Praga de mexilhão-zebra no Alqueva: o perigo é real

A escassez de medidas preventivas aliada à “elevada quantidade” de meios que podem disseminar a espécie invasora tornam “iminente” a colonização de novas áreas em Portugal.

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Amostras de mexilhão-zebra, um espécie invasora difícil de controlar ANDY CROSS/GettyImages

“É um risco” a disseminação do mexilhão-zebra (Dreissena polymorpha) pelas albufeiras que servem as redes de distribuição de água do sistema de rega do Alqueva, e subsiste a ameaça “iminente” de colonização de novas áreas em Portugal com esta espécie invasora, admitiu, em declarações prestadas ao PÚBLICO, o presidente da Empresa de Desenvolvimento e Infra-Estruturas do Alqueva (EDIA) Pedro Salema.

O alerta feito esta semana pela empresa gestora do Empreendimento de Fins Múltiplos do Alqueva (EFMA) pretende “sensibilizar sobretudo os profissionais de pesca” que rumem ao Alqueva, principalmente nos concursos nacionais de pesca do achigã, para os cuidados que devem ter com a prevenção desta espécie exótica.

Neste momento, não há qualquer foco de contaminação desta espécie invasora no Alqueva. No entanto, em 2019, a EDIA detectou “precocemente”, num reservatório do sistema de rega na bacia hidrográfica do Sado, “a primeira ocorrência nacional documentada”, que foi “rapidamente” eliminada em todos os locais para onde já se tinha dispersado, salientou Pedro Salema, frisando que a ocorrência deixou “muitas dúvidas” sobre a forma como terá chegado o mexilhão-zebra ao ponto onde foi detectado.

A contaminação não teve consequências mais graves porque a “EDIA implementou um sistema de detecção precoce em dezenas de albufeiras do EFMA” e tem sido possível impedir, até à data, a sua propagação para outras áreas da bacia do Sado e bacias adjacentes. Contudo, a “reduzida quantidade de medidas preventivas” a nível nacional e a elevada quantidade de vectores de dispersão, embarcações, atrelados, equipamentos de pesca ou lúdicos, potenciam a disseminação do mexilhão-zebra.

A empresa, prossegue o seu presidente, “faz os trabalhos de casa”, actuando na descontaminação de embarcações antes de estas entrarem na albufeira do Alqueva e até recorrendo a meios mais elementares para detectar a presença ou não do mexilhão-zebra. Foram colocados cabos de detecção precoce, dispersos pelas massas de água do empreendimento que alimentam o sistema de rega e, “de três em três meses, recolhem-se [os cabos] para confirmar a presença da praga, mesmo na sua forma larvar” explicou Pedro Salema.

Risco de colonização de novas áreas em Portugal

As medidas preventivas no EFMA começaram a ser aplicadas desde que foi confirmada a colonização por mexilhão-zebra na bacia do rio Ebro, no Nordeste da Península Ibérica, em 2012. A dispersão da espécie propagou-se para sul, cruzando várias bacias hidrográficas devido a acção humana e mais recentemente de este para oeste, ao longo da Península Ibérica, “estando iminente a colonização de novas áreas em Portugal”, adverte o presidente da EDIA.

Pedro Salema lembra que na albufeira de Bermejales, no interior da bacia hidrográfica do Guadalquivir, foram identificados em 2009 os primeiros indivíduos de mexilhão-zebra e, posteriormente, em 2012, na albufeira de Iznájar. De 2015 a 2019, as medidas de prevenção revelaram novas populações em diversas barragens espanholas.

Para além dos impactos ecológicos das espécies invasoras, a rápida capacidade colonizadora propiciada pelo mexilhão-zebra provoca “múltiplos efeitos negativos, ao nível social e económico, directo ou indirecto, podendo interferir com as actividades principais e secundárias realizadas, incluindo a degradação de estruturas que dependam dos recursos afectados”.

O mexilhão-zebra é um pequeno molusco bivalve de água doce, nativo dos mares Cáspio e Negro, com uma dimensão compreendida entre um e quatro centímetros de comprimento, mas, apesar de muito mais pequeno, o seu aspecto é semelhante a um mexilhão de mar, com concha triangular, distinguindo-se pelo desenho irregular de bandas negras e brancas.

A praga do mexilhão-zebra é de erradicação muito mais difícil do que a do jacinto-de-água, outra das espécies exóticas mais problemáticas que implicou um encargo superior a 50 milhões de euros, aplicados ao longo de décadas para limpar o rio Guadiana da planta aquática oriunda do Amazonas.

Enquanto esta se desenvolve na superfície das massas de água, facilitando a sua recolha, o molusco bivalve fixa-se nas bombas hidráulicas, interior de tubagens, comportas, sistemas de abastecimento de água sob pressão, canais de rega, entre outros, tornando-se muita complexa a desinfecção dos equipamentos contaminados.

Os prejuízos já causados por um minúsculo invasor já ascendem a mais de 40 milhões de euros e o Guadalquivir fica a pouco mais de uma centena de quilómetros da bacia hidrográfica do Guadiana. Os “riscos são gigantescos, provocados por uma espécie que pode alterar o ecossistema nativo, por vezes de forma irreversível”, alerta a EDIA.