BCE teve de usar provisão de 1627 milhões para evitar prejuízo em 2022
Com as subidas dos juros a afectar as contas, o Banco Central Europeu apresentou resultados nulos em 2022, não distribuindo dividendos aos bancos centrais nacionais.
Depois de 14 anos consecutivos de lucros e de distribuição de dividendos aos bancos centrais nacionais, o Banco Central Europeu (BCE) registou, em 2022, resultados líquidos nulos, tendo mesmo assim garantido esse desempenho apenas graças à utilização de provisões acumuladas ao longo dos últimos anos.
De acordo com as contas anuais divulgadas nesta quinta-feira pela entidade liderada por Christine Lagarde, o resultado líquido em 2022 foi de zero, uma descida face aos lucros de 192 milhões de euros registados em 2021 e bastante menos do que os mais de mil milhões de euros de lucro registados em todos os cinco anos anteriores.
O resultado, no entanto, poderia ter sido bastante pior, com o BCE a cair em prejuízos, não fosse a decisão de usar 1627 milhões de euros de provisões, acumuladas pelo banco central ao longo dos últimos anos, para fazer face a riscos.
Durante os últimos anos, num cenário de taxas de juro historicamente baixas e com o banco central a acumular no seu balanço títulos de dívida pública, o BCE, tal como aconteceu com os bancos centrais nacionais que fazem parte do Eurosistema (como o Banco de Portugal), registou lucros elevados.
Nessa altura, optou-se por reduzir um pouco os lucros (e os dividendos distribuídos) precisamente para acumular reservas que fizessem face ao risco de, no futuro, os títulos de dívida comprados poderem gerar perdas. Esse momento chegou agora que as taxas de juro começaram a subir na zona euro.
Com as taxas de juro mais altas, a remuneração paga pelo BCE aos bancos que aí depositam capital eleva-se, enquanto os rendimentos obtidos pelos activos detidos pelo banco central no seu balanço mantêm-se baixos.
A expectativa é a de que, durante os próximos anos, tanto o BCE como os bancos centrais nacionais do Eurosistema registem resultados líquidos negativos que podem ser compensados pela utilização das provisões, enquanto estas ainda estiverem disponíveis.
O BCE não irá, este ano, distribuir dividendos aos seus accionistas, que são precisamente os bancos centrais nacionais. Este é mais um impacto negativo que será sentido nas contas de 2023 do Banco de Portugal, já fortemente afectado pelo efeito da subida das taxas de juro nas suas contas.
Vários bancos centrais nacionais da zona euro, como o da Bélgica e o dos Países Baixos, já deram sinais de que, em 2022, deverão registar prejuízos.
No caso português, o governador do Banco de Portugal reconheceu que se irá registar "uma redução muito substancial" dos dividendos a entregar ao Estado, em resultado da "pressão" a que vão estar sujeitas as contas do banco central “durante mais alguns anos”. Mas a compensar algumas das perdas estará também o facto de a instituição ter acumulado ao longo dos anos reservas e provisões que "são mais do que suficientes para cobrir estes custos", disse, em Novembro passado, Mário Centeno.