PS e PSD abrem a porta ao alargamento da definição de refugiado na Constituição

Bloco pretendia consagrar o “refugiado climático” mas não teve resposta positiva por parte dos dois maiores partidos.

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A proposta de João Cotrim Figueiredo sobre o refugiado mereceu simpatias na comissão de revisão constitucional LUSA/TIAGO PETINGA

A proposta da Iniciativa Liberal (IL) para alargar o âmbito da definição de refugiado, ao retirar a palavra “político” que o qualifica na Constituição, colheu alguma simpatia entre PS e PSD durante a reunião da comissão eventual de revisão constitucional desta terça-feira. Já a pretensão do BE de consagrar o “refugiado climático” na Lei fundamental não mereceu abertura por parte dos dois maiores partidos, cujo voto favorável é indispensável à aprovação de quaisquer alterações à Constituição.

No âmbito da discussão do artigo 33.º da Constituição, referente ao direito de asilo, a IL reformula a actual redacção do número 9 ao propor que “a lei define o estatuto do refugiado”, retirando a palavra “político”. Ainda que de forma prudente, a deputada do PS Isabel Moreira considerou que a proposta da IL é a que “parece abarcar posições mais abrangentes”, sem se comprometer com “outro tipo de subcategorizações que podem vir a ser alteradas com o tempo”.

Em cima da mesa estava também a proposta do BE, que, para o mesmo número, pretende alterar para: “A lei define o estatuto do refugiado climático.” Embora admitindo que se vive numa época de alterações climáticas, a deputada reserva a posição do PS para mais tarde e lembra que, no futuro, a caracterização mais específica do refugiado até pode ser “por razões sanitárias”.

A social-democrata Catarina Rocha Ferreira assumiu compreender a proposta bloquista pela componente de actualidade, embora considere que poderiam colocar-se problemas de aplicação prática, já que “refugiados climáticos e económicos estão ligados” entre si. Já o alargamento do estatuto de refugiado proposto pela IL “pode fazer sentido”, afirmou, numa posição que teve igualmente a concordância do Chega.

A deputada do PSD disse preferir a formulação da IL em vez da que foi apresentada pelo Livre e que remete a protecção internacional do estatuto dos refugiados para a Convenção das Nações Unidas e ao “direito europeu aplicável”. Essa redacção também “não faz sentido” para o PS. Rui Tavares argumentou que a consagração explícita da convenção de 1951 lhe permitiria “ficar mais descansado” para não ficar sujeito a vontades de futuras maiorias na definição do refugiado, até porque nos próximos anos não se antevê que o país navegue “em mares calmos”.

Pedro Filipe Soares, por seu turno, tentou contrariar a rejeição à consagração na Constituição do refugiado climático, argumentando com futuras alegações de inconstitucionalidade caso se queira contemplar este princípio na lei ordinária como defendeu o deputado da IL João Cotrim Figueiredo. “Se não fizermos a referência a refugiado climático, estamos a dizer que a lei não tem de prever. O grupo parlamentar do Chega depois vai dizer que é inconstitucional”, afirmou.

No mesmo artigo 33.º, o Chega propôs que o direito de asilo fosse concedido “desde que comprovadas e devidamente sustentadas as circunstâncias” do seu pedido, o que foi rejeitado pelos restantes partidos com o argumento de que a lei já prevê a justificação.

Outro dos motivos da discussão foi a proposta da IL que incide sobre os termos da extradição, propondo que não é admitida nos casos em que se verifique um risco sério de “sujeição a tortura ou a tratamentos desumanos e degradantes”, além da pena de morte ou de outra pena que resulte em lesão irreversível da integridade física, previsto no articulado actual.

O PS remete para mais tarde a sua posição, o PSD assumiu concordar com a ideia de não permitir a extradição para certos países. Já André Ventura, do Chega, lembrou que em vários países não europeus “as prisões podem ser consideradas degradantes” e que isso impediria, por exemplo, Portugal de extraditar cidadãos para países da América do Sul. O líder do Chega condenou igualmente a proposta do PCP neste domínio, que é ainda mais restritiva à extradição ao excluir países com prisão perpétua e penas “cruéis” ao apontar um exemplo extremo: “Vamos imaginar que Bin Laden tinha nacionalidade portuguesa e após os atentados de 2001 tinha vindo a Lisboa e foi detido. Não podia ser extraditado para os EUA e já estaria cá fora.”

Ao longo de três horas, a comissão de revisão constitucional finalizou também o debate sobre o artigo 27.º, que faz referências à emergência sanitária, no qual o PS reiterou a disponibilidade para aceitar a proposta do PSD que prevê uma decisão judicial que confirme o confinamento ou internamento por razões de saúde pública por pessoa com doença infecto-contagiosa.

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