se reflecte num aumento do preço.

Outro aspecto, e talvez o mais polémico para a teoria da construção de novas casas, foi uma informação sobre o facto de Portugal ser um dos países com mais casas por cada mil habitantes, não fazendo sentido construir mais. 18.5% das habitações em Portugal são de uso sazonal ou secundário, tendo em conta números apresentados nos Censos 2021. No entanto, há que ter em consideração que o nosso país tem uma larga comunidade de emigrantes, que têm possivelmente casas em território nacional.

Outro aspecto é o das pessoas deslocadas dentro do próprio país. Alguém que seja natural da Guarda, e tenha lá herdado uma casa, mas que viva em Lisboa, terá sempre uma habitação sem uso. O facto é que as estatísticas representam o país como um todo, ignorando a especificidade de cada região. Certamente uma casa de segunda habitação na Guarda não causa tanta polémica como uma em Lisboa.

Isto acontece porque observamos um despovoamento do interior, que causa pressão sobre o mercado das grandes cidades litorais. Pensar que não é necessário construir mais habitações em zonas urbanas devido a uma estatística que retrata Portugal como um território uniforme não é respeitar as características demográficas do país. Provavelmente promover o repovoamento do interior fosse uma das formas de resolver o problema imobiliário que enfrentamos, mas é uma solução demorada e muitas vezes deixada de parte. Como é espectável, o preço de imóveis nas zonas do interior iria aumentar com esta medida, mas também permite repovoar o território, contribuir para o rejuvenescimento da população nessas áreas e aliviar a pressão existente nas grandes cidades.

Posto isto, é o Estado que tem a responsabilidade de promover políticas de investimento em construção e descentralização: as únicas formas concretas de combater os preços elevados do mercado imobiliário.

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