ONU alcança acordo de protecção do alto-mar após mais de 15 anos de negociações

Consenso foi alcançado após uma maratona de negociações que teve início a 20 de Fevereiro. Marcelo Rebelo de Sousa “congratula-se pela obtenção do acordo histórico”.

Foto
Consenso alcançado após maratona de negociações Nuno Ferreira Santos/Arquivo

Os Estados-membros da ONU alcançaram no sábado um acordo para estabelecer um tratado de protecção do alto-mar, após mais de 15 anos de negociações. O consenso foi alcançado após uma maratona de negociações que teve início a 20 de Fevereiro e que deveria ter terminado na sexta-feira, mas que continuou durante a noite até sábado, com mais de 35 horas seguidas de discussões.

O documento define, entre outras coisas, as bases para o estabelecimento de áreas marítimas protegidas, o que deverá facilitar o compromisso internacional de salvaguardar pelo menos 30% dos oceanos até 2030.

O tratado oferece uma base legal para definir áreas marítimas protegidas, de modo a prevenir e evitar mais eficazmente a perda de biodiversidade. Estão ainda previstas reuniões periódicas de fiscalização deste tratado.

"O navio chegou à costa", anunciou a presidente das negociações, Rena Lee, ao confirmar que havia finalmente um consenso sobre o documento. A notícia foi recebida com uma ovação de pé das delegações reunidas na sede das Nações Unidas, em Nova Iorque.

A adopção formal do tratado, porém, vai ter de aguardar até que um grupo de técnicos assegure a uniformidade dos termos utilizados no documento e que este seja traduzido nas seis línguas oficiais da ONU.

"Este é um dia histórico para a conservação e um sinal de que, num mundo dividido, proteger a natureza e as pessoas pode vencer a geopolítica", disse Laura Meller, do grupo ambientalista Greenpeace, numa primeira reacção.

Marcelo congratula-se

O Presidente da República saudou o “acordo histórico” alcançado nas Nações Unidas, considerando-o “fundamental para toda a comunidade internacional e para Portugal”, que “tem assumido uma posição liderante” na preservação do oceano.

Numa nota publicada no site da Presidência da República, lê-se que Marcelo Rebelo de Sousa “congratula-se pela obtenção do acordo histórico”, alcançado “após dez anos de duras negociações”.

“É fundamental para toda a comunidade internacional e para Portugal, que tem assumido uma posição firme e liderante na preservação do oceano, na aposta no seu conhecimento e no desenvolvimento sustentável de uma economia azul”, refere o Presidente.

Marcelo Rebelo de Sousa salienta ainda que o tratado consagra “um dos compromissos expressos na Declaração de Lisboa ‘Nosso oceano, nosso futuro, nossa responsabilidade’”, adoptada na Conferência dos Oceanos das Nações Unidas, que decorreu entre 27 de Junho e 1 de Julho de 2022 em Portugal.

Também o comissário europeu para o Ambiente, Virginijus Sinkevicius, elogiou o acordo, dizendo que se trata de "um momento histórico" para a preservação dos oceanos.

"Estamos a dar um passo crucial para preservar a vida marinha e a biodiversidade que são essenciais para nós e para as gerações futuras", disse o comissário numa declaração à agência de notícias France Presse.

Virginijus Sinkevicius realçou que "este dia marca o culminar de mais de uma década de trabalho preparatório e negociações internacionais em que a União Europeia desempenhou um papel fundamental".

Proteger 11 milhões de km quadrados por ano

Durante os últimos dias, negociadores de mais de 100 países discutiram este tratado da ONU para proteger o alto-mar. Os grupos ambientalistas dizem que ajudará a inverter as perdas de biodiversidade marinha e a assegurar o desenvolvimento sustentável.

O pacto legalmente vinculativo para conservar e assegurar a utilização sustentável da biodiversidade oceânica, em discussão há já 15 anos, foi finalmente acordado após cinco rondas de negociações prolongadas lideradas pelas Nações Unidas que terminaram em Nova Iorque no sábado, um dia após o prazo original.

O tratado é visto como uma componente crucial nos esforços globais para proteger 30% da terra e do mar do mundo até ao final da década, um objectivo conhecido como "30 por 30" acordado em Montreal em Dezembro.

Os interesses económicos foram um dos principais pontos de atrito ao longo da última ronda de negociações, iniciada em 20 de Fevereiro, com os países em desenvolvimento a exigirem uma maior quota-parte da "economia azul", incluindo a transferência de tecnologia.

Um acordo para partilhar os benefícios dos "recursos genéticos marinhos" utilizados em indústrias como a biotecnologia também continuou a ser uma área de contenda até ao final, arrastando as conversações.

A Greenpeace avisa que 11 milhões de km quadrados (4,2 milhões de milhas quadradas) de oceano precisam de ser colocados sob protecção todos os anos até 2030 para cumprir o objectivo. Apenas uma pequena parte do alto-mar está sujeito a qualquer protecção, com a poluição, acidificação e sobrepesca a representarem uma ameaça crescente.

"Os países devem adoptar formalmente o tratado e ratificá-lo o mais rapidamente possível para que entre em vigor, e depois criar os santuários oceânicos totalmente protegidos de que o nosso planeta necessita", disse Laura Meller, uma activista dos oceanos do Greenpeace que participou nas conversações. "O relógio ainda está a contar para cumprir o objectivo 30 por 30. Ainda temos meia década, e não podemos "ser complacentes".

A Suécia, que esteve envolvida nas negociações como detentora da presidência rotativa da UE, disse que o acordo era o "acordo ambiental internacional mais importante" desde o Acordo de Paris de 2015 sobre o combate às alterações climáticas. "É também uma vitória para a ONU e para o sistema global o facto de termos conseguido alcançar um acordo tão importante num momento tão difícil", disse o Ministro dos Negócios Estrangeiros sueco Tobias Billstrom numa declaração escrita.

A Comissão Europeia, o braço executivo da União Europeia, saudou o acordo como um "momento histórico".