FPF recusa revelar contratos de Fernando Santos. Expresso admite avançar para tribunal
Parecer da CADA é favorável à consulta de documentos de interesse público e relevância financeira. FPF discorda do entendimento e o Expresso admite avançar judicialmente.
A Federação Portuguesa de Futebol (FPF) mantém a recusa em facultar os documentos e as actas das reuniões sobre os contratos de Fernando Santos, antigo técnico da selecção nacional, contrariando um parecer da Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA). Depois de uma queixa do jornal Expresso, que viu rejeitado o pedido feito directamente à FPF, esta entidade emitiu um parecer favorável de acesso às informações com relevância financeira, mas a entidade federativa mantém a posição de recusa. O “braço de ferro” pode agora acabar em tribunal.
“O parecer da CADA não é vinculativo. Isto significa que a entidade requerida, quando recebe o parecer, tem dez dias úteis para tomar uma decisão. A federação já nos comunicou a sua decisão final. A partir do momento em que o queixoso recebe essa decisão final, a via que tem para continuar a procurar obter o acesso a essa informação é a via judicial”, detalha Sérgio Pratas, secretário da CADA.
Fonte do Expresso adianta ao PÚBLICO que avançar judicialmente é a intenção do jornal, estando neste momento a ser estudada a melhor forma de o fazer.
Já a FPF é do entendimento de que cumpre o princípio da transparência e os deveres que resultam do Regime Jurídico das Federações Desportivas, apurou o PÚBLICO, relembrando que é um parecer sem carácter vinculativo. A federação discorda ainda do entendimento de que deveria entregar determinados documentos, considerando que a CADA reconhece que a FPF não é obrigada a fazê-lo.
O pedido do semanário foi enviado directamente à FPF e versou sobre o acesso a informação relativa à contratação de Fernando Santos e gestão financeira da FPF no mandato de Fernando Gomes. O treinador foi obrigado pelo Fisco ao pagamento de 4,5 milhões de euros. Na queixa feita pelo Expresso, o semanário alegou que a FPF é uma entidade que tem estatuto de utilidade pública e recebe financiamento do Estado, estando, por esse modo, sujeita a escrutínio da sua gestão em matérias financeiras e patrimoniais. Na resposta, a FPF não concordou com a fundamentação e argumentação, mantendo a recusa.
"O que acontece normalmente é que os tribunais acabam por confirmar a interpretação e as posições que a CADA tem vindo a assumir. O tribunal faz uma apreciação naturalmente independente e a sua própria análise, mas, o que é normal e comum, é o tribunal acompanhar a interpretação que a comissão faz", acrescenta Sérgio Pratas.
Que caso é este?
O ex-seleccionador nacional usou uma empresa criada pelo próprio e na qual é sócio maioritário, a Femacosa, através da qual a FPF contratou a prestação dos serviços do seleccionador e dos adjuntos.
Após uma inspecção tributária, o Fisco ordenou ao treinador uma liquidação adicional de 4,5 milhões de euros de IRS, considerando que Fernando Santos tinha recorrido a um expediente abusivo — a interposição daquela empresa na relação contratual com a federação — para obter vantagens fiscais. A decisão seria posteriormente confirmada pelo tribunal arbitral, após Fernando Santos e a mulher, Guilhermina Santos, tentarem anular a decisão da Autoridade Tributária (AT).
Segundo noticiou o Expresso em Maio de 2022, o antigo seleccionador nacional recebeu da FPF, nos exercícios relativos anos anos de 2016 e 2017, quase dez milhões de euros. Fernando Santos, contudo, terá apenas declarado e pago IRS sobre um salário anual de 70 mil euros, exactamente cinco mil euros por mês. Para a AT, a empresa Fermacosa não tem substância real, tendo sido criada apenas para reduzir a carga fiscal do antigo seleccionador.
Fernando Santos treinou a selecção nacional entre 2014 e 2022. Nesses oito anos, conquistou um Campeonato da Europa de futebol e a primeira edição da Liga das Nações.