Juízes que ocuparem cargos políticos poderão ter que cumprir período de nojo de três anos

Proposta aprovada pelo Conselho Superior da Magistratura para vingar terá que ter aval do Parlamento. Juízes podem regressar aos tribunais, mas perdem antiguidade e ficam obrigados a ser assessores.

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Presidente do Supremo, Henrique Araújo, tem defendido fim das portas giratórias entre a magistratura e a política Nuno Ferreira Santos

Os juízes que saírem para ocupar cargos políticos poderão, no fim, regressar à magistratura, mas serão obrigados a cumprir um período de nojo de três anos, em que deixarão de tomar decisões judiciais e passarão a assessorar outros colegas. É pelo menos isso que prevê a proposta de alteração ao Estatuto dos Magistrados Judiciais aprovada esta quarta-feira no plenário do Conselho Superior da Magistratura (CSM), que teve o apoio da maioria dos seus elementos.

Oficialmente, o CSM confirmou que a proposta de alteração foi aprovada e que será encaminhada para o Ministério da Justiça, mas não divulgou o seu conteúdo. Caberá ao Governo decidir se avança com uma proposta de lei que, para vingar, terá que ter o aval da maioria dos deputados no Parlamento, já que esta é uma matéria reservada da Assembleia da República.

Segundo o PÚBLICO apurou, a sugestão para se avançar com uma proposta neste campo foi feita pelo presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Henrique Araújo, que preside por inerência ao CSM, e tem defendido publicamente que os magistrados que optem pela política não devem poder regressar aos tribunais. Não foi, contudo, essa a solução que vingou, após ter sido criado um grupo de trabalho no seio do CSM para analisar esta questão.

Actualmente, quando um juiz quer ir ocupar um cargo político (com poucas excepções como lugares ministeriais, que não necessitam de aval) tem que pedir autorização ao CSM, que avalia se não existe um “prejuízo sério para o serviço”, se em causa está uma função que representa “um interesse público relevante” e se a saída não prejudica “a imagem de independência ou o prestígio da magistratura judicial”. Se for dada autorização, o juiz sai (pode optar muitas vezes pelo salário de origem) e o tempo que esteve fora conta como se tivesse estado na magistratura.

O CSM propõe que para saírem para cargos políticos os juízes deixem de ficar sujeitos a uma autorização sua, mas sejam obrigados a pedir uma licença sem vencimento. Quer ainda que o tempo que estiverem fora não seja contado para efeitos de antiguidade, o que vai prejudicar o magistrado na progressão da carreira. A ideia é aplicar este regime a quem sair tanto para cargos políticos, como para outros cargos públicos.

Será assessor quando regressar à magistratura

De fora ficam apenas as comissões de serviço de natureza judicial, que incluem os juízes que vão dar aulas para a escola dos magistrados (Centro de Estudos Judiciários), os que vão inspeccionar os colegas, os que estão no próprio CSM ou os que ocupam cargos judiciais no estrangeiro.

O período de nojo dos três anos só se aplica a quem ocupou cargos políticos ou altos cargos públicos. Quando regressa, se o juiz estava na primeira instância será obrigado a ser assessor num tribunal da Relação e, se era desembargador, será colocado a apoiar os colegas do Supremo. Se estiver colocado neste tribunal de topo deverá ficar na secção social (que decide questões laborais). A proposta do CSM quer ainda baixar o tempo máximo que um juiz pode estar de licença fora da magistratura de 15 para 12 anos.

Na abertura do ano judicial que passou, o presidente do Supremo defendeu que a saída da magistratura para a política deve ser um caminho sem regresso: “Se a vocação política despontar no percurso de magistrado, a opção por esse novo caminho não deverá permitir o regresso à judicatura. Quando se escolhe a magistratura como profissão, essa escolha deve ter-se por definitiva.”

Na sua intervenção, Henrique Araújo mostrou-se ainda muito preocupado com a falta de magistrados que já se nota, mas que poderá agravar-se de forma a comprometer o funcionamento dos tribunais.

Uns dias mais tarde defendeu, no Porto, o fim das portas giratórias entre a magistratura e a política. "O fim das portas giratórias trará mais transparência à Justiça. Contra ventos cada vez mais fortes e marés cada vez mais revoltas, empenhar-me-ei na luta por esse objectivo, o que implicará, pelo menos, a indispensável alteração do Estatuto dos Magistrados Judiciais”, fez questão de sublinhar em Abril do ano passado.

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